Como o tempo maltrata as pessoas.
Não conservamos a nossa juventude intacta.
Nem bem chegamos aos muitos anos em nós se achegam as enfermidades.
Em muitos mais prematuramente. Em outros no mais tardar dos anos.
Não inventaram ainda uma vacina contra o envelhecer. Por mais que não desejamos a velhice chega.
Com ela ficamos com a vista turva. O andar claudica. O sono encurta. A saúde capenga.
Bem sei que tudo isso faz parte da natureza humana.
Esse mundo não suportaria tanta gente se a vida se eternizasse.
Caso não passássemos ao outro mundo. Embora não saiba se ele existe. O que seria daqueles que nascem? Eles não teriam espaço nesse amontoado de pessoas.
As cidades não comportariam gente se acotovelando pelas ruas.
Os finais de ano não dariam conta de abrigar tantas pessoas entrando e saindo das lojas. A azáfama seria insuportável. Esse ajuntamento se tornara um caos.
Sábio quem fez esse mundo desse jeito. Seria uma desgraça se fosse o revés.
Deveríamos viver o hoje e o agora. Sem pensar no que vem pela frente.
Soberbamente quando a idade nos cavalga os costados.
Marcar encontro para daqui a alguns dias ou meses. Se esse período se alongar para anos. Pra mim é uma temeridade. Não estamos na idade de adiar ou protelar coisas sine die.
Devemos fazer hoje, agorinha mesmo. Tudo aquilo que nos passa pela veneta.
Se porventura de uma desventura deixarmos pra depois a viagem há tempos programada. Pode ser que nossa saúde não permita. Nosso caminhar se torne objeto da piedade de alguém. Que, ao nos olhar na fila de embarque, diga em voz baixa: “olha aquele casal de idosos. Não sei pra onde eles vão. Melhor ficar em casa do que se aventurarem numa viagem que talvez seja a última que farão”.
Estamos prestes a viajar para um lugar desconhecido. De onde não se volta.
Essa verdade não me causa revolta. Nem me constrange.
Nesse final de semana que se avizinha. Precisamente no sábado. Coincidentemente data do meu cumpleanos. Celebramos cinquenta anos de formatura.
Éramos cento e sessenta médicos diplomados na faculdade de medicina da Universidade Federal das Minas Gerais.
Saudades daqueles que não mais estão aqui.
Marcamos encontro para essa sexta feira na aprazível cidade recheada de história de nome Tiradentes.
Vai ser um encontro memorável. Colegas que não se vêem há muitos anos se reencontrarão.
Somos jubilandos. Setentões ainda em atividade. Muitos enfrentam estoicamente enfermidades. Outros exercem a medicina em outra esfera. Grande parte de nós já nos aposentamos.
Não sei se estaremos aqui de agora a outros anos.
Já vivemos o bastante? Não o suficiente desde que a saúde não nos abandone.
Alguns colegas estão com a saúde debilitada.
E se me perguntarem pra quando será nosso próximo encontro digo: “que seja na maior brevidade possível. Se tardarmos muito pode não haver uma próxima vez”.