Meu primeiro amor

Dizem que dele a gente nunca esquece.

Mas, a dor do desamor, da mesma forma gruda na gente como tatuagem inapagável.

Quem não se lembra do primeiro beijo roubado? Daquela carinha toda vermelha que apareceu na menina após ter consentido, em parte, ser beijada pelo primeiro namorado?

Daquele roçar de mãos. Daquela troca de olhares. Cada um caminhando no rela do jardim. Depois da missa das dez. Ávidos por ouvir da boca do padre celebrante: “vão em paz. O Senhor os acompanhe.”

E nem era preciso ouvir duas vezes. Eu, menino ainda, desgrudava-me dos olhares dos meus pais e ia correndo ao jardim. Já sabia, de antemão, que aquela linda menina, um aninho a menos do que os meus, já me esperava toda serelepe dando voltas na pracinha. E elazinha, não tão pudica, me olhava há tempos idos, a espera que eu tomasse a iniciativa. E a convidasse ao cinema. Na matinê, desde que eu pagasse a entrada e comprasse um saco enorme de pipoca. Foi então que dela afanei o primeiro beijo. Que deixou desejo de ir mais adiante. Pena ter ficado só nisso. Pois os anos nos encaminhou cada um pro seu canto. Perdemos todo o encanto. E nem sei por onde anda aquela menina de tranças, toda marcada por sardinhas lindas. Que se ruborizava todinha a um simples roçar de mãos.

O primeiro amor a gente nunca esquece. Mesmo que os anos passem. E a gente envelhece. Tão rapidamente. Mais que se pensa.

Se me perguntarem quem foi meu primeiro amor não reluto em responder.

Foi aquela que me deu a vida. Presenteou-me com o primeiro beijo na face. Sujinho de restos de placenta. Meu manto protetor que de dentro dela saiu.

Ela, minha mãe, que Deus a tenha, de verdade foi minha primeira paixão. Ainda nem sabia identificar outros tipos de amores. Já que amor de mãe é diferente de tudo aquilo que conheço. Ele resiste ao passar dos anos. Não se perde nem no abandono. Fica grudado na gente por toda uma vida. Extrapola essa vida que termina com a morte. E penso ficar eternamente atado aos nossos pensamentos. Pois, mesmo que ela parta rumo ao infinito ela sempre vai ficar presente olhando por nós lá do alto. Com seus olhos inquiridores a nortearem nossa conduta. E como sinto falta de suas repreensões de quando menino: “´Paulinho. Não se atrase para o almoço. Ele vai ser servido ao meio dia. E não se esqueça das suas lições de casa.  Se não se comportar bem; menino sapeca, não irei ajudá-lo nas contas da aritmética. Seu ponto fraco”.

E eu obedecia a minha mãe. E voltava a casa pontualmente à hora do almoço. E me assentava àquela mesa coberta de azulejos de todas as cores. Que infelizmente não existe mais.

Já outro menino, meu coleguinha de jardim da infância, de nome Narizinho Arrebitado, que ficava pertinho do clube que inda frequento nos dias de hoje, o LTC.

Cujo nome, se não me engano era Joãozinho, mais crescidinho. Era o terror da menininhas não tão pudicas.

Ele se engraçava com todas elas. Pra ele não tinha menina feia ou menos.

Aos sete já contava nos dedos quantas namoradas colecionava.

Era um palrador de mancheia. Prosa como ele só.

Na hora do recreio era a Mariazinha com quem ficava. Depois da aula não se sabia qual menina era a bola da vez.

Joãozinho não tomava jeito. Ora com uma, outra vez com nenhumazinha.

Um dia a ele inquiri qual seria seu primeiro amor.

Ele me respondeu zombeteiramente. Com um sorrisão a enfeitar-lhe o rostinho sardento: “quer mesmo saber? Foi a Carijó”.

Meio em dúvida quem seria a sortuda de novo quis saber quem era a tal Carijó.

E ele de novo sanou a minha inquisição.

“Carijó era a galinha da minha avó.  Ela sim foi meu primeiro amor. Só não nos casamos por incompatibilidade de gênios e gemidos. Eu sempre preguiçoso. Acordava depois das dez. A galinha Carijó me despertava ao nascer do dia. Acusando o nascer do ovo.”

Já o meu primeiro amor até hoje acorda ao meu lado.

 

 

 

 

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