Bons tempos

Ontem perdi não só um amigo. Um parente por parte de mãe. Expedito Alvarenga deixou uma lacuna enorme em nossa cidade. Embora fosse nascido em Perdões ele tinha Lavras como o lugar onde não apenas fez amigos assim como fez escola no comércio, depois de ensinar a não sei quantos discípulos a arte de vender, atender a todos com sua maneira afável, com seu sorriso aberto, sempre pronto a estender a mão a quem o procurasse na Casa Juca Procópio. A seguir montou um negócio próprio, emprestando seu nome aquela loja bem perto da praça por onde sempre passo ao cair das tardes.

Agora o primo Expedito, de quem herdei meu segundo nome, faz companhia a outras pessoas queridas, são tantas, entre eles cito meus pais.

Bons tempos aqueles da minha meninice. De quando passava as férias de fim de ano na roça de umas tias avós, nas cercanias da querida Perdões.

Foi naquele sítio aprazível, de nome Cachoeira, onde tomei gosto pela roça.

Ainda me lembro, saudades se perdem no tempo, quando, junto a alguns primos, aparentados por parte de mãe, ali passávamos meses inteiros.

Nos fundos daquela casinha modesta corria um rego d’água. O qual emprestava vida a um carneiro, artefato que jogava água na caixa que ficava por cima do telhado. O tal rego de água fazia as enormes jabuticabeiras darem duas safras ao ano. E como nos refestelávamos com aquelas frutinhas escurinhas, as quais disputávamos com as maritacas a sua posse. E quando algum marimbondo aparecia logo as nossas mãozinhas expertas passavam a outro galho. Quantas vezes caia dos pés de jabuticaba. Mas nada acontecia de gravidade. Era um tombinho pequeno. Do mesmo tamainho da nossa estatura modesta.

Ali, naquela rocinha de tantas lembranças ternas, quem cuidava da gente, a falta de nossos pais, eram duas tias que hoje fazem companhia aos anjos. Creio que elas já tinham asas. Tal a dedicação que elas tinham por nós.

Bons tempos aqueles, quando, ainda crianças, íamos à escola. Sem as responsabilidades de agora. Mal sabíamos nós qual caminho mais tarde iriamos percorrer.

Bons tempos ainda, merecem menção honrosa, naqueles idos anos, sem a velhice que nos corrói as entranhas, quando, no mesmo clube para onde vou, ao cair das tardes, jogava tênis com meu pai. Ontem fui tentar fazer o mesmo. Quase não devolvi uma bola ao outro lado da quadra. Foram um fiasco as minhas tentativas. Mas prometo me esforçar para aperfeiçoar meus golpes.

Bons tempos aqueles, que nem me recordo quais foram, de tão longínquos que se passaram, quando, no rela do jardim, dei de cara com uma mocinha linda. Foi preciso pedir ao seu pai para começar um namoro. Que se estendeu por anos e anos. Até nos tornarmos marido e mulher.

Bons tempos se vão na infinitude do tempo, quanto tempo o tempo faz, em que eu, jovenzinho ainda, ganhei de aniversário um cavalo baio. Batizei-o de Guarani. Era um cavalinho piquira. Não gostei do presente. Queria um bem maior. Mas quando o Guarani foi trocado por um cavalão, esperneei, fiz birra, e acabei recebendo de volta o querido cavalinho, que acredito tinha a mesma altura das minhas pretensões.

Bons tempos idos me recordo, quando aqui cheguei, já médico feito, depois de um ano inteiro em terras da Espanha. Foi naquele hospital, fronteiriço à casa dos meus pais, que daqui se avista pelos fundos, que ensaiei meus primeiros passos pela medicina.

Não foram fáceis os primeiros anos. Não tinha noite de sono. Afinal eram três hospitais sob minha responsabilidade. A Urologia era uma novidade. Passei mais de vinte anos trabalhando só. Mas foram bons tempos aqueles. Como foi a minha infância.

Bons tempos ainda povoam-me as lembranças. De quando nasceu meu primeiro filho. Cinco anos depois veio uma menina. Minha pequena jornalista me deu de presente o primeiro neto. Agora já são três.

Não sei quantos bons tempos ainda viverei. Quantas lembranças serão transcritas em outros textos. Citei apenas algumas delas. A maior parte foram alegres. Aquelas que me causaram tristezas, por certo irão se repetir.

Mas, viver é isso aí. Alguém, com certeza afirmou, que recordar é viver.

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