“Nas estrelas”…

Olhar as estrelas, apaixonar-se sob a luz da lua, olhar o céu em dia quando ele fica claro, namorar inspirado pelo amor que sentiu um dia por uma linda menina que já morreu, ouvir músicas românticas de José Augusto, ou outro qualquer deste gênero, faz parte indelével de um passado que se não morreu está na iminência de.

Mas eu me sinto assim. Podem dizer que na idade em que me encontro, depois de tantos desencontros pela vida afora, é fato normal, facilmente explicado pela nostalgia que cavouca meu peito sempre apaixonado, por todas as mulheres do mundo. Começa a lista minha querida mãe, minha filhota querida, e, para coroar o encanto que nutro por elas entra em lugar de destaque minha pequena grande mulher. Esposa, amante, amada, eterna namorada, cujo nome é Rosa. Ou como foi batizada Rosemirian.

Olhar as estrelas sempre fez parte dos meus momentos melhores. Dos piores também.

Na roça que tanto amo, agora arrendada, vendida jamais, antes, bem antes, quando ali pernoitava solitário, na casa Amarelazul, quase não pregava os olhos. Andava noctívago pelas madrugadas frias, era ainda inverno, comecinho de outono, olhando o horizonte infinito, no alto estrelas brilhavam. E, perto de mim, estrelinhas miúdas, tiquetaqueantes, avoavam ao toque de minha mão. Eram vagalumes enormes. Daqueles quase extintos. Que traziam luzinhas piscantes na parte de trás. Não na face crispada de luz. Eu os apanhava com todo carinho. Fechava-os na concha das duas mãos. A seguir ele era fechado numa caixinha de fósforo. Com a tampa semiaberta para não sufocar o pobre pirilampo. Que me olhava com olhinhos de piedade, como se implorasse que o soltasse, alegando saudade da pirilampazinha que ficou avoando sozinha. E logo, já na varanda parcamente iluminada da casa Amarelazul, abria a caixinha de fósforo, e soltava o vagalumizinho, que voava feliz se despedindo do menino sapeca que ainda morava dentro de mim. Hoje esse mesmo menino também se foi, como o pirilampozinho pra sempre, pra nunca mais voltar.

Hoje amanheceu em horário novo. Apregoa o desgoverno que toma o timão do país com mãos trôpegas que tal mudança tem o ensejo de economizar energia. Devido a forte estiagem por que passa nossa região as hidroelétricas operam em regime de falta. Creio que logo um ser superior manda que a chuva desça tintando de verde a natureza, colorindo-a com seus tons sur tons, cada um de encher a vista.

Acordei em sobressalto no horário novo. O relógio de cabeceira, do lado da minha querida companheira, devido à falta de luz do abajur sobre o criado mudo, não conseguiu ensinar que horas eram.

Meu relógio biológico, esse sim, sabia de cor e salteado que horas marcavam.

Levantei-me pelo lado esquerdo da cama. Ainda sinto saudade dela. O quarto amplo estava escuro. Fui primeiro ao celular. Para me informar que horas seriam. E ele, sabido, indicou exatas cinco e meia da manhã de um novo dia.

Perdido na escuridão do nosso quarto de dormir minha querida Rosa me indagou como eu sabia das horas. Já que a luz do abajur estava às escuras.

E eu, meio poeta, meio sonhador, teimo em viver nas nuvens, fingi que abri a janela persiana que permite enxergar o exterior, dali se olha a velha seringueira desterrada, e, ao olhar o céu, ainda escuro, ali não encontrei nenhuminha estrela. Nem mesmo um vagalume errante. Perdido na azáfama da cidade.

À pergunta a mim desferida por minha cara inteira, metade é pouco em se tratando de minha Rosa, a resposta à indagação de como eu fui sabedor das horas, foi esta: “nas estrelas”…

Mal sabia ela que foi o celular o delator principal da lava lento.

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