“Essa é a minha casa”

Muitos confundem casa, residência, com lar.

Qualquer um pode ter uma casa. Que seja grande ou pequena. Tudo depende do poder de compra desse indivíduo. Se for abastado ele pode construir casas enormes e com todo conforto que seja num condomínio fechado ou com vistas para o mar.

Se for de poucos recursos ele, que seja um pedreiro construtor. Um reles alfaiate desempregado pois viu seu negócio ir ao fundo,  ou qualquer assalariado cujo rendimento vai até a primeira semana simplesmente. Esses brasileiros podem se inscrever no programa Minha Casa Minha Vida. E ficar a espera de que o nosso presidente execute suas promessas de campanha. E não fique a espera a Deus dará.

Mas um lar pra mim significa mais que ajuntar aparentados sob o mesmo teto. Eles devem viver em harmonia  sintonizados entre eles. Nos bons e maus momentos. Enfrentando dificuldades a cada hora que elas chegarem.

Muitos não dão valor a um lar de verdade. E tentam destruir as paredes não restando pedra sobre pedra daquela casinha humílima onde viveram tempos até a dissolução da família, ou por morte dos pais ou devido a desunião que pôs a pique esta embarcação que dantes navegava em águas plácidas de um mar sossegado.

Lar vai além de uma casa no campo. Onde dantes recebiam os amigos. Ele deve ser edificado não apenas em paredes bem feitas, fincadas em alicerces sólidos. Como é essencial que aja além de companheirismo amor de verdade.

Muitos pobres coitados, sem tetos, andarilhos, passam noites ao relento. Se chove eles não têm como se esconder dos pingos da chuva nem ao menos da friagem das noites invernais.

Um dia destes, de volta ao meu apartamento, andarilho que sou, ao atravessar uma rua movimentada deparei-me  com um cadeirante esmolando à porta de um banco.

Seus olhos denunciavam sofrimento e desalento. Ele se mostrava esquálido e com feições que indicavam idade maior que deveras tinha.

Era uma hora em que pessoas entravam e deixavam a casa bancária preocupadas em pagar as contas que os atazanavam. Felizmente as minhas já foram saldadas.

Ao olhar para aquela pessoinha atada a uma cadeira de rodas tosca. A qual urgia ser trocada por uma nova.

Ainda pensando em lares, residências luxuosas. E infelizes como ele sem poder andar pelas próprias pernas.

Parei um minutinho para um dedo de prosa com ele.

Seu nome era Eusébio. Sua idade era trinta de seis anos exatos completos naquela terça feira de junho.

Ele acidentou-se quando trabalhava numa estrada de ferro como operário da construção de linhas férreas.

Quando se preparava para colocar dormentes uma locomotiva o pilhou repentinamente e ceifou-lhe as duas pernas.

Eusébio passou um mês inteiro num leito de hospital entre a vida e a morte. Quando suas pernas davam sinais de necrose ofereceram-lhe uma chance de continuar meio vivo sem as duas pernas que tanto lhe faziam falta.

Foi aposentado por invalidez apenas com um salário mínimo. Por sorte, ou não sei se por azar, ele não tinha família que o amparasse naquele momento de dor.

Ao receber alta, a espera de uma prótese de membros inferiores, ao recorrer ao SUS, foi-lhe dito que deveria esperar.

E  essa espera dura até hoje.

Eusébio esmola pela cidade toda vendendo balas nos semáforos fazendo de sua cadeira de rodas seu sustento.

Ao lhe perguntar se ele tinha morada ou uma casinha onde se agasalhar nos dias frios e passar noites num leito qualquer ele me respondeu mostrando em sua face crispada pelo sofrimento de anos e anos atrás: “ essa cadeira de rodas velha é a minha morada. Ando através dela. Ajudo no meu sustentar por ela. Não sei o que seria de mim sem ela.”

E ainda penso que muitos sentem-se infelizes tendo um teto onde se abrigar. Exemplos como o de Eusébio me fazem pensar.

 

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