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Rakel

Rakel

Um dos melhores momentos de minha vida foi ver nascer meus dois filhotes. Primeiro um menininho. A seguir uma meninazinha saiu do útero bem guardadinha que estava dentro de minha esposa.

Não sei se passarinhos da mesma maneira se alegram aos ver um filhotinho sem penas eclodir de seu ovinho. E, dias depois saltar do ninho. Tentar seu primeiro voo solo. Afobadinho. Avoando mais perto e pousando numa arvore próxima. Sempre aos olhares atentos de seus pais. E, a seguir, penso que seus pais nunca irão cantar em coro com seu filhote desprendido de sua casa. Um ninho feito caprichosamente de capim e gravetinhos colhidos nas vizinhanças. Pensando estar seguros dos predadores lá vem um gavião faminto e só não come um dos filhotes pois, um dos seus pais está a espreita e impede que seu filho seja levado pelas garras afiadas daquele predador alado.

Voltando ao parágrafo anterior, que versa sobre momentos. Outro infinitamente apetitoso instante desta minha longa existência cito o dia em que me graduei em medicina.

Estávamos nós, cento e sessenta jovens becados, num ginásio esportivo de nossa capital, acompanhados de nossa família. No meio dela uma namoradinha casadoira. De olhos atentos em mim duvidando se ela era a única a compartilhar um cantinho especialíssimo em meu coração.

E, assim que meu nome foi chamado pelo mestre de cerimônia e subi ao palco a receber o lindo canudo em forma de pergaminho. Aquele, de fato, foi um dos momentos mais inebriantes de felicidade que já passei.

Não posso, jamais, deixar de inserir a esses momentos ímpares o dia do meu casamento. Essa efeméride aconteceu aqui pertinho. Como estava linda a igreja matriz. Um longo tapete vermelho se fazia presente da porta da igreja ao altar. Digno de receber a maravilhosa noiva que entrou toda faceira em companhia de seu saudoso progenitor.

O despontar para a vida de meus três netinhos foi mais um instante de júbilo. O primeiro recebeu o nomezinho de Theo. A seguir apareceu do útero fecundo de sua mãezinha querida o lindo Gael. Já o rapa do tacho veio na carinha iluminada do sabidinho Dom.

Ah! Por onde andaria Rakel?

Agora, nesse começo de linha. Neste parágrafo que tem começo. Nesse gostoso momento dessa manhã tão linda. Cinco de maio.

Conto-lhes mais esse maravilhoso instante que desejo repartir com vocês.

Há cerca de quatro anos passados dei começo a mais um romance. Não junto a uma mulher. Pois já tenho umazinha.

E quem seria a sortuda de se tornar minha musa inspiradora merecedora de figurar em mais um livro. Desta vez não mais de crônicas. E sim romanceando meu rico cotidiano.

Foi debaixo da marquise daquele santo hospital, que tem nome de santo. Pois a Santa Casa, pelos serviços prestados aos munícipes não só dessa cidade. Como a tantos pacientes Brasil afora. Não cabem deudas que esse nosocômio deve figurar, creio em primeiro lugar no pódio, entre os mais meritórios.

Ali, dormindo com a cabecinha recoberta por um tosco cobertor surrado. Ao subir em direção a minha morada quando ainda me escondia num belo condomínio na parte alta da cidade.

Demos de olhos numa mocinha. Estava em companhia de minha esposa. Theo já estava no seu apartamento um andar acima onde nos dias de agora repouso meus ossos duros.

Tive a curiosidade de acordar a garota. Mais uma andarilha perdida por acá.

Ela estava vestida numa bermuda que dantes parecia ter saído de uma velhusca calça jeans.

Uma camiseta na moda cobria-lhe os presumíveis soutiens rosados.

Um par de tênis furado na sola descansava ao lado de sua mochila azul.

Estranhei-lhe o corte de cabelo. Era raspado dos dois lados e seus pelos negros eram presos por um laçarote por cima de sua cabeça.

Assim que a fiz sair de seu cochilo, meu relógio mostrava quase meio dia. Acabei por perguntar seu nome.

