De vez em quando me vem aos pensamentos.
Até quando a vida que temos levado tem valido a pena.
Fecham-nos os olhos quando paramos de respirar. O último suspiro indica a chegada da morte. A derradeira vez que vemos os amigos pra nós tem o mesmo valor de quando vivos apertamos suas mãos. A última morada tem endereço fixo no campo santo. Ali não se visita a não ser em dias especiais.
O dia de visitar entes queridos. Depois de suas partidas. Recai no dia de amanhã. Ali compareço. Percorro o campo santo. Oro no túmulo de meus pais. Deposito flores vivais no lugar onde repousam mortos. Nem sei se eles. Suas ossadas brancas. Que talvez tenham sido jogadas num saco preto. Sabem se eu ali estive. Mas sei que tudo aquilo que foi passado junto deles traz-me uma saudade imensa. Daqueles tempos bons que infelizmente não voltam mais.
Enquanto houver vida deveria haver esperança. Em dias melhores; creio eu.
Mas tudo aquilo que tem passado Zezinho Desesperançoso. Descrente de tudo na vida. Uma vida dura se é que se pode ser chamada vida. Pra ele melhor a morte. Isso ele me disse num dia igual aos outros.
Zezinho nasceu numa noite chuvosa.
A casinha modesta onde morava de favor era dependurada num morro num cortiço imundo. Ali imperava a lei do mais forte. Um odor nauseabundo entrava pelas narinas daquela gente sofrida. Era um cheiro de droga misturado a fedentina de merda purinha.
Quando chovia o barranco descia na enxurrada. Na última tempestade acabou por soterrar barracos ceifando muitas vidas preciosas.
Zezinho era tido como um garoto sem defeitos. Prestativo pronto a ajudar aos outros.
Mas a vida que ele levava nada tinha a dever as piores que tenho noticia. Sua mãe postiça era promiscua de verdade. Um dia ela aparecia em companhia de sujeitos nada recomendáveis. Fazia sexo desprotegida. Daí a ver crescer a barriga que desinchava nove meses depois.
Zezinho sempre me dizia: “enquanto houver vida deveria haver esperança”.
Mas naquela madrugada, malograda. Numa noite que choveu a encher baldes. O barraco onde vivia Zezinho foi abaixo na enxurrada. Nada restou dele a não ser um monte de tábuas apodrecidas pela precariedade da construção improvisada.
Naquela noite trágica sucumbiram amigos de nosso amigo Zezinho. Nem se sabem quantos; foram- dezenas.
Enquanto houver vida deveria haver esperança. Não foi bem assim no caso de nosso infeliz amiguinho.
No dia seguinte ao infausto ocorrido fez-se sol. O dia amanheceu ensolarado.
Zezinho, à procura de conhecidos naquele monte de escombros. Usando as mãos como pás. Acabou encontrando um amigo chegado. Era ele o único amigo de verdade por quem nutria uma sólida amizade.
Antenorzinho foi encontrado ainda vivo. Respirando debilmente debaixo de um monte de blocos de concreto.
Foi levado ao hospital onde acabou morrendo horas depois.
Até hoje, quando me encontro com Zezinho. E paramos para uma prosa o assunto é sempre o mesmo.
Enquanto houver vida deveria haver esperança. Pena que ela morre quando menos se espera.
No final do caminho deveria haver luz. Mas quase sempre nos encontramos na escuridão.