Lembrar, recordar, reviver, trazer de volta algo acontecido anos atrás, caminhar no tempo pretérito, voltar ao passado, são coisas e loisas de mim inseparáveis.
Eu não me separo de tantas lembranças. Naquele tempo em que fui criança. Anos avoam com suas asas imaginárias. Levando-me de volta àquela rua. Tantas vezes citadas em crônicas passadas. Embora me situe no presente tenho pelo passado em alta estima. Da mesma forma que ele não se desgruda de mim eu não o perco de vista, jamais.
Mesmo se eu pudesse e minha vontade ditasse, diria a ele: “ por favor. Se por acaso você se perdesse no tempo deixe pelo menos um rastro de saudade por detrás de ti”.
E saudade está intimamente unida ao passado. Sentimento esse que consegue molhar meus olhos. Pois, da mesma maneira que o tal passado não me deixa. Eu não me permito deixá-lo nem que eu queira.
Já aquele senhor, o qual nos conhecemos num passado recente, seu nome era Alberto, o mesmo nome de meu avô, pai do meu pai, era a sinonímia maior do que significa viver de lembranças. Ele não se esquecia de sua infância. Da casa onde passou a morar. De seus pais já velhinhos a espera que ele os visitasse naquela casa de idosos.
Alberto, já aposentado, aos mais de setenta anos, passou a viver só.
Ele havia perdido a esposa há anos atrás. E como ele a amava. Vivia por ela e ninguém mais.
Durante as noites mal dormidas amarfanhava o travesseiro tentando dele sugar o cheiro doce da amada. Mas ela já não estava.
Não tiveram filhos.
Não por desejo deles. Alguma doença ligada ao sexo impedia-os de procriar.
Viviam os dois em perfeita harmonia. Nunca os vi rusgar. Eram o exemplo perfeito de total sintonia. Ambos aprenderam cada um a se respeitar.
Depois da morte da esposa Alberto passou tempos difíceis. A lembrança dela o perseguia durante as noites e o clarume dos dias.
Ele se lembrava continuamente dela. Uma linda fotografia ele mantinha ao seu lado.
Dona Dulce, era seu nome, dela não se desligava. E uma saudade imensa o atormentava.
Lembrava-se dos bons tempos de namoro. Do noivado que pouco durou.
A festa de casamento até na presente data era mantida em suas recordações mais ternas.
A lua de mel, bons tempos. Melhores dias.
Já o dia em que ela foi chamada aos céus o pior de sua vida.
Alberto, com olhos marejados de lágrimas, lembrava-se sempre daquele funesto dia.
Ele passou a noite toda velando o corpo de sua amada. Levou-a ao campo santo debulhando-se em prantos.
E a cada dia, até anos mais tarde, sempre ao seu túmulo visitava. Deixando naquela lápide fria além de lágrimas um lindo ramalhete de flores que ela mais gostava.
Anos se foram.
Alberto vivia entre recordações da única pessoa a quem amou de verdade.
E sempre na data em que ela fazia aniversário levava o mesmo ramalhete de flores azuis a enfeitar por pouco tempo o tampo daquele túmulo.
Ali permanecia solitário até que a noite chegasse. Mas seu desejo era permanecer junto dela até o dia do seu chamamento.
Mas esse dia não chegava nunca.
Alberto era saudável. Nenhuma enfermidade o fazia acamar.
Mas as lembranças o atormentavam. Dulce se fora deixando um vazio impreenchível a sua falta.
Lembrava-se dela sempre. A imagem de sua santa não o deixava em paz.
Um dia, já se faz algum tempo, em passagem pela cidade onde Alberto morava, não o encontrando mais, soube noticias dele.
Ele foi encontrado dobrado sobre o túmulo da amada Dulce. Já sem vida.
Dizem que ele não saía de lá desde a semana passada. Dormia deitado na lápide fria.
Já sem vida Alberto passou seus derradeiros dias ali mesmo. Perdido em suas lembranças.
Enfim ele se reencontrou com sua amada em outra vida.