E ela me respondeu, ainda sonolenta: “Rakel”.

Não tive a curiosidade de saber qual era seu sobre.

Fomos, par e passo, até uma das salas da Santa Casa. Ela me havia dito que precisava de um bom banho. Não de sol pois ela já estava bem moreninha. Pois, andarilhos não se protegem dos raios solares muito menos do orvalho que despenca de cima nas madrugadas frias nas suas andanças costumeiras.

Naquele hospital não havia como ela se banhar. Pensei até levá-la a minha morada para que ela, Rakel, tomasse banho. Minha querida esposa com um olhar de soslaio indicou um retumbante “não”. E eu não tive como não concordar.

O que me chamou a atenção naquela moradora de rua e andarilha foi que ela me disse amar escrever versinhos. Crônicas, como eu, não lhe apetecia.

Em nossa despedida dei a ela como entrar no meu site- www.paulorodarte.com.

Agora, quase sete da manhã. O sol despenca seus raios brilhantes na minha sala e tenho de cerrar as persianas pois meus peixinhos não gostam de luminosidade excessiva.

Gostaria de deixar escrito a vocês.

Um dos melhores momentos que já experimentei em meus muitos anos foi esse que se avizinha.

No dia de ontem pus um ponto final no meu quinto romance cujo nome é o mesmo daquela garota andarilha com quem me deparei cochilando num piso duro de cimento defronte ao estacionamento da Santa Casal há inexatos quatro anos passados.

Agora, finada a revisão, espero pela diagramação que vai ser feita no próximo final de semana.

A seguir iremos ver qual vai ser a capa desse meu novo livro. O de número vinte e um.

E ver um novo produto nascido de minha fecunda inspiração. Podem crer.

Sem dúvidas ou deudas. Ensarta-me o peito um mugido de felicidade imensa. Equiparável ao dia do meu casamento ou nascimento de meus filhos e netos.

A derradeira vez que me comuniquei à personagem desse romance Rakel estava em Santa Catarina. De onde ela me enviou uma missiva por e-mail ao meu site.

Decerto dormindo pelas ruas e pedindo carona para ir mais adiante.

Hoje, a mim e a vocês indago: “por onde andaria Rakel”?

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Leia com os meus olhos

Leia com os meus olhos

Já se passaram quatro anos desde quando lancei meu derradeiro livro.
Geralmente não me alongo tanto.
Por Quem os Sinos Não Dobram foi o último dos moicanos.
Ele completa o número dezoito.
Dá-me pena deixar tantas crônicas arquivadas na memória do meu computador. Elas merecem ser compartilhadas com quem aprecia uma boa leitura.
Dentre mais de um mil e quinhentas, nascidas durante esta pandemia, algumas foram postadas no Face, outras são inéditas, torna-se missão quase impossível eleger, dente tantas, quais são merecedoras de figurar neste livro.
Caso editasse, neste livro que agora nasce, não sei ainda quando, assim que tomar coragem, todas elas, seria um livro de muitas e incontáveis páginas.
Ele fatalmente iria desagradar os leitores. Pois livros obesos demais assustam não apenas as editoras bem como aqueles que passam os olhos naqueles amontoados de letras miúdas.
E como escolher o título desta coletânea de crônicas?
Muitos, sobremodo os menos aculturados, têm dificuldades em entender algumas das palavras escritas a cada manhã.
Não que tenha a intenção de escrever difícil. Crio vocábulos. Insiro palavras talvez de difícil entendimento. Mas o faço sem sentir, aliás, sensibilidade dentro de mim brota como o capim braquiária depois de uma chuva criadeira.
Não tenho a pretensão de me tornar erudito. Aprecio, e muito, a linguagem simplesinha do homem da roça. Sou fã de carteirinha de seus hábitos singelos. Tenho a maior admiração por suas lutas constantes. E como tem faltado chuva nestes tempos de primavera.
A florada dos ipês quase se despediram. Resta um ou outro. Os de cor amarela prometem voltar quando agosto vier.
Quando escolhi Ler com meus olhos para título deste livro que agora ameaça nascer, fi-lo pensando naqueles olhos desacostumados de ler.
Tento fazer dos meus olhos o veiculo que leva os leitores, os que dizem não compreender algumas palavras, tornar fácil o entendimento. Para que alguns vocábulos sejam entendidos. E se tornem palavras de mais fácil digestão.
Leiam com meus olhos tudo que vai escrito. Se não apreciarem um ou outro texto por favor. Recorram a mim. Seu autor.
Se pudesse ler todas estas crônicas, tantas que são, o faria com maior prazer.

