Há uma infinidade de meses a seca mostra a cara poeirenta.
Setembro enseja primavera. Mês quando flores enfeitam a natureza. Quando os ipês mostram toda sua beleza. E aquelas florzinhas caem na terra ressequida. Muitas ainda vivas de cores amarelas que vão ao roxo e terminam branquinhas. Pena que elas, aquelas florzinhas mimosas, não podem voltar aos galhos finos de onde vieram. Se pudesse novamente as colaria ali no seu berço. Para de novo elazinhas se tornarem botões. Pára reiniciar o ciclo de suas vidinhas tão curtinhas.
De regra não sonho. Nem tenho pesadelos. Simplesmente penso muito.
Imagino coisas e loisas impossíveis de acontecer. Com minha imaginação fértil avoo ao longe.
Levito nas alturas aproveitando as correntes de ar como os urubus. Bato minhas asas frágeis como se fossem elas preparadas para voar nas alturas. Mas de repente despenco. Volto aqui na terra. Aterrissando sonhos. Voltando a cruel realidade. Da qual pretendo, mas não consigo me desgrudar.
Já sonhei, naqueles natais passados. Ganhar de presente aquela patinete feita de ferro e aço. Mas acabei não ganhando.
Já me iludi pensando receber, por minhas notas altas, pelo menos um abraço apertado daquela meninazinha. Mas ela nem olhou pra mim. E nem se lixou por aquele meu amor florescente. Que terminou despetalando como aquela linda florzinha do ipê que veio ao solo ainda viva. Sem o direito de dizer: “pelo amor da natureza”. Devolvam-me ao colo de minha árvore mãe. Antes que a tera me sepulte.
Já passei por tantas coisas que delas não me esqueço. Daquelas brincadeirinhas de menino. Quando euzinho, criança, anos se foram desde minha infância.
Sonhei um dia conseguir driblar, naquele campinho cambeta, aquele moleque bom de bola.
Mas elezinho, num drible, de pura arte. Acabou me dando uma caneta. Quando fui motivo de chacotas em toda turma.
Já sonhei sonhos mirabolantes. Pensava ser eu um astronauta. Mas ao revés de conseguir chegar à lua tive minhas asas tostadas pelo calor do sol que rachava nas alturas.
Já sonhei com aquela mocinha pudica que não dava bola pra mim. Onde estaria ela hoje? Quem saberia dizer seu paradeiro, por favor, conta pra mim.
Sonhei tantos sonhos que não se concretizaram. Agora me satisfaço em não sonhar tanto. Pois quem sonha demais corre o risco de cair na realidade que incomoda.
Já tive sonhos furtados. Ainda me lembro de unzinho. Quando, ao acordar feliz naquela pós noite de natal. Ao abrir aquele pacote grandão constatei que aquela linda bicicleta de rodinhas cor de rosa não era minha. Meu sonho foi furtado por um primo quase irmão. Que no dia seguinte não me permitiu andar naquele presente que não era meu.
Sonhei, anos depois de agora, repousar sobre meus louros um direito de todo médico que atinge certa idade. No entanto dos entretantos continuo na ativa até quando não se sabe.
Sonhei muito, mas pensei não sonhar mais. Meus pensamentos ainda avoam. Sem rumo certo. Em direção a nenhum lugar.
Se um dia parar de sonhar conto com meus pensamentos. Eles me servem de alento. São meu bem estar.
Estamos em quase finado setembro. A primavera já chegou. Que traga com ela a chuva. Que em boa hora há de vir.
Que ela venha devagarinho. Mansinha como um afago de mãe. Que ela não falte aos homens do campo, pois é hora de plantar.
0ntem sonhei com ela. Não era aquela menina sonhadora que se transformou numa linda mulher.
Nem ao menos com aquela florzinha amarela que se desprendeu da árvore do ipê.
Sonhei sim, com ela. Com a chuva que ainda não caiu. Mas com certeza a tal chuva vai molhar a terra. Agradeço ao papai do céu.