Já vi beleza em coisas e loisas bizarras, em lugares jamais imaginados.
Percebi beleza na mãe amamentando o filhote. Na mãe passarinho trazendo o alimento escondido no bico curto, sendo depois de convertidos numa pasta fácil de digerir enfiado na garganta daquelas avezinhas despreparadas para voar, frágeis e desprotegidos filhotes pequeninos, asas por serem forjadas, um dia eles irão se libertar da tutela da mãe passarinho, e avoar em direção a outros ares, repetindo o ciclo maravilhoso da vida, mãe e pai alimentando os filhos, avós ajudando aos netos, como aconteceu, num passado recente, com meus pais ainda presentes junto a mim.
Vejo beleza no vôo sem farfalhar de asas do urubu, ave que causa asco em grande parte das pessoas, mas, no meu entender pouco erudito, tenho dito, são pássaros grandes, negros como a noite sem estrelas, que desempenham papel fundamental como garis da natureza, quem iria, rumino mais uma vez, quem se atreveria a comer uma carcaça putrefata, de onde exala um cheiro nauseabundo de coisa podre, penetrando seu bico forte pelas partes moles, cada vez mais esmiuçando as partes de dentro, numa tarefa inglória de ocar ainda mais o conteúdo inerme dos animais mortos abandonados ao léu.
Vejo beleza na poesia de grandes poetas versejadores, a exemplo cito Mario Quintana, o itabirano Carlos Drummond de Andrade, Alvarez de Azevedo e Castro Alves, Cora Coralina e tantos outros. Vale dizer que poetar é tarefa de apenas quem sabe fazer versos, embora a crônica seja um gênero de igual valor e sabor.
Vislumbro beleza no bater de asas frenéticas do beija-flor osculando as flores do jardim. Assim como na borboleta de vida fugaz que paira em vôo breve nas mesmas flores do mesmo jardim multicor.
Posso até adivinhar beleza nas cores do arco-íris, que nasce e desaparece como num ato de amor.
Vejo beleza no sol que agora desperta por entre nuvens cinzas, hoje amanheceu assim. Como vejo beleza na chuva que caiu ainda ontem, fazendo verdejar os pastos, engordar a roça de milho recém plantada, aumentando a fertilidade da vacada de costelas ressequidas nos tempos tristes da estiagem prolongada.
Vejo ainda beleza, uma beleza maravilhosa, nas rosas vermelhas que enfeitam meu jardim. Ou nas margaridas brancas e amarelas que foram inseridas à terra pelas mãos cuidadosas de um jardineiro que de pouco virou flor.
Estava cansado de ver beleza por todas as partes. Afinal são tantas e tantas coisas belas vivas ou mortas na natureza, que, se ficasse aqui, enumerando todas, o tempo que tenho de vida não seria suficiente para narrar ao menos a metade de toda beleza que cabe no planeta onde vivemos. Ainda…
Ontem foi mais um dia de admirar a beleza. Desta feita foi uma linda mulher moça a responsável.
Estava presente numa academia, um Fitness Center perto de onde viveram meus pais.
Depois de correr desvairadamente em uma esteira, por mais de uma hora, o suor brotando da minha face cansada, após malhar em ferros pesados na intenção de reforçar-me a musculatura rija pelos anos vividos, nem só admirando a beleza, como fechando as olheiras às coisas não tanto belas, perto de mim passou uma moça alta, que acabou por despertar em mim o ápice da beleza pura.
Ela era esguia como uma girafa tentando alcançar as folhas mais altas da árvore das savanas africanas. Tinha uma cintura perfeita. Os cabelos negros da moça, presos em coque, de onde pendiam tranças finas, eram outro capítulo a parte na beleza feminina. Ah!, que ancas fecundas ela possuía! Dali poderiam nascer filhos e filhos sem que a parturição não lhe machucasse a beleza. Os olhos da rapariga, de qual idade seria? Eram olhos negros e grandes, do tamanho certo para fitá-los e cair de amor. O derrière era empinado. Usando a expressão em moda poder-se-ia dizer que a bunda ia até a nuca. A altura da fêmea linda era mais alta que o dobro da minha. Ela, ainda desconhecia-lhe o nome, bem que poderia ser atriz, jogadora de vôlei ou modelo de passarela. Tudo mais era lindo e sedoso na pele dela.
Não resisti aos seus encantos. Fui até onde ela estava. Perto de onde eu me postava.
A moça, de beleza excessiva, malhava em ferros na academia, sendo orientada por um personal com os mesmos dotes de beleza dela. Talvez não lhe fosse o namorado, para que isso acontecesse, torcia alto.
Foi quando, num ato quase impensado, fiz a ela algumas perguntas: “você é modelo? Se não é, deve ser jogadora de voleibol. Ou seria uma atriz famosa”?
Ela me olhou de soslaio, e me respondeu em curta brevidade brejeira. Com seus olhos escuros, com sua beleza imensa: “sou simplesmente Larissa”.
E nada mais que Larissa, nada menos do que eu pensava, com minha imaginação fértil, que sonha alto, e depois derriça ao chão de asas quebradas como aquele passarinho filhote, sem asas preparadas para voar…