Há tempos pra ele tanto faz se as águas escorrem para baixo ou sobem ladeira acima.
Já que a chuva tem faltado nas bandas de sua rocinha.
Tom Zé sempre foi um caboclo tinhoso e resignado.
Acostumado ao trabalho duro não se fazia de rogado tanto no cabo da enxada como empunhando a velha foice.
Até os seus quase sessenta anos. Completos naquele mês de outubro. Já passando da metade. Perdeu a conta de quantas madrugadas frias ou quentes acordou rumo ao serviço que sempre o esperava com um sorriso estampando na face.
Nunca o vi contrafeito. Mesmo no dia quando sua melhor vaquinha, de nome Maninha, foi achada mortinha da silva atolada num brejo quase seco.
Naquela manhã cinzenta meu amigo Tom quase desistiu da lida. Pensou em se mudar pra cidade. Não fosse pela minha intervenção oportuna ele, por certo, faria exatamente aquilo que iria fazer dele um homem ao meio. Já que por inteiro ele sempre foi. Sempre presente nos bons e maus momentos. Nunca desisisitindo de seus sonhos. Mesmo que fosse descolorido de tudo aquilo que ele sonhava. Com uma fazendinha produtiva. Que lhe desse apenas felicidade mesmo que salpicada de tristeza. Pois nem sempre ser feliz se torna possível nesse mundo onde a tristeza impera.
Naquela manhã iluminada por um solzinho tímido encontrei meu amigo Tom de mãos postas no queixo recurvo na soleira de sua casinha tosca.
A mim me pareceu que algo de ruim havia acontecido.
Como tinha pressa a ele perguntei o que havia sucedido. Ele nem se deu ao luxo de olhar pra mim.
Fiz menção de ir embora. Ao virar-lhe as costas ele resmungou qualquer coisa ininteligível.
Num muxoxo Tom se virou em minha direção e balbuciou: “pêra aí. Dá-me um tempo para eu respirar”.
Quase desisti de saber qual o motivo de sua zanga. Não era de seu feitio fechar a carantonha feiosa.
Na noite passada a seleção brasileira de futebol foi derrotada pela de nosso país vizinho mais ao sul. O placar foi de dois a zero. Mas poderia ter sido mais. Fora o baile.
Pensei ter sido este o motivo do desconsolo do amigo Tom Zé.
Mais uma vez me enganei.
Naquele interregno de nossa prosa, antes de me despedir do amigo, dele ouvi esse desabafo inesperado.
“Quer mesmo saber o que penso? Pra mim tanto faz como tanto se desfez. Não me importa se a seleção ganhe ou perca. Pra mim o que conta são as contas que se amontoam no tampo da mesa. Se falta comida na janta ou se tem sobremesa. Eu não ganho nem um milésimo, ou uma infinita partezinha do que recebem as tais estrelas da seleção. Se eu recebesse pelo leite que minhas vacas dão um reles tostão do que ganha o tal Neymar acha que eu estaria aqui? O que me importa o resultado do jogo de ontem a noite? Ah! Pouco se me dá.”
Fui embora pensando comigo mesmo. Não é que pra mim também?