Ainda há tempo

Mais uma vez me atenho ao tempo. Ele conspira contra nós.

Não consigo dar tempo a ele. Refrear-lhe o ímpeto.  As horas passam velozes independentes da minha vontade.

Se eu pudesse dar tempo ao tempo a primeira providência seria tirar a pilha dos relógios. Na intenção de retardar o movimento dos ponteiros. Ou até mesmo suplicar-lhes que eles caminhassem menos apressados. Ou então se movessem no sentido oposto. Para então. Ao olhar as horas elas iriam calmamente dias atrás. Ou até mesmo em direção aos verdes anos de minha vida. Ou a minha infância perdida. Cujos anos não voltam mais.

Ainda há tempo. Penso eu. Nessa altura de minha vida. Uma vez a mocidade perdida. Que tal refazer meus senões. Cometer menos pecadilhos. Perdoar aqueles que porventura me tenham ofendido. Escolher com mais acerto a parceira que comigo divide o leito. Mas não tenho como me queixar da minha família. Tanto a que me fez homem. Como aqueloutra que me presenteou com três netinhos lindos.

Ainda há tempo. Embora muitos anos tenham passado. Nessa minha vida entremeada de bons e maus momentos. De retroceder ao passado. De me lembrar de amigos que já se foram e deixaram atrás uivos de saudade.

Ainda há tempo de voltar atrás. De me recordar de momentos felizes. De não tentar apagar a tristeza que chora dentro de mim. Pois penso eu que nem somente de alegria a gente vive. E como valorizar a felicidade se não temos a capacidade de sentir aqui dentro toda a amargura do mundo.

Aprendi com um amigo. Gente da prateleira de cima. Que um dia me disse: “já estou bem rodado em anos. Minha vida foi entremeada de alegrias e tristezas. Pensava ter escolhido a mulher certa para me casar. Mas, com o tempo passando. Com os verões se transformado em invernos. Ela desvendou sua verdadeira cara. De anjo bom ela se metamorfoseou em um demo. Não me atura mais. Reclama de todos os meus atos. Faz que não enxerga minhas qualidades. As minhas preferências não coadunam com as delas. Se digo ser isso gato ela me contradiz dizendo ser sapato. Não passamos mais na pinguela juntos. O que ainda me ata a ela é a família que constituímos juntos. Nossos netos e filhos. Não fosse por isso. Agora, nessa altura da minha existência. Não sei mais quanto tempo mais estarei por aqui. Já que em muito já dobrei o cume da serra. Penso ainda ter direito a uma nesguinha de felicidade. Ao lado dela sei que não. Ainda há tempo para ser feliz. Vou procurar a tal felicidade e não sei onde a encontrarei. Não sei viver só. Preciso estar ao lado de outra pessoa que comungue meus gostos e preferências. Hoje me sinto um homem sem rumo e sem prumo. Ainda há tempo de buscar a alegria de viver. Agora somente a tristeza me acompanha”.

Bem sei que é preciso coragem para mudar de vida. Mas que vida é essa que temos levado?

Todos nós temos o direito de novamente reencontrar a felicidade. A vida seria insuportável não fossem as mudanças. Mudamos de endereço. De roupa. Por que não mudarmos de parceira?

Seis que as horas passam. Os dias se sucedem. O tempo não para.

Nesse dia de marco. Dia treze. Não de azar.

Para o meu amigo que decidiu ir de encontro à felicidade foi de pura sorte.

Ainda é tempo de ser feliz. Mas para isso é preciso coragem. O que não me falta.

Ainda há tempo. E peço ao tempo que me resta para que seja condescendente para comigo. Como foi para o meu amigo. Que hoje reencontrou a tal felicidade nos braços de outra mulher.

 

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