Bons tempos aqueles

Hoje, bem cedinho, como de costume, ao saltar da cama, a primeira coisa que vi foi uma velha fotografia em preto e branco.

Nela estávamos desenhados nós três. Meu pai, vestido num elegante terno azul marinho. Minha mãezinha querida ao seu lado. E euzinho, creio que aos três aninhos, montado nos ombros do meu saudoso pai.

Bons tempos aqueles em que eu, ainda meninozinho, aprendendo a engatinhar. De cabelos cacheados, clarinhos. Mal sabia o que a vida iria me presentear.

Essa velha fotografia foi tirada na cidade onde nasci. Mas logo para essa que vivo agora me mudei.

Andando mais alguns anos. Já mais crescidinho. No primeiro ano do curso primário. Aqui na cidade que considero minha. E de mais vocês. Foi quando aprendi as primeiras letras. Que saudade da professorinha que me ensinou o baba. Bons tempos esses. Que quando gazeteava aulas era posto de castigo sem poder assistir aos desenhos animados. Meio sem gracinha voltava a minha casa. E não podia jogar bola naquele campinho cambeta. Na agradável companhia dos meus coleguinhas. Muitos não jogam mais, pois moram no céu.

Já perto da responsabilidade. Entrando porta adentro da mocidade. Naqueles verdes anos da minha vida. Recém egresso do segundo grau. Foi quando me decidi pela medicina. Bons tempos aqueles quando me mudei para Belo Horizonte, capital do meu estado. Morava com todo conforto num amplo apartamento. Na Rua da Bahia, na verde vizinhança do parque municipal.  Bons tempos aqueles que frequentava uma casa de mulheres damas. De nome Zezé. Foi então que aprendi que elas não têm vida fácil. É um tal de entrar um freguês.  Sair outro com as calças ainda nas canelas. E se não pagam antes, adeus viola.

Bons tempos aqueles, quando da conclusão do curso médico. Ainda despreparados para clinicar. Mais uma etapa de nossa formação nos esperava. Éramos meio médicos. Faltava uma especialização.

Melhores tempos aqueles quando fui completar minha especialização na difícil arte da Urologia, nas terras de Espanha, precisamente na bela Madrid. Ali cheguei no comecinho do inverno. Já fazia frio. Na Casa do Brasil senti-me em casa. Fora o acento mineiro que foi logo substituído pelo menos doce espanhol. Foi na Clínica de Nuestra Señora de La Concepción, Escuela de Postgraduados, Fundación Jiménez Dias, que aprendi a ver, oir e callar para non molestar.

Bons tempos aqueles de volta ao Brasil. Chegando ao Rio de Janeiro oriundo de Barcelona de navio.  Naquele calorão encapotado num casaco de couro e fumando cachimbo. Usando um tamanco de salto alto à moda da Espanha.

Melhores tempos quando aqui cheguei. Pensando inserir novidades na arte da Urologia. Sendo o pioneiro nessas bandas.  Operava dias e noites em três hospitais. Não sabia como seria uma boa noite de sono. O telefone fixo me acordava em altas horas. Não tinha descanso nem férias merecidas.

Naqueles tempos idos pensava que todo médico podia ser fazendeiro. Ledo engano.  Mal sabia eu a razão de o leite ser tão branquinho emerso de uma vaca pretinha. Levei mantas. Fiz catiras erradas. Na roça aprendi a ter amigos de verdade. Lá um aperto de mão vale mais que mil notas promissórias.

Foram bons tempos que tenho passado. Já tive bons momentos em meus mais de setenta anos.

Melhores ainda os terei. Desde quando me acostumei a escrever penso que ainda melhores hão de vir.

Melhores tempos me esperam no porvir. Retratando minhas memórias.  Não me esquecendo do passado. Vivendo o presente em direção a um futuro incerto. Penso que os bons tempos que vivi vão ser reeditados.

Aqueles supracitados foram tempos fecundos. Mas o que vivo no tempo presente tem sido os melhores.  Ao lado da minha família,  dos meus filhos e dos meus netinhos.

Não há como tê-los melhores. Com certeza deixo escrito.

 

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