Mas só me resta deixá-las a contemplação de vocês.
Leiam, uma a um. Reflitam. E, se por acaso não entenderem alguma palavra que seja, procurem nos meus olhos, a inspiração que me toma a cada manhã.

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Por quem os sinos não dobram

Quem diria que um jogador de futebol, dos bons, daqui de Lavras, aos vinte e oito anos, aposentado das chuteiras, advindo de pouco da Europa, onde passou seis anos longe dos seus, do canto do sabiá que aqui gorjeia, por certo ele não canta como lá, seria um muso masculino, já que sobre as musas quase todas já me passaram pela imaginação fértil, aquele que me fez pensar em escrever um novo romance? Fabian Stein daqui saiu em busca de um sonho em forma redonda, de uma bola de futebol. E como ele joga bem! Ainda hoje. Não em gramados da Alemanha, da Noruega, da ilha de Chipre, da Suíça e tantos mais. Agora ele apenas brinca de jogador, nas disputadas partidas de Futsal, ou em gramados não tanto alinhados quantos aqueles onde jogava no além mar. Fabian foi levado de volta por mim, seu amigo, aluno aplicado de alemão, de volta não de onde veio. Mas precisamente à fria terra dos fiordes, dos alpes suíços, da linda Munique, onde joga o Bayern, seu time do coração quando ali esteve. E nunca conseguiu passar da segunda divisão. Pura invencionice do seu criador, o escritor que tento ser. Essa história, metade fantasia, meio real, se aconteceu, ou não, pode estar acontecendo todos os dias com milhares de jogadores brasileiros, que, a exemplo do meu amigo inspirador deste livro, aventuraram-se pelos campos do estrangeiro. Aqui tem de tudo um pouco. Sexo, mistério, ação, muita emoção, todos os ingredientes que fazem parte da minha salada de letras um prato especial, sobremodo para os apreciadores de coisas e loisas como estas. Não que me tenha cansado de cronicar. Mas como é bom romancear, seja na vida nossa de cada dia, com a mulher amada. Ou em textos longos fantasiosos como este, que vocês, com certeza não irão perder uma linha, do começo ao epílogo. Saboreiem meu Por Quem os Sinos Não Dobram, como eu amei escrevê-lo.

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A moça alegre do sorriso triste Madest

“Quem quiser vencer na vida deve fazer como os seus sábios: mesmo com a alma partida, ter um sorriso nos lábios.” Dinamor

Que desafios apresenta uma nova vida, num outro lugar? Madest, menina simples e do campo, deixa sua cidade natal, Viçosa, para viver aventuras inesperadas na pequena e encantadora Lavras. Ao mudar-se, junto à família, Madest não poderia imaginar em quantas aventuras, romances, mistérios e tragédias sua vida se transformaria.

Como escolher entre dois amores? Seria Arnoldo, moço abastado da cidade, de futuro promissor, o grande amor de Madest? Ou seria Carlinhos, moço do campo, simples e forte, o homem a conquistar o coração da menina alegre do sorriso triste?

O que você faria se sua mãe fosse raptada? Madest foi além. Superou-se.

Muniu-se de coragem e de um sorriso no rosto e enfrentou, com muita bravura, todos os desafios que a vida resolveu lhe apresentar.

Qual o limite do crime, do sexo, da sedução? De forma envolvente e cativante, Paulo Rodarte trabalha esses temas e narra a estória da menina alegre do sorriso triste, abordando questões comuns e reais do dia-a-dia, fazendo-nos refletir e despertar para a necessidade de seguir além dos desafios da vida, de superar a tristeza e vencer na arte de ser e existir.

