Por vezes me questiono: “até quando vale a pena viver”?
Um amigo me respondeu: “até quando puder andar”.
Já outro, a mesma resposta confidenciou-me: “até quando meus olhos puderem admirar a beleza. E todo encanto que esse mundo maravilhoso puder me brindar”.
Um terceiro disse outra coisa: “vou vivendo até quando não me tornar um peso morto a minha família. E puder dizer o quanto amo a vocês. E que a minha despedida possam dizer, a beira do meu túmulo: “ exemplos ficam. Saudades permanecem”.
Já eu digo que a vida vale a pena, desde que possamos enxergar não apenas a beleza. Mas que devemos nos condoer de tudo que nos ofenda a dignidade. Qual sejam as desigualdades. A pobreza que nos cerca. As crianças sem escola e vivem a margem de uma sociedade que privilegia aqueles endinheirados. Esquecendo-se que a felicidade pode morar em barracos dependurados nos morros. A mercê de chuvas e desabamentos.
Parafraseando um locutor esportivo que nos deixou no dia de ontem. Quando ele disse: “a vida só termina após a morte quando as pessoas não se lembram mais da gente”.
E eu completo seu dizer usando outra frase célebre de um grande escritor mineiro: “as pessoas não morrem. Ficam encantadas. A gente morre pra provar que viveu”.
E que sentido pode ter a vida quando se perde a clarividência? O bom senso nos abandona. As pernas não nos obedecem mais?
Pra que viver além das nossas forças? Quando nossos olhos não enxergam o despertar do sol e o brilho das estrelas?
Pra que continuar vivendo quando não pudermos mais nos encantar com o despertar de uma criancinha tentando sugar as tetas de sua mãezinha quando elazinha lhe oferece o peito?
Pra que viver sem poder amar e dizer aquela a quem ama como eu gosto de você.
Enquanto puder admirar as flores num jardim florido vale a pena continuar vivo. Mas quando não mais puder olhar a beleza do arco iris depois de uma tempestade pra que continuar vivendo?
A vida vale a pena, no dito de um grande poeta, quando a alma não se apequena.
Mas como poder enxergar a alma se ela não se mostra ao clarume do dia. Será que durante a noite ela se deixa ver? Mas seria preciso morrer para podemos enxergar a alma?
Enquanto puder auscultar o tiquetaquear do meu coração. O sangue escorrer por dentro dos meus vasos sanguíneos. Minha pele eriçar quando me emocionar e meus olhos lacrimejarem.
Ai sim, vale a pena continuar vivendo.
Mas quando sentir que toda a minha sensibilidade não for compartilhada por terceiros. E meus versos se tornarem adversos ao entendimento dos que não souberem entender meus lamentos. Ai sim. Talvez não valha a pena viver.
Se um dia me tornar uma folha solta ao vento. E não puder colar essa mesma folha morta a árvore de onde ela se soltou. Pra que viver. Se acabei perdendo o encantamento. E minha vida se resume a permanecer no leito. A espera do instante final até que me fechem os olhos que não enxergam mais.
Enquanto houver vida pulsando em minhas artérias estarei por aqui importunando a vocês.
No entanto dos entretantos. Quando não mais puder extravasar minhas angústias e sofrimentos. Não mais poder dizer em letras escritas tudo que sinto. Não mais poder retratar em prosa tudo aquilo me vai por dentro. Pra que viver mais anos.
Ai sim, direi deixem-me partir. Pra onde? Não sei.
Mas se puder escolher pra onde irei. Que seja onde tenha um computador. Uma folha de papel em branco. Um lápis ou uma caneta. Mas não me impeçam nunca de continuar vivo sem deixar escrito tudo aquilo que me corrói as entranhas. Dada a sensibilidade tamanha de que sou dotado.
Um dia não mais estarei por aqui. Mas deixo a vocês como legado. Como fui feliz ao deixar tudo escrito. Enquanto houver vida pulsando dentro de mim não irei me omitir. Deixando o tempo fluir. A espera do dia em que me chamarem a ser escrivão nos céus. Ao lado dos meus queridos pais.