Diz a física: “polos de naturezas opostas se atraem. Já polos iguais se repelem.”
O material que melhor representa o magnetismo é o imã. Formado por uma corrente continua de elétrons o imã é capaz de gerar uma corrente magnética na área que o cerca.
Mas se me perguntarem o por que de os polos opostos se atraírem questiono essa assertiva.
E penso exatamente o revés.
Dia doze, tido como o dia dos enamorados, deixou no seu rastro buquês de flores, caixas de bom bons desde as mais em conta como aquelas de preços mais elevados, jantar romântico à luz de velas, piqueniques recheados de juras de amor eterno. No dia seguinte aquele casal tido como apaixonado. De retorno ao lar doce lar notou um azedume na relação que parecia não ir por água abaixo como numa fria noite no mar quase o navio aportando em Nova York, e não é que o Titanic foi ao fundo?
Dona Josefa e seu amado Antônio, dantes prestes a se casarem, prometeram junto ao padre celebrante respeitarem-se, ajudarem-se, amarem-se como Ele nos amou, depois da troca de alianças, no mesmo altar, assim que a festa terminou as rusgas começaram já na lua de mel que logo se transformou no amargume do fel. E acabou dando no que deu.
Eles pareciam ter sido feitos um para o outro. Explicitando melhor a tampa da panela que em pouco tempo a pressão dos anos fez voar tudo pelos ares.
Antônio gostava de letras e sua Josefa parecia apreciá-las durante o namoro para agradar seu futuro príncipe consorte.
Quem os visse grudadinhos no rela do jardim jamais iria pensar serem tão díspares.
Mas, segundo o dito antes que dois opostos se atraíam a nossa história de amor até que em sua metade parecia ter um final feliz.
Mas passada a metade, ou antes mesmo, o que era amor se provou ser recheado de desamor.
Josefa era amante de ficar até altas horas assistindo a televisão. Na mesma cama do marido antes amado e respeitado. As querelas iniciaram e terminaram em discussões acaloradas sobre quem deveria desligar o aparelho.
Antônio, mais cordato, consentia em apagar a luz e deixar seu leito naquele frio inverno, usando o seu pijama listrado de algodão quente, sem reclamar da falta de educação de Josefa. E sempre ele quem fazia as vezes de faxineira já que com o tempo passando e a grana faltando, pagar a uma doméstica foi deixando de lado ao mês seguinte até terminar sendo ele o incumbido das lidas do lar enquanto a sua esposa antes amada e ainda respeitada se reservava a ficar quase o dia inteiro fofocando com a vizinha do lado.
Antônio amava ler e dava seus pulinhos em versinhos pouco eruditos que falavam da vida no campo como ele apreciava tanto.
Um deles dizia assim: “ tenho preso a uma gaiola um canarinho amarelinho de nome Antenor. Ele canta e me encanta. Canta mesmo engaiolado. Quando oiço seu trinado por ele me espanto. Como pode alguém, vendo cerceada a sua liberdade, cantar tão lindo assim. E se eu pudesse me ver livre desses grilhões que me unem a outrem, em verdade deles me livraria. E pensar que polos distintos se atraíam não cometeria tamanha atrocidade em atentar contra a minha própria felicidade ao me unir a uma pessoinha tão distinta de mim”.
Não carece dizer o que sua antes tão amada e idolatrada Josefa pensou ao ler escondidinho nas dobras do cobertor esse versinho brotado de uma noite mal dormida quando as discussões quase foram às vias de fato. Por sorte a educação esmerada do infeliz Antônio nunca lhe permitiria alçar um dedo sequer a quem quer que fosse sua mulher.
E mais uma vez as brigas de boca não caíram no olvido do esquecimento do infeliz marido que dantes jurou amor eterno naquele dia já esquecido do casamento.
E aquela relação, cada vez mais conturbada, entre Antônio e Josefa continuou anos afora no mesmo ritmo maçante entre dois que não mais se amavam.
E pensar novamente que dois polos desiguais se completavam me provou ser descabida de verdade.
Foi numa tarde domingueira que passei pela soleira da porta onde Antônio estava cabisbaixo e pensativo.
Ele me pareceu alquebrado e infeliz. Bem sabia eu o motivo.
Já que conhecia a razão de sua tristeza que assinava o nome Josefa.
“Antônio. Sinto que tudo vai mal. Existe uma razão racional para tamanha tristeza? Se seu casamento, do qual fui padrinho, não vai bem pra todos os males tem uma solução. A solução para que você volte a ser feliz passa pela dissolução. Sei que você ama ler e escreve razoavelmente bem. E que a Josefa mal sabe ler e passa o tempo inteiro naquela prosa insossa com sua vizinha da porta do lado. Não se sente atraído com minha ideia meio louca?”
Antônio, ainda de cabeça baixa, disse-me quase monossilabicamente: “ antes de me encantar com a Josefa encantava-me ouvir o murmúrio sussurrante do silêncio. Até compunha versos como você sabe. Depois passei a me desencantar de quase tudo. Não mais sou dono de minha felicidade e só me dei como presente a tristeza. Antes pensava que duas pessoas completamente distintas pudessem se unir e ser felizes independentemente de nosso modo de pensar e agir. Agora descobri que nem sempre dois e dois são quatro. Um de nós pode somar e dar cinco. E jamais penso entrar em acordo com nossa presumível cara metade. Como me sentir atraído se já fui traído, ela pensa que nada sei. Desavenças irão persistir. Até quando?”
É deveras verdade irrefutável e impagável. Não tem pago pra que uma relação conflituosa continue. Se ela não deu certo não penso que no futuro ela vai melhorar. Assim penso eu. Mas permito que pensem diferente de mim.