Talita Lara Carvalho Nassur

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Mugido de vaca, cheiro de curral

Não sei o que pensam as vacas. Se no cocho cheio de trato, se no touro a descobrir-lhes o cio, se na ordenha que vai acontecer na madrugada fria, no preço do leite que despenca nas águas, no destino do pobre bezerrinho macho, um reles gabiru sem serventia, na pastagem ressequida do mês de agosto, na água poluída do ribeirão, nos bernes e carrapatos parasitando-lhes o couro, na idade em que agora estão.

2016 não tem sido um ano fácil. Acredito, não apenas para os brasileiros, como idem ao mundo inteiro.

A crise mostra os dentes banguelas. A falta de perspectiva de crescimento nos acena com sua língua de fora.

O comércio, a indústria, profissionais liberais, todos os setores ressentem-se da falta de recursos dos consumidores, pobres desafortunados envolvidos na ciranda financeira que roda sem sair do lugar.

E eu, quase deixando os 60 para engrossar as fileiras dos setentões, me atrevo a lançar mais um livro.

Como foi difícil eleger, não os candidatos que se apresentam ao pleito próximo, dentre mais de mil crônicas, essas pobres míseras pouco mais de duzentas, cada uma expressão de um momento de tristeza, de alegria, de preocupação, exalando de dentro do meu eu toda a sensibilidade que jorra aos borbotões no cotidiano de um médico urologista, cada vez mais inspirado, sem saber quantos anos mais vai durar toda essa predestinação a escrever.

Como disse, não é demais repetir, 2016 não tem sido um ano fácil.

A saúde vai bem. Até quando? Não sei. As finanças repetem a cara da fase em que o país atravessa. A inspiração tem altos e baixos. Sou como o tempo. Refém das oscilações do vento.

Na fase em que atravesso tenho sido um náufrago de sonhos desfeitos.

Primeiro, tive de me desfazer da minha querida Urolito. A clínica de tratamento de cálculos renais implodiu como um pedra tratada por aquela máquina que por vezes fracassa. Como fracassam por vezes os sonhos.

Depois foi a vez da minha rocinha prejuizenta. Dado ao prejuízo motivado por um fazendeiro ausente, deixei meu sonho rural, minhas vacas tatu-com- cobra, meus patos e galinhas, meus cavalos, mãe e filho, minha casa amarelazul, tudo aquilo, que amo tanto, em mãos expertas de um amigo.

Agora apareço por lá apenas para um passeio. Dá gosto ver, nos sábados bem cedo, a vacada de bucho cheio, os dois cavalos prontos à monta, as galinhas ciscando alegres, os canarinhos da terra amarelando devagarzinho.

Roça, para dar certo, carece de olho do dono. Caso contrário a renda, que já é limitada, vai pelo ralo do abandono.

Nesse ano de 2016 aconteceu mais uma notícia boa. Dentre outras de pior sabor.

Nasceu meu primeiro neto. Um garoto lindo como um bezerrinho novinho, que suga as tetas da mãe pela vez primeira. É um gabiruzinho de futuro alvissareiro. Tomara seja um bom médico, um melhor fazendeiro, um escritor bem melhor que o avô.

Não importa no que o Theo se torne. O importante é que seja feliz, e consiga distribuir amor.

Tomara que o novo livro: Mugido de vaca e cheiro de curral, recheado de textos testemunhas de um momento meu, reflexo do dia a dia, uns melhores, outros, nem tanto, agrade aos leitores.

Sei que é difícil agradar a todos. Que pelo menos ele agrade ao Theo, assim que meu primeiro neto aprenda como é apetitoso ler.

