Qual seria a cor da alma?

Por vezes ponho em dúvidas até sua existência.

Existiria mesmo algo dentro de nosso corpo finito depois de passarmos a outra vida?

E essa segunda vida existe mesmo?

Seria um desperdício vivermos tantos ou poucos anos e depois nada mais restar da gente. Senão restos mortais de cheiro pútrido soterrados sob sete palmos de terra. A serem devorados pelos germens famintos digladiando-se por nossas carnes e vísceras.

Alguma coisa deve sobreviver após nosso passamento. Algo chamado alma. Pra mim um vulto de cor branca que se desprende de nosso corpo sem vida.

Na concepção dos entendidos alma é o sopro vital.  Aquilo que anima nosso corpo. Sendo o espírito parte de nossa alma que nos diferencia dos animais. Qual seja nossa parte racional.

Já pra aquela meninazinha. Cujo nomezinho era Aninha. Inteligente e assaz espertinha. Que num dia de novembro perto perdeu os pais.

Elazinha vivia na companhia de uma tia torta. Já que não tinha parentes mais chegados.

Aninha, na noite que seus pais faleceram, estava só.

Foi ela quem lhes cerrou os olhos. Fez uma breve oração pedindo ao papai do céu que tomasse conta deles. Nem teve tempo de chorar, pois urgia a hora de cuidar dos seus funerais.

Aninha, menina sonhadora, vivia sempre sonhando com o outro lado da vida. Se ele existia ou seria mais uma história contada para não deixar a tristeza tomar conta da gente. Já que quando a vida termina nada mais resta a nos consolar.

Naquela noite fatídica. Quando teve seus amados pais enterrados, a vida continuava para a meninazinha Aninha.

Ela morava numa rocinha perdida na zona rural de uma cidadezinha que mal constava nos mapas.

Uns diziam ser nos sertões das Minas Gerais. Já outros desconheciam onde ficava a cidadezinha.

Naquela manhã ensolarada a menina espertinha. Depois de acompanhar o cortejo fúnebre até o campo santo. De fazer uma breve oração em memória dos amados pais.

De retorno a sua rocinha a meninazinha dormiu de tão cansada que estava.

Horas se foram. O dia amanheceu de céu azul.

Aninha acordou e olhou pro alto. Pensou ter visto mãos a se despedirem delazinha.

De antemão sabia que mãos seriam  aquelas.

Como não podia alcançá-las subiu numa jabuticabeira.

Num galho mais alto tentou segurar aquelas mãos. Mas elas eram altas demais para serem tocadas.

A jabuticabeira estava carregadinha de jabuticabinhas madurinhas. Doces como mel.

Aninha já sabia que as mãos eram dos seus pais. Que voavam em direção ao céu.

Ela acreditava que almas existiam. Eram reais e não frutos de nossa imaginação.

Uma vez no chão. Depois de se regalar com o sumo doce das jabuticabas.

Sua tia, preocupada com sua ausência, a ela perguntou onde estava.

Aninha, menina esperta, a tia respondeu: “tia, agora sei que almas existem de verdade. Elas avoam quando nosso corpo morre. Um dia quis saber de qual cor as almas seriam. Já no pé de jabuticaba, chupando aqüelas trutinhas pretinhas e tão docinhas. Minhas dúvidas se desfizeram. As almas são negras como noites escuras. Pois quando elas avoam em direção ao céu a tristeza predomina”.

Seriam mesmo de um negrume pretinho?

Pra mim não importa a cor da pele. A cor da alma pode ser negra como piche. Mesmo que sejamos branquinhos como algodão descolorido de qualquer cor.

Um dia me disseram isso: “que todas as raças se respeitem. Lembrem-se de que alma não tem cor”…

 

 

 

 

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