Quando se perde alguém que inspira não somente amor e carinho.
Alguém que cuidou de você. Deu-lhe o mais valioso presente chamado vida.
Que perdeu noites de sono tentando velar o seu.
Ensinou-lhe a falar baixinho e não desobedecer aos de mais idade.
Deu-lhe papinhas assentado àquela cadeirinha alta e sobre um apoiador auxiliar limpar a sujeira que você se lambuzou ao enfiar as mãozinhas naquele pratinho próprio de criancinhas antes do primeiro ano de vida.
Cantar cantigas de rodas até ver seus olhinhos se fecharem e aquele soninho tão gostoso que somente bebês sabem como é.
E ela mesma passou a noite acordada preocupada com uma febrezinha que durou mais que o previsto. E, por essa mesma febre não tanto alta não ceder ela o levou ao médico de crianças.
Tendo de enfrentar uma longa espera pois não tinha recursos para levar vocezinho a um pediatra que não atendia via SUS. Mesmo assim ela nunca se queixou de tantas noites insones. Não reclamou de suas artimanhas nem ao menos de suas manhas ou birras quando, mais tarde, desejando ficar ao celular nos tais joguinhos de preferência de menininhos sem juízo. Aqueles que, uma vez na escola não aceitaram o sábio conselho da professora e não aprenderam a abrir sequer um livrozinho. Um que fosse ricamente ilustrado com figuras coloridas de bichinhos do mato ou animaizinhos domésticos como cães e gatos.
Uma senhora que acabou deixando a face da terra de tanto cansaço e acabar-se numa casa de velhos. Sem ao menos receber um filho ingrato em visitas rápidas de domingos.
Eis que doze de junho se avizinha. Hoje é dia três. Contando nos dedos doze menos três perfazem nove.
E dia doze deste mês destaca-se, comercialmente, dia dos enamorados.
Tomara que o comércio se locuplete dessa data não tão importante, pra mim, como o dia das mães.
E naquele dia doze, desse mês entrante, aquele garotinho mimado, cuja mãe sempre lhe fazia todas as vontades. E ele não correspondia nem ao milésimo ou uma infinidade de partes desse amor e carinho sendo mais um filho ingrato.
O dito cujo, assim que atingiu a maior idade. Já bem situado na vida. Vendo a sua pobre mãe adoecer vítima de uma enfermidade que lhe toma todos os sentidos inclusive a capacidade cognitiva. Uma anciã inválida no leito de quase morrer. Ao revés de ampará-la quando ela mais precisava a internou num asilo de idosos. Deixando-a ali entre seus iguais a espera do minuto final.
E esse momento chegou como previamente anunciado. Dona Sebastiana, esse era seu nome, ao dormir, numa noite de domingo, acordou sem ter acordado. Dona Sebastiana subiu aos céus se despedindo do inferno que lhe fora a vida inteira. Mulher guerreira, obstinada e caridosa com os mais necessitados.
Já Antônio, seu filho único, o mesmo que, uma vez em situação mais que confortável, usufruía de um alto salário na firma em que trabalhava, sem dó nem piedade internou a própria mãe numa casa dita acolhedora de velhos abandonados à própria desgraça.
Mas, como passam os dias, sucedem-se meses, naquele dia doze de junho, dia frio, cinzento, os colegas de Antônio, todos eles acompanhados de suas namoradas ou prestes a se casarem, ao perceberem nos olhos do colega uma tristeza profunda, um deles, seu maior amigo, a ele perguntou: “ e você Antônio, não tens namorada? Não ama a ninguém”?
Antônio emudeceu.
Passou minutos sem balbuciar qualquer som ou palavra.
E, num ímpeto de esforço acabou, debulhado em lágrimas, falando chorando, olhando pros céus: “por favor. Traga ela de volta pra mim”.