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Crônica de um sonho interrompido

Somos donos do nosso destino? Podemos concretizar nossos sonhos, simplesmente direcionando as nossas ações para determinados fins? Ou, ao contrário, seria o destino um furacão que nos arrebata e nos leva para onde iríamos deliberadamente? Seriamos meros fantoches nas mãos ( boníssimas ou cruéis) do tempo? Ler a presente obra os leva a indagações como essas. A heroína, Sabrina, menina mulher de beleza incomum,nativa do Brasil, representa o espírito de todos nós, que amamos, que temos desejos e fazemos o bem e o mal, muitas das vezes sem intenção. Nós, todos nós. Em uma trama repleta de suspense, ação, desejo, traições, jogos de poder muitas das vezes sem pudor, mas também plena de humor, de sutilezas, de amizade, de beleza, de nostalgia e de grandes reviravoltas, Paulo Rodarte, seu autor, nos remete, seja lá nas bandas do Tio Sam ( inclusive o Havaí), ou cá no Brasil, em Goiânia, a um mundo desconhecido, que por isso mesmo causa estupefação, piedade, alegria, indignação, e todos os sentimentos possíveis, ainda que contraditórios. Crônica de um Sonho Interrompido é uma obra indispensável aos que- parafraseando o escritor- todos os dias quando acordam optam pela felicidade.

Luiz Fernando de Oliveira

Editora Multifoco


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O mundo das sombras

Quem conhece o médico Paulo Rodarte exercendo a Urologia ou escrevendo suas deliciosas crônicas nos jornais de Lavras, e até mesmo seus livros de onde exala sensibilidade, fica se perguntando como ele pôde se interessar por um tema tão árido como este.

E não é só isto. Como pôde abordar com tanta propriedade e delicadeza os terríveis problemas da cadeia local, que é o retrato de todas as que existem no país.

É incrível como ele, neófito no assunto, tenha ido direto ao ponto, tocado na ferida aberta, sem receio, porque, apenas com o coração receptivo, boa vontade e disposição de ouvir, descobriu, e nesta linda obra mostra que os encarcerados são seres humanos como qualquer um de nós, em sua maioria pessoas que tiveram poucas ou nenhuma oportunidade de serem “do bem”.

Visitando, conversando e se interessando pelos presos, tocou-lhes a alma, conquistou suas confianças, e assim foi capaz de descrever cada um, identificando-os por carinhosos adjetivos, mostrando suas histórias, suas fragilidades e seus lados humano, aquele que ninguém olha e imagina, por que não quer enxergar, totalmente dissociado do criminoso e do crime, que a mídia mostra com pinceladas às vezes cruéis, e que, de certa forma agrada a opinião pública.

O grande mérito do autor está em expor a realidade carcerária em cores reais, o que certamente vai conscientizar as pessoas da importância de se fazer alguma coisa, já que aqueles envolvidos na questão penitenciária não estão interessados, muito menos atentos, quer na recuperação do condenado, quer na segurança do cidadão.

Esta obra é um grito de alerta contra o imobilismo, a má vontade e a cegueira de todos, fatores que, associados a marcha-a- ré do Estado na solução do angustiante problema carcerário, contribuem para o aumento da violência e da criminalidade em todo país.

Zilda Maria Youssef Murad.
Juíza de direito da Comarca de Lavras – MG

Estante virtual


foram-se-as-nuvens

Foram-se as nuvens

Um passarinho, destes que nos visitam as varandas interioranas às tardes , confidenciou-me: ” Quem escreve um livro constrói um castelo. Quem o lê, passa a habitá-lo “.

Matutando ali no balanço gostoso da rede preguiçosa , como eu , veio-me à mente logo um menino- passarinho, contador de causos e estórias, escrivinhador de coisas bonitas, que tem os pés banhados nos regatos cristalinos que descem cantarolando morro abaixo e a alma branquinha como a fumaça que foge do fogão de lenha, deixando aquele familiar e indefectível cheirinho suspenso no ar de café passado na hora. Um menino que me faz pensar em um jardim em flor e nos bem-te-vis que ali se aninham e brincam festivos ao se reconhecerem no alarido dos seus estridentes mas convidativos ” bem te vi ” ! Um menino que dá leveza à leveza.

