Dessa vez ele não topou a parada

Parada, nos bons tempos dantes de agora, dava no mesmo que desfilar em dias festivos como sete de setembro.

E como dava gosto ver aquela aluninhas do curso secundário desfilarem no jardim. Vestidas apenas com seus saiotezinhos com seus lindos joelhos a mostra e era só. Nada se via além disso. Se elas por um acaso deixavam ver, mirando com nossos olhos gulosos, um palmo acima logo as línguas de trapo cochichavam as suas comadres fofoqueiras: “olha pra ali. Dona Ermengarda. A tal fulaninha falta com o decoro. Se ela usa calcinha branca ou sem. Seu pai não está nem aí. Só falta ela virar garota de programa. A rodar bolsinhas no rela do jardim.”

Da derradeira vez que propus fazer uma catira, ou troca, melhor se entendam permuta ou escambo. A um vizinho de pasto. Um senhor então arreliento de nome Nicanor. Um que saído da Faisqueira. Um povoado mais perto da minha cidade amada. Cujo nome era Santana das Lavras do Funil. E agora passou a se chamar simplesmente Lavras, terra dos ipês e das escolas. Onde mora o escritor urologista cujo site é – paulorodarte.com.

Esse mesmo senhor. Dantes arrendador de minhas amadas terrinhas. Cujo nosso trato era que ele iria tomar conta das minhas queridas vaquinhas tatus com cobra não peçonhentas. Num período de tempo não inferior a cinco longos anos. Fazia parte de nosso contrato que Seu Nicanor era incumbido de roçar a pastaria. Remendar cercas de arame farpado. Deixar meu curral limpinho pois não seria nele que Nicanor ordenharia ruminantes tanto as minhas como as deles. E, numa das cláusulas do contrato era definido que as crias nascidas a partir de antão metade seriam minhas a outra metade dele.

Acontece que a metade minha morria. As dele não.

A cada sábado ia à sua casa da roça, montado numa linda égua castanha, mãe de equinos meus. E a ele contava causos e o tinha com verdadeiro amigo chegado ao meu coração.

E as visitas se repetiam a cada final de semana. Sempre aos sábados antes de domingos.

Foi num sábado, perdido num emaranhado de anos, ali cheguei, montado na minha cavalgadura de boa marcha repicada.

“Oi Nicanor! Onde o senhor está? Estou aqui. Apareça”.

E, nos cafundós dos fundos, cortando capim, com um enorme podão. Junto dele sua adorável esposa dona Cida. Auxiliando-o na dura tarefa sob um sol escaldante.

Muitos sabem do meu espirito de porco. Sou um espirituoso brincalhão. Troço inté das minhas desgraças. Sem ser desrespeitoso tento pilheriar mesmo com quem não aprecia brincar.

Naquela meia tarde Nicanor, não sei se meio angustiado pela falta de dinheiro, não estava numa boa manhã.

Na intenção de encomiar sua amada esposa. Que aos meus olhos era mais feia que urubu desvestido de suas penas pretas.  A ele desferi esse jocoso agrado: “Tarde, amigo Nicanor. Mulher pra lá de boa a sua. Quer trocar ela com a minha”?

O ainda não tanto velho Nicanor, deixando o corte pra depois, andando enfezado em minha direção. Como um Sansão desafiando Golias. Justo eu, um pigmeu. Deixou sair de sua boca cheia de dentes isso: “doutor Paulo. Se minha muié estivesse em negócio eu punha no jornal.”

E ainda faltavam três longos janeiros para que o nosso contrato se transformasse em distrato.

Nunca estive tão insatisfeito com um negocinho como aqueloutro.

Nunca me meti a valente. Não sou de dar uma boiada para não escapar de uma rusga. Fujo da luta valendo-me das minhas pernas serelepes.

Mas vendo Nicanor sair da moita de capim com aquele podão enorme e afiado. Num átimo apeei da minha égua e me fiz de corajoso e valentão.

Ainda me lembro das últimas palavras iradas do vizinho Nicanor: “doutor Paulinho. A partir da presente data não temos mais negócio. Dou por encerrado nosso contrato”.

Outro vizinho de cerca, de nome Wildes, fotógrafo perdido num emaranhado de fotos antigonas e amarelecidas.

Quando me vê pelas ruas jocosamente me diz: “doutor Paulo Rodarte de Abreu. Caso o senhor trocasse de mulher, sabedor da formosura de sua linda Rosa. E da feiura da mulher do Nicanor. Ele sim levaria a melhor. Essa catira seria uma manta graúda que vosmecê levaria na cacunda. E ele ainda teria, caso a troca fosse concretizada, de entrar a mulher dele na troca. E ainda voltar a boiada inteira. Nessa catira ainda sobraria, de quebra, a casa do Nicanor e o curral limpinho. Como o contrato entre vocês reza”.

Já no dia de hoje, trinta de abril, fim de semana alongado. Já que amanhã ainda é feriado.

Na boa companhia do Carlinhos, filho não único do Betão e dona Lúcia, fomos montados em duas lindas éguas cavalgando, sem destino, fazendo a nossa parança no sitio Paraíso da dona Maria e de seu Mané.

Ali seu Mané não estava. Apenas sua amada esposa nos recebeu com algumas bananas que acabei apeando e comi mais de quatro.

Em retorno, de volta a minha rocinha, atrás da gente vinha lentamente Madest. Minha querida enjeitadinha cadelinha viralatinha com resquícios de sangue Border Collie.

Já nas proximidades da cava rasa de minha fazendinha. Deparamo-nos com Zé Peleja e sua prole.

E que rico ele se mostra. Montado num outro cavalo. Tendo, como acompanhante um dos seus filhotes o Luanzinho. Já que o segundo, o qual apelidei de minhoquinha. Estava no timão de um dos seus tratores.

Paramos as duas éguas para um dedo de prosa.

“Zé Peleja. Quer fazer uma troca comigo? Troca dois dos meus livros por esse trator? Ou minha égua pelo seu cavalo”?

Ele, esperto como sói ele é. Lembrando-se da catira da minha mulher com a do Nicanor. Pensando que eu quisesse com ele trocar de mulher. Logo esporeou seu cavalo baio e escafedeu-se aos confins de Judas onde ele perdeu as botinas.

Desta vez não houve a troca. Quem sabe da próxima vez…

 

 

 

 

 

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