Com ele aprendi

Hoje, sexta-feira, amanheceu um dia plúmbeo.

Logo o sol vai brilhar novamente. A temperatura pouco a pouco aquece. No decorrer do dia deve esquentar um cadinho mais.

Ainda me lembro de quando comecei a aprender as primeiras letras. Sempre tive por elas uma adoração sem igual.

O abecedário completo logo fui capaz de aprender. Já os numerais mal entravam em minha cabeça.

Fui um aluno acima de média. Não o primeiro nem o derradeiro.

Tirava notas boas. Sempre ficava no quadro de honra.

Ao final do mês trazia meu boletim pra casa. Ele, sempre zeloso pela educação de seus filhos, olhava atentamente para ele e me dava de presente um elogio pra mim o bastante para continuar mais e mais um aluno aplicado. Estudioso e comportado. Pena que por vezes as minhas notas não eram tão altas. Mesmo assim no mês seguinte novamente elas subiam como um balão. Não atingiam a estratosfera. Mas não aterrissavam na terra caindo abaixo da média. Como ele sempre me orientava.

Bem me recordo do dia em que ele subiu às alturas. Vinte e três anos se foram. Meu saudoso pai foi embora numa manhã como essa. Num dia de céu plúmbeo. Como esse que recém amanheceu.

De vez em quando visito o campo santo. Faço uma prece rápida no entorno de seu túmulo e me despeço dos meus pais prometendo um dia de novo reencontrá-los. Nalgum lugar por mim desconhecido.

Ai que saudades ambos me trazem. Das vezes em que  eu, menino, montado a cavalo em seus ombros fortes. Eles ainda jovens. Naquela Boa Esperança onde nasci. Sorria sem sabe qual seria meu destino. Incerto como a vida nos acena. Já que não sabemos o que será de nós.

Creio, onde ele estiver, nesta antevéspera do dia dos pais. Que por certo ele me abençoa. Ao lado de minha mãe. Olhando pra  mim aqui em baixo. Com os mesmos olhos cheios de ternura quando ainda vivos.

Com ele aprendi tantas coisas.

Que seriedade e cumplicidade são virtudes imorredouras. Que o aprendizado não deve terminar.

Que a capacidade de perdoar. Mesmo a contragosto. Que estender a mão a quem precisa deve ser seguido a risca.

Com ele aprendi, segundo suas palavras, que o ócio é o começo do fim.

Com meu pai aprendi que não se deve nunca deixar os sonhos em banho maria. Que sonhar é preciso. Mesmo que  o acordar seja em pesadelo.

Com ele aprendi que boas maneiras nos aproximam do próximo. Que lisura no trato  nos faz pessoas melhores.

Com ele aprendi que se deve tratar os mais velhos como se fossem prioridade. Já que um dia a senilitude vai ser nosso porvir.

Com ele aprendi a amar os cães. Já que eles são nossos melhores amigos.

Meu pai. Paulo José de Abreu.

Quem teve a sorte de conhecê-lo bem sabe como ele era.

Gerente de uma casa bancária. Uma vez aposentado não desistiu do trabalho.

Pena que por pouco tempo exerceu a advocacia.

Ainda me lembro de suas petições corretas. Da sua lisura no trato com as pessoas.

Inserido no tampo de seu túmulo consta uma frase minha: “saudades ficam. Exemplos permanecem”.

Meu querido pai. No domingo próximo o senhor não vai estar aqui para abraçá-lo.

Mas sinta-se abraçado. Nessa crônica que agora terminei. Nesta sexta-feira que começou cinzenta.

Mas agora, nesse momento, o sol entra pela minha janela. Como se fosse o senhor mesmo que por ela entrasse.

 

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