Mas Paulo Rodarte é também assim: um médico impecavelmente vestido de um branco diáfano da ética , jamais maculada com qualquer atitude que não seja servir ao outro – também não nasceu para ser servido- , comprometido com seu trabalho médico e com seus ideais hipocráticos , jurados e impecavelmente cumpridos há compridos 35 anos.Como seu amigo e colega médico de turma daquele antes ” magricela, olhar esperto e altivo…indomável “‘ , sei que dentro dele mora um anjo de amor, ternura e dedicação ao próximo que abre suas grandes asas acolhedoras para levar o melhor de si e de seus vastos conhecimentos médicos aos que dele necessitam. Agora, dá-se um pouco de merecido descanso das lides nosocomiais que ele aceita com a serenidade do dever cumprido. Mas ainda faz da sua Urolito, clínica urológica de ótimo padrão , um templo de acolhimento e de servidão ao próximo, além de ser o seu honesto e justo ganha-pão. Afinal, quem nasce médico, morre médico.

Mas de repente, não mais que num repente, chegam os fim de semanas e lá se vai o honorável Dr Paulo Rodarte se despindo pela vida de seus afazeres médicos, pondo num cabide a engomada indumentária branca , abandonando a velha maleta de couro cheia de petrechos mil num canto qualquer, lacrando a volumosa agenda de compromissos, desligando-se de celulares e de tudo e de todos para voltar a ser o que é e sempre será : um menino simplesmente.

Como um experimentado peão que conhece bem a sua montaria , sobe célere na sua velha caminhoneta, engata e chega logo a uma quinta marcha , como que esporeia o acelerador e vai sentir o vento despentear seus ralos e aloirados cabelos até ganhar o canto de sua roça , sua rota de fuga, onde sua alma habita em todos os rincões sonhados.

Ali, atento a tudo que se lhe apresenta na vida campesina, embevecido e enamorado pela vida, vai pintando com matizes bem escolhidas uma aquarela de pensamentos que reproduzir-se-á em crônicas , pouco tempo depois , o que desfilou ante seus olhos estupefatos e atentos, coisas e fatos que se aninharam dentro dele , as prosas trocadas com os homens simples dos lugarejos – felizes em seu buraco até ” quando jogarem terra por cima” , o matuto recém-ajuntado que ” antes era eu só. Agora , é dois comigo ! ” , tudo isto que faz o doce encantar deste menino ainda não de todo envelhecido! Que surpreende tanto , daí o seu encanto!

Temos assim, privilegiadamente, em letras roseanamente cheias de neologismos e de encantos surpreendentes , a estória do pé-de-couve que cantou como canarinho belga, do seu cãozinho Willie que o abandonou e fugiu para viralatar na cidade grande, conhecemos a onírica vovó das rosas amarelas, os cãezinhos Pretinho e Toquinho trancafiados, com sentimento de autoculpa, e ” que só tinham fidelidade a oferecer …e não ingratidão “, o combate perdido para os guerreiros marimbondos, em ordem unida , nas jabuticabeiras carregadinhas e atapetadas de frutos , a maritaca que escolheu ser orquídea, , a apologia da vida ao ar livre e o correr pelas pradarias acompanhando o percurso diário do sol , entre vacas , equinos, cercados, caminhos de chão batido e ladeados de matagais , entremeados de ipês e dos trinados dos pássaros.

