Antes pensava ser o cansaço prerrogativa dos idosos.
Pensava que a idade nos pesasse mais nos costados.
Agora, beirando os setenta e quatro mudei de ideia.
A fadiga não apenas nos atinge indiferente aos anos que colhemos.
Tanto podemos nos sentir fatigados na juventude. Na tenrice daquela idadezinha. Uma vez feitos adultos. Que tanto pode ser na maior idade.
Tudo vai depender da nossa disposição de encarar a vida. Do jeito que nos olhamos no espelho. Se ele diz que estamos velhos devemos retrucar: “velhos não. Seniores, idosos, anciãos, melhor dito”.
Em absoluto não me sinto velho.
Nestes meus mais de setenta sou capaz, mais ainda. De correr distâncias infinitas. De caminhar quando minhas pernas pedem. De amar quando a vontade dita. De pensar quando meu cérebro irrequieto exige.
Não me canso de acordar todos os dias a mesma hora.
Já disse que as madrugadas me atraem.
Nesta manhã, meado de setembro. Com este solzinho miúdo. Depois de ter chovido durante a noite um cadiquinho. Não me canso de olhar o horizonte. O casario baixo que daqui se pode ver. Aquela rua do meu passado. A outra logo abaixo onde brincava na minha meninice. Aquele lote vazio onde era a casa dos meus pais.
Não me canso de acordar bem cedinho. E caminhar a passos rápidos até aqui na minha oficina de trabalho. Tomo meu cafezinho expresso. Alimento meus peixinhos. Olho com cuidado para ver se os recém nascidos mostram-se entre as pedras do fundo.
Essa rotina não me cansa. Tenho-a como companhia desde há muitos anos.
Não me causa cansaço escrever a cada manhã. A inspiração me cavouca por inteiro.
Não me canso de admirar o dia que nasce. Canso-me sim em permanecer na cama mais tempo além das seis.
Fatiga-me sim dormir por muito tempo. À negritude da noite prefiro o clarume dos dias.
Canso-me sim do ócio. O ócio prazeroso e relaxante pra mim não diz nada.
Atrai-me a atividade. As pernas que me levem a algum lugar,
Não me canso desta vida que tenho levado. Tanto a que se faz presente como aquela que foi deixada pra trás.
Canso-me sim só em pensar na falta do que fazer. Não me dou bem em permanecer olhando o entorno admirando o nada.
Em absoluto não me sinto infeliz em ter perdido a mocidade. Já que encontrei na maior idade a paz que tanto almejei.
Se ainda me sentir cansado aos mais de setenta não será por isso que irei pensar finitude da vida. Pra mim ela continua além dos anos. Além da morte? Por vezes me indago,
Não me canso de tantas coisas…
Mas, se um dia me cansar, que me levem a algum lugar.
Pra onde?
Não me canso de fazer essa pergunta. A mim mesmo. A outrem. A vocês.