São tantas que enfeitam a via láctea que desconheço o nome da maioria.
Estrela Dalva que no céu desponta. Do Cruzeiro do Sul, que aqui brilha em nosso céu. Estrela Virgem que se deixou desvirginar pelo brilho do sol. Estrela Escorpião que pica com sua luz ofuscante. A Cão Maior que ladra, mas não morde. A Cão Menor que ainda é uma filhotinha. A estrela Navio Triângulo Austral que desconheço seu brilho. As estrelinhas Hidra e Oitante que atualmente figuram em nosso pavilhão nacional. E outras que nem sei nominar.
Estrelas nos permitem caminhar durante a noite graças ao seu brilho e luminosidade. A lua é sua cúmplice. O sol, ao revés, acorda quando elas dormem.
Já tentei caçar estrelas durante a noite. Andando na escuridão na minha rocinha. Desapetrechado de uma lanterna que me guiasse. Tateando na escuridão. Olhando a esmo pelo caminho. De vez em quando via uma luzinha miúda. Piscante tal e qual uma estrelinha recém egressa do seu ninhal de estrelas. Apanhava, com as mãos em concha, uma dessas luzinhas que em verdade eram coisinhas vivas. Cuidadosamente tomava aquelas luzinhas em minhas mãos. Eram vagalumisinhos acasalados. Cada um deles avexado por serem pilhados fazendo amor.
Levava as duas estrelinhas. Não eram estrelinhas desgarradas do céu. E sim meros pirilampos dos grandes. Em uma caixinha de fósforo vazia levava os dois à varanda da minha casa. Não sem antes prometer que os deixaria livres novamente. E os soltava de novo rumo aos céus. E, naquele avoar serelepe o casal de vagalumes apaixonado me dizia em vozinha melodiosa: “obrigado menino artioso. Você quase nos matou de susto. Agora sabemos que não queria fazer mal a gente. Livrou-nos de mal maior. Poderíamos virar comida de um passarinho que por ali passasse. Por sorte nossa você passou em nosso caminho e agora nos libertou para que nos juntássemos as nossas amiguinhas. Aquelas entrelinhas de verdade. Que um dia foram vagalumisinhos como nós”.
Conheço meu preclaro amigo Zé Antonho a um par de anos.
Com ele proseio de vez em quando. Sempre assentado naquela laje de pedra dura defronte a sua morada. Num descanso mais que merecido. Paro a caminhonete um par de minutos. Tentando adiar minha volta pra cidade. E com ele aprendo muito.
Zé Antonho nunca o vi tristonho. Ri da própria desventura.
“Ah é!” Seguido de outro “Ah é”. Parece ser essa a expressão que ele mais usa.
Seu Zé nunca se queixou da vida.
Pra ele felicidade dá no mesmo que viver na singeleza do singelo. Trabalho nunca lhe meteu medo. Ama de montão uma enxada. Das grandes se gaba ele. Tem pela foice um caso de amor de verdade. Dizem, nas cercanias sem cercas, que desde que sua amada esposa faleceu, ele dorme grudado a uma foice das maiores. Não faz amor com ela, mas por ela tem verdadeira adoração.
Seu Zé Antonho coleciona calos nas mãos cascorentas. Naquela tez tostada pelo sol quase não se vê rugas ou expressão de cansaço.
“Canso-me sim. De ficar a toa”. Filosofa ele sem nada entender de filosofia.
Zé Antonho, em tempos recentes, tem sido vítima de pertinaz enfermidade.
Já lhe fiz uma visita quando ele esteve internado aqui pertinho na Santa Casa. Mas ele de pronto se restabeleceu.
Nos fundos de sua morada ainda tem um montão de pés de jabuticaba. Lembro-me de quando as degustei. Bananeiras ali nascem aos montes. Amizades genuínas também ali vicejam.
Todos que o conhecem o tem em alta estima. Creio que Zé Antonho não tem desafetos. Quem não gosta de uma pessoinha como aquela não gosta de si mesmo.
Faz tempo que não o tenho visto assentado naquela laje de pedra dura. Tem me preocupado a saúde do amigo Zé Antonho.
No dia de ontem soube da notícia do seu paradeiro.
Já era noite.
Ao olhar pro alto. Olhando as estrelas. Notei que uma delas sorria pra mim.
Era uma estrelinha de raro brilho. Nem tanto grandona como as outras. E nem tão pequenina que ofuscasse o brilho de suas irmãs.
Tentei olhar pra ela usando um binóculo. Era uma noite bem escura.
Prestes a fechar os olhos, tontos de sono. Ao admirar aquela estrela que pensava ser uma novinha. Recentemente inserida entre as demais.
Dela ouvi uma expressão velha conhecida.
“Ah é!”
Não tive dúvidas.
Aquela estrelinha sorridente era meu amigo Zé Antonho. Que tão logo faleceu subiu direto aos céus. E agora brilha com seu brilho singelo. A ser admirada aqui de baixo. Como uma pessoinha boa que era.