Quando a gente chega a certa idade de nada adianta tentar mudar os costumes.
Se nós mesmos não mudamos por que tentar mudar nosso jeito de ser?
Mesmo que não esteja dando certo não há jeito de nos consertarmos.
Pau que nasce torto envelhece com a mesma tortuosidade.
Já tentei acordar mais tarde. Mas quem diz que a cama entra em acórdão comigo?
Antes das cinco ela me renega. Principalmente nesses dias ensolarados, quando, do lado de fora da janela um lindo dia desperta. Não há jeito de tentar ajeitar o travesseiro. Cobrir a cabeça com lençóis macios. E virar pro lado tentando dormir mais um cadinho.
Já tentei mudar meu jeito de ser. Mas a idade provecta me diz: “ah! Bobagem. Continue como você está. Já que não sabe quantos anos mais vai viver de nada adianta tentar retroceder no tempo. Ele não caminha pra trás. Siga adiante. Aproveite, desfrute. Apesar de saber que a vida seria insuportável não fossem as mudanças você não tem tempo mais para mudar. Nem de casa; nem de roupa. A cueca sim. Deves mudar”.
Já tentei mudar de profissão. Mas quem diz que ainda sou capaz de sair de casa bem cedo. Com o jornal enfiado no sovaco. A procura de emprego. E sendo preterido pelos mais jovens. Ouvindo palavras acintosas que me ofendem a dignidade: “volte mais tarde. Não te enxergas? Olha no espelho. Você, velhinho. Já passou da idade de procurar emprego. Contente-se em ficar assentado a um banco da praça vendo o tempo passar”. E eu não contradigo a quem me disse aquilo. Não fico injuriado já que essa é a mais crua e dura realidade.
De nada adianta tentar mudar o curso dos anos. Se nem um rio muda seu caminho. Simplesmente ele, o rio, dá uma volta e desvia dos morros. Fazendo curvas mesmo sinuosas. Mas sempre chega ao mar. Mesmo se o mar fique longe; mas é seu destino.
Já tentei ir por outro caminho. Mas sempre chego aqui mesmo. Juntinho daqueles a quem amo tanto. Já que o lugar dos velhos, engana-se, não é o campo santo. Mas antes devemos aquietar nosso espírito. Já que o corpo é finito. Mas a alma levita e sobe aos céus. Indo morar naquele lugar por mim nomeado paraíso.
De nada adianta tentar incutir nas pessoas que idosos deveriam ser respeitados. Já que deram tudo em vida útil. Mas é chegada a hora de nosso merecido descanso. Não num campo santificado. Onde recebemos flores sobre o mármore frio de nossa última morada. Mas de que adianta se nem sabemos quem foi que as depositou ali.
Já tentei mudar o jeito do meu pensar. Mas meus pensamentos avoam. E não paro de divagar.
De nada adianta tentar ir mais apressado. Já que meus passos são titubeantes. Eles mal me sustentam. Um dia irão parar.
Já tentei impor um ritmo mais lento a minha caminhada. Minhas pernas fraquejam. Meus pés doem de tanto andar.
De nada adianta pensar que ainda sou jovem. As rugas me contradizem. As cãs atestam o revés.
Já tentei olhar-me no espelho. Desvestir-me da minha idade verdadeira. Mas ele não espelha inverdades. Simplesmente olha pra mim e diz: “se pensas que ainda tens a idade dos seus netos experimente engatinhar como eles. Sua coluna vai travar. Suas costas envergadas doem ao menor contato. Suas pernas não darão conta de a eles acompanhar. Você não é mais criança. Seu tempo já passou”.
De nada adianta pensar que o tempo não passa. Olhe pro relógio. Comprove minha assertiva. Agorinha mesmo era cinco e meia. Uma hora se passou e você nem se deu conta.
O ontem se foi. O hoje se fez presente. O amanhã tem a incertitude das horas.
De nada adianta pensar em viver o amanhã. Viva o hoje e o agora. Antes que o amanhã lhe diga em palavras duras: “se não aproveitou o dia de hoje não deixe pro amanhã. Pode ser tarde”.
Já tentei não envelhecer. Mas como contrariar o inevitável?