Paulo é um homem urbano mas com uma alma roceira , ecologicamente atenta às coisas da natureza, como apiedar-se da verde amiga que partiu – ” Que pena que a grande árvore da praça morreu! “-, dos famintos a banquetearem-se do capim viçoso que crescia num lote ermo, a sensação de um aquário vazio pela perda do companheiro aquático Zebrão, sem despedidas ou velório condizente.Apesar de aparentar nítida felicidade tem também, próprio dos poetas e estetas, um coração hipertrofiado de sensibilidades pelo amor saudosista e paternalista , o que lhe dá momentos de solidão e angústia , resultado nítido de sua idolatria pelos seus filhos queridos , pássaros viajantes em busca do infinito e da autorrealização profissional, que buscam suas próprias respostas. Em alguns de seus escritos acobertados de dor acho que a lágrima carrega-lhe a pena pois a humanidade de Paulo é muito maior que a sua compreensão do moinho cruel da vida que nos esmaga e nos reduz à miséria afetiva por querermos fazer o mundo à nossa maneira sentimental. Assim, igualmente chorei com ele ao lê-lo na crônica em que visita a casa de seus pais, onde nasceu, à Rua Coqueiral 155, em Boa Esperança , onde seu pé- de- camélias rosas não estava mais lá, tomado pelo mato cruel da saudade , assim como eles, seus pais queridos. Outro chororô com o ” Crescer dói , e como dói no coração “, bárbaro bilhete esquecido numa gaveta de escrivaninha da desbravadora filhinha ausente. Bem como outro bilhete emulador de um pai pra sua cria…desencantada com os percalços iniciais da carreira em flor da advocacia, ” não se amofine, meu filho.Um dia ,vai melhorar “. Bons pais às vezes tornam-se manteigas derretidas pelo amor aos filhos, seu bem maior.

Às vezes, Paulo Rodarte se nos mostra outras inquietações interiores , ” momentos de farol baixo ” em que busca ” a solução para encontrar de novo a alegria “,filosofando ou ensimesmando sobre temas existenciais, pra aguentar esta solidão maldita que nos joga no abismo de nós mesmos, ” a dor mais doída do mundo ” como a sincera angústia d’alma ” pois quem não tem alma não sofre…” . Como diria Fernando Pessoa: ” O poeta é um fingidor,finge tão completamente que chega a fingir que é dor a dor que realmente sente “. Assim, incognitamente, também Paulo o é…

Explicitando Deus como não sendo ” um pássaro preso na gaiola da razão…pois amor não tem razão “, deplorando a perda de um amigo íntimo na ” dor de um abraço que foi embora…para nunca mais retornar …”, dissertando sobre o amor fundido tal uma amálgama, no dicotomismo real e virtual , na figura do único ” valente e paciente ” amor total e verdadeiro à sua esposa , sua “santinha protetora…um esteio onde amarro minha égua pampa, durante as horas de prazer quando vou à roça ” …. vivenciando juntos um ensolarado e gratificante amor familiar. Paulo é família!

Este é o Paulo Rodarte que se dá a conhecer. E que nos brinda agora com mais esta obra fecunda de lindas e memoráveis crônicas de vida interior , escrevinhadas na simplicidade de quem tem a erudição de resolver a complexidade do escrever bem e bonito, sem rebuscamentos. Garimpar palavras, burilá-las , irmaná-las e dar-lhes vida própria num estilo sucinto e esmerado que nos dá deleite e prazer de viajar e nos reconhecermos em suas estórias. Algumas cheirando a solidariedade e cumplicidade como a do menino engraxate adotado, outras maluco beleza como a do celular perdido nas parafernalhas de uma bolsa de mulher; são tantas crônicas e tão gostosas de se ler que a gente tem dó que se chegue ao ponto final.

Pois como dizia Mario Quintana, ” um bom poema é aquele que nos dá a impressão de estar lendo a gente…e não a gente a ele”..

Também, Chaplim dizia que ” cada um tem de mim exatamente o que cativou “. Paulo Rodarte nos cativa totalmente pois temos dele este transparente e cristalino lado menino, moleque , de pés descalços no chão, livre e solto como o cantar dos bem-te-vis. E isto nos basta e nos plena. Pois nos identifica . E como ele apregoa, em sua reencontrada felicidade de voltar às caminhadas pelos campos e de escrever inspirado , e bem , “‘ caminhe, homem, faça como eu faço, não o que eu digo. Graças às pernas, fiquei de bem comigo…”

E eu, como admirador e amigo confesso, arremato: ” – graças às penas, Paulo Rodarte, ficaste de bem consigo” .

Parabéns, meu amigo menino bem-te-vi ! Repetindo-me, se eu compraria um livro seu:

-Responderia mehor se dissesse a você que o seu livro já me comprou…

Ao lê-lo, como você cismei de ser FELIZ!

Nelson Antônio, 28 de fevereiro de 2010

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