E a muitos elas não encantam. Dado ao seu canto agudo e estridente. Que se deixa ouvir durante as noites quentes. Muitos pensam ser indicio de que a chuva vai cair. Tomara que seja em breve. Muito muito com a maior brevidade.
Por que cantam as cigarras? Essa pergunta me fiz a mim mesmo ao ouvi-las cantar.
E que inseto de aspecto asqueroso é uma cigarra uma vez feita adulta. Mas sabia de antemão que elas são inofensivas. Que passam mais da metade de suas vidas debaixo da terra. Nesta metamorfose ambulante. Para depois cantarem pelo singelo motivo.
Agora, nessa primavera que mais se assemelha a um verão. De um quentume indigesto. Elas, as cigarrinhas, entoam suas canções em altos decibéis por uma simples razão.
Não são as fêmeas que cantam. Elas são timidazinha. E, sim seus futuros namoradinhos que cantam na intenção de se acasalarem. Como nós machos da espécie humana cantamos as garotas durante as voltas no rela do jardim.
Cigarras são insetos que não fazem mal a ninguém. Presas fáceis de predadores alados como os passarinhos. E fazem parte de um ciclo da natureza. Muitos pensam que as cigarras explodem de tanto cantar. Mas elas não cantam até explodirem. O que encontramos na casca das árvores é o que delas restou. Suas carapaças chamadas de exoesqueletos. Último estágio de suas transformações ruidosas.
Elas não picam e nem possuem ferrões como as abelhas. Suas boquinhas são desprovidas de dentes. Afiados como as línguas de certas pessoas.
Suas cantorias da mesma maneira, como muitos pensam, que podem ser indicio de chuva. Por vezes a chuva tarda, mas não falha.
Deveras as cigarras cantam devido a umidade. Já que o secume do ar incomoda.
Aquela meninazinha, chamada Mariazinha, ao ouvir uma cigarrinha cantar, pertinho da janela do seu quarto.
Pela primeira vez a ouvindo cantar, olhou pra fora, apanhou a cigarrinha dentro da concha de suas mãozinhas, olhou pra ela, enternecida, e a soltou num átimo. A cigarrinha não mais conseguiu voar.
Simplesmente olhou para Mariazinha, com aqueles olhinhos tristonhos, e não cantou mais.
O que restou daquela cigarra pequeninha, uma feminha que amava um cigarro apagado. E acabou morrendo de amor por ela. Foi nada mais que uma casca grudada ao tronco de uma velha árvore. E tão somente lembranças do quanto ela o amava. Um amor que levou os dois ao desvario. Já que o canto do cigarro não conseguiu ver concretizado aquele amor que poderia ser tão lindo.
Mariazinha, inconsolável, ao ver a cigarrinha morta. Reduzida a uma casca seca. Grudada ao tronco da sibipiruna. Chorando de tristeza.
Ao ver sua mãezinha entrar porta adentro do seu quartinho.
A ela disse agora entender o por que do canto das cigarras.
“ Mãezinha, antes não entendia a razão do canto das cigarras. Agora sei o porquê. Elas cantam de tristeza. Essazinha, que agora a pouco vi morrer. Acabou de me confidenciar que morreu de amor. Seu amado cigarro apagou antes que pudessem se acasalar. E ter filhos cigarrinhos acesos. Embora fosse contrária ao hábito de fumar ela amava de verdade aquele cigarro morto”.
Se me perguntarem por que as cigarras cantam agora eu lhes respondo. Elas não cantam por serem alegres. E cantam deveras de tristeza. Por um amor mal correspondido que um dia sentiram. E o cigarro apagou durante uma cantoria. Incendiando com suas chamas que nunca mais se apagaram. Aquele amor que passou. E nunca mais voltou.
Por que as cigarras cantam? Até agora não sei. Quem souber me conta. Por favor. Prometo não dizer a ninguém. Se até eu mesmo não sei.
Segundo me disse a menina Mariazinha foi por puro amor. Quem saberia dizer?
Já eu escrevo de felicidade. Não igual as cigarras cantam por pura infelicidade. Prestes a se despedirem de sua curta passagem por aqui nesse lugar tão lindo. Pena que muitos ignoram a lindeza dessa nossa vida. E morrem sem conhecerem sequer o que seja ser feliz. Algum dia apenas.