Um mil novecentos e setenta e quatro.
Dezembro. Mês do meu aniversário.
Pegando pela memória, que os anos não me atraiçoem. Lá estávamos nós. Cento e sessenta jovens médicos becados. Todos vestidos a caráter. Bons caracteres bom que se diga. Naquele ginásio da nossa capital. A linda Belo horizonte de antanho. Não ainda prontos a exercermos a nossa profissão. Pois ainda faltavam alguns anos de especialização.
Mas mesmo assim trazíamos em nossa maleta de esculápios sonhos. Que ainda deviam ser adiados. Pois, para completarmos nossa formação profissional, tínhamos de estudar alguns anos mais. A fim de nos estabelecermos em alguma cidade de nossa predileção. A minha escolha foi voltar de onde vim. Não pra onde nasci. Mas foi aqui, na minha Lavras querida que decidi retornar uma vez vindo da Espanha. Oriundo da linda Madri. Sem contudo ver as touradas. Pois até nos dias de agora o esporte que incendeia aquele lindo pais é o mesmo que se vê pelas bandas de cá. O esporte das chuteiras e das bolas que rolam pelos gramados. Desnorteadas que escorrem até chegar ao gol.
No ano vindouro cinquenta anos longevos faz que recebemos o canudo. Um lindo certificado em forma de pergaminho. Onde contavam cento e sessenta nomes. Em ordem alfabética. São tantos que nem me recordo quais eram.
Até parece uma eternidade. Eu ainda conto anos. Mas não meus desenganos.
Ainda me lembro de quando aportei da bela Espanha.
Foi num grande navio partindo do porto de Barcelona. Éramos jovens de volta a sua pátria.
Numa cabine onde cabiam quatro. E nos comunicávamos em inglês. Pois cada um de um pais distinto mal sabíamos nosso destino. Nunca mais vi aqueles jovens. Eles agora são meras lembranças da minha volta.
Cinquenta longos anos se foram. E eu aqui estou a relembrá-los.
Até parece que foi ontem. Naquele ginásio lotado da capital mineira lá estávamos nós. Jovens médicos recém formados.
Ávidos por mostrar serviço depois de um longo caminho que ainda persiste. Até o final de nossa trilha que espero estar distante de terminar.
Éramos cento de sessenta jovens médicos. Hoje não sei quantos ainda somos.
Tenho, aqui na minha linda cidade, dois colegas de turma – dois pediatras ainda não aposentados da vida e de nossa linda arte de curar e atenuar dores- Eugênio Gomes e Dirceu Azevedo. Esse último é nascido na minha Boa Esperança. A mesma onde nasceram Rubem Alves, Nelson Freire, ambos falecidos.
Ai que saudade dos meus cinquenta anos. Não de idade. E sim de quando recebemos o diploma de médicos.
Até parece que aqueles anos não estão tão distantes. Parece que os anos passam e a gente não envelhece.
Mas agora evito me olhar no espelho. Ele reage ao meu passar de olhos.
Pra onde foram aquelas melenas topetudas. Pra onde foi aquele lindo bigode negro?
Eu e os meus cinquenta anos de graduado. Deles só restam doces lembranças. Daqueles verdes anos da minha vida. Que infelizmente não voltam mais…