Quem ainda não se viu em fardas, puxando o pelotão todos iguais, só você que estava com o passo certo, assim dizia apenas sua mãe, com um lindo uniforme de soldado, embora raso tenha a pretensão de logo chegar a general, não sentiu no peito uma pontinha enorme de vaidade, poder-se-ia dizer orgulho, após tanto esforço recompensado, depois de horas intermináveis a estudar em grossas apostilas, fazer um esforço danado nas academias da vida, só depois de fracassar por duas vezes ter afinal seu nome na lista dependurada na parede de fora do quartel. Quem ainda não sentiu no peito, fincada dependurada à farda verde oliva uma fileira de medalhas coloridas, resultado de feitos de bravura em combate em guerras aguerridas, voltando a casa quando inúmeros colegas ali, no campo de batalha, deitaram-se ad eternum. Não sabe aquilatar a grande extensão da palavra emoção.
Assentar praça diverge de assentar-se no banco da praça. Coisa de desocupados, aposentados, gente que passa o tempo livre ali, em prosas intermináveis, proseando sobre política ou futebol, quando o assunto é religião pulo fora, em briga de marido e mulher não se deve meter o bico. Melhor tratar de assuntos que lhe dizem respeito.
Conheço aquela pracinha, fincada à porta do condomínio onde moro, feliz por estar ali, desde creio há bem uns doze anos.
Ela consta de quatro canteiros de formas irregulares. Na parte de cima, perto de um bar que sempre fica cheio no verão, tomadores de cerveja que têm como cortesia boa música sertaneja, duas áreas que deveriam estar verdes, no entanto antes se mostravam cheias de uma relva ressequida e mal cuidada, agora a coisa mudou de figura. A parte do meio, a que mais saboreio, abriga dois ipês amarelos, lindos agora se exibem em suas roupagens de uma amarelice tagarela. E um coqueiro solitário, onde se amarravam os pobres cavalos de peões de bota e espora, que não têm o umbigo na roça. Fazem de conta que são fazendeiros, no entanto são meros exibicionistas fazendo graça às garotas que por lá mostram fiapos das pernas grossas. No canteiro do meio, antes pura braquiária, ou grama vira-lata, uma grande árvore foi retirada, podre que estava.
Na parte inferior da tal pracinha enjeitada, um patinho feio entre as demais da cidade, principalmente a símbolo de nossa terra, onde mora a Tipuana, nas barbas de uma pizzaria simpática, que tem mania de grandeza, intitulada Mega Pizza, outro canteiro mais parecia um pasto cheio de pragas.
Inda pouco a tal pracinha perto de casa renasceu das cinzas, qual Fênix. Já não era mais possível tolerar o estado de abandono da pobre área verde. Antes sanitário de cães e esteio onde se amarravam equinos.
Nem os passarinhos apareciam por lá. Dava pena.
Depois da nobre iniciativa do atual alcaide tudo mudou, pra melhor.
Os canteiros sorriram. Os dois ipês amarelaram inda mais.
Flores novas, ares joviais, tudo na praça da FM, que tem o nome de um tenente pra mim desconhecido, assumiu a verdadeira identidade para a qual foi implantada em nossa Lavras amada.
Foi ontem que presenciei tal fato.
Como de costume, ao descer cedo a rua, em direção a onde estou, deparei-me com uma cena inusitada.
Um lindo canarinho amarelinho, entre seus iguais, aterrissou devagarinho num galho mais baixo do ipê maior dos dois. Logo a seguir o mesmo aconteceu com seus colegas de canto alegre, como eu mesmo fiquei depois.
Acreditei no que vi só a seguir de ouvir do bico do canarinho a razão de estar ali.
“Meu bom doutor, escritor. Antes eu voava por aqui, e, pelo estado de desmazelo dessa pracinha feiosa, não pousava em nenhum lugar. Agora tudo mudou. A praça dos dois ipês amarelos metamorfoseou-se de feia lagarta em linda borboleta azul. Não me restou outra opção senão assentar praça nesta praça. Especial que ela ficou”.
E eu, nem pássaro sou, acabei também ficando por aqui, antes que invente mais sandices da minha parte de escritor.