O sol lambia a terra como de costume há muito tempo.
Um calor dos infernos infernizava a vida daquele senhor.
A azulice do céu predominava. Nada de nuvens cinzentas a indicar uma possível chuva no cair da tarde.
A pastaria ressequida de vez em quando sofria um indicio de incêndio. Se não fosse apagado não sei o que seria daquela rocinha de alguns alqueiras apenas. De tão pequenina que quando uma vaca deitava seu rabo ficava do lado de fora da cerca.
Seu Pedro, no alto dos seus mais de setenta anos, um cadinho mais, não via a hora de derriçar a chuva do alto. Sonhava com ela.
E acordava a mesma hora de sempre. Abria a janela. E os raios de sol entravam quarto adentro sem pedir licença.
Um calorão já indicava que ao cair da tarde a temperatura ambiente, à sombra, iria subir à cifra de mais de quarenta graus.
E como ele tinha saudades daqueles bons tempos de quando a lama encharcava tudo ao derredor do curral. Mas a tal saudade pra ele era a única coisa que o vento não leva. Mas uma ventania sombria acabou levando com ela o único amor de sua vida. E a amada dona Gerusa, durante uma tempestade que passou levando tudo de roldão. Como um tufão. Numa noite de ventania. Sem se anunciar. De repente. Sem mais que num repente. Em plena madrugada teve a casa inundada. E Seu Pedro nunca vai esquecer daquela noite funesta. Quando sua amada esposa foi levada a outra vida numa enxurrada que pôs tudo a perder.
Mas, contra a sua vontade ele sobreviveu. E como desejou ir junto a sua amada.
Passaram-se anos. Invernos enterraram primaveras. Outonos desfolharam folhas mortas. Verões mais quentes ainda prenunciaram mudanças climáticas.
Mas, ali na roça do Seu Pedro nada de a chuva cair. Somente sol.
A pastaria ressequida nada oferecia de comer as vacas. A silagem estava no fim.
O desespero embaciava os olhos dos sitiantes. Seus vizinhos, de mãos postas ao céu, oravam pela volta da chuva. Mas as previsões eram sombrias.
O secume do ar secava as minas d’água. O único açude mostrava o fundo trincado. Peixinhos mortos se deixavam ver.
Foi num sábado. Quente, seco, durante a madrugada. Seu Pedro teve um sonho.
Sonhou com uma tempestade. Que caiu durante a noite.
Acordou em sobressalto.
Ao deixar a casa viu o céu escurecer.
Nuvens pesadas anunciavam uma tempestade.
“ Cadê a chuva”?
Novamente se perguntou.
Naquele exato momento despencou uma aguaceira. Uma enxurrada levou tudo que estava à frente.
Seu Pedro tentou salvar alguns pertences. Mas não foi possível.
No dia seguinte encontrei Seu Pedro de joelhos agradecendo a dádiva da chuva. Mesmo com lama pelo pescoço agarrado a uma santinha pela qual tinha a maior devoção.
Muitos ainda se perguntam: “ cadê a chuva”?
Mas eu recomendo cuidado. Que ela venha mansa. Sem causar estragos. Aquela chuvica timidazinha.
Que ela seja a conta de molhar a pastaria. Fazer reviver as minas d’água. E sorrir a gente da roça. Que tanto ama chuva. Como eu amo essa vida a qual só tenho a agradecer. Nestes meus quase setenta e quatro. E nunca estarei cansado de viver.