Queria mais tempo

Como tem valor o tempo. Sobretudo nos de mais idade.

As crianças não sabem dar valor ao tempo. Já que para elas os anos que faltam não contam.

Se pudesse dar cifras às horas que passaram. Aos minutos que se despediram da gente. Aos dias que se foram. Ao passado que nos olha com olhos de saudade. As pessoas que se despediram um dia desafortunadamente. Qual seria o valor justo?

Qual seria o preço de uma hora? Qual o valor que eu pagaria para que ela, minha mãezinha amada, de novo pudesse estreitá-la em meus braços. Dizer palavras não ditas naquele momento lúgubre de sua partida.

Queria tanto retroceder no tempo pelo menos cinquenta anos. Para repetir aquela solenidade de entrega de nossos diplomas uma vez concluído o curso de medicina.

Éramos cento e sessenta jovens médicos. Agora não sei quantos ainda somos.

Queria mais tempo para perceber. De olhos atentos. O quanto me equivoquei em não poder dedicar mais tempo aquele jovenzinho que um dia me pediu um conselho. Ele simplesmente gostaria que eu lhe explicasse o porquê dos porqueres de tantas coisas que ele não entendia. Mas eu me esquivei. Dei-lhe uma desculpinha esfarrapada. E fui embora virando-lhe as costas naquele momento de indefinição por que ele passava.

Queria mais tempo para ficar na cama naqueles dias frios ao lado de minha esposa. Mas, como de costume o leito me cuspiu a mesma hora de sempre. A imperiosa necessidade de pôr fora os meus sentimentos. Extravasar a inspiração que me cavouca por dentro.  Disse estar na hora de deixar minha casa rumo ao lugar onde me encontro.

Queria mais tempo para contemplar o pôr do sol. O desabrochar de uma flor que de botão se fez adulta. De ter mais tempo para viver em intensidade plena.

Queria ter mais tempo para ficar sem fazer nada.  A contemplar o ócio do vazio. Passar as notes na rocinha que tanto amo. Pena que a pressa do afogadilho não me permite tais extravagâncias.

Queria mais tempo para ficar ao lado das pessoas que amo tanto. Pena que a elas falta o mesmo tempo. Cada um tem seu tempo marcado. As horas pra todos passam. O tempo que nos resta se esvai cada vez mais.

Queria tanto ter tempo para escrever mais. Mas apenas me permito umas horas apenas nesse teclado negro de meu computador.

Gostaria de dar tempo ao tempo. Pedir que ele acalme sua pressa. Que as horas passem com menos sofreguidão. Que essas horas se encompridem um cadinho mais.

Queria pedir ao tempo que ele não conspire contra meus sentimentos. Que ele simplesmente me permitisse ficar um cadinho mais aqui onde estou. Que não precisasse voltar ao cotidiano. Que pudesse sonhar muito mais. Que não tivesse de enfrentar a realidade. Que meus sonhos fossem concretizados. Que meus devaneios fossem a expressão da verdade.

Queria mais tempo para dizer a vocês o quanto amo escrever. O prazer que me dá ver concluso um romance. Que seja uma crônica apenas. Uma linha, um parágrafo inteiro.

Queria umas horas apenas para viver fazendo tudo aquilo que me apraz.  Que tudo aquilo que me aborrece ficasse no olvido do esquecimento. E queria ainda que o mesmo tempo ficasse ao meu lado. Esquecendo-me das horas de ressentimento. Curtindo apenas o amor dedicado.

E como me aprazeria se o tempo ficasse meio atordoado. Esquecendo-se de que tem de ir adiante. E os ponteiros dos relógios refreassem sua vontade de caminhar sempre no sentido horário.

Queria muito que o tempo se aquietasse. E confabulasse comigo em voz tranquila e morosa.

“Você me pediu que eu desse tempo a mim mesmo. Aceito o seu pedido. Daqui pra frente vou seguir mais calmo. Satisfeito”?

De nada adiantou minha súplica. Agorinha mesmo era vinte pra seis. Agora já são seis e trinta.

Como o tempo passa. Mesmo contra meus desidérios.

 

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