” Bom dia tristeza.”

Não é esta a saudação que faço todas as manhãs. Principalmente num dia lindo como este.

Exclamo, ao olhar o sol, que entra em saraivadas pela janela, naquele céu azul de doer os olhos – “bom dia alegria. Que a felicidade inunde seus dias com sua face sorridente”.

Mas, para Seu Gumercindo, senhor via de sempre amargurado, acordar de um novo dia era simplesmente insuportável. Ele sempre foi considerado por quem o conhecia um desmancha prazeres. Um sujeito de mal com a vida. Uma pedra no sapato para quem considera a vida uma dádiva dos céus. E não um redemoinho de lama que desce pela colina depois de uma tempestade torrencial.

Desde cedo Gumercindo, nascido numa família onde o pai era um sujeito de maus bofes, batia na mãe desde quando o menino nasceu, vivia sempre amargurado. Era tido pelos colegas garoto que sempre vivia isolado, nunca se misturava aos demais.

Na escola Gumercindo foi apelidado de Bom Dia Tristeza. Não era pra menos. Nunca se viu o garoto sorrindo. Apesar de exibir uma dentadura alva como floco de algodão.

E ele cresceu sempre emburrado. Na escola era considerado uma companhia nada agradável. Vivia pelos cantos. Sem nenhum encanto a despertar qualquer sentimento de amizade.

Depois de se fazer maior Gumercindo deixou a escola sem nenhuma formação. Vivia à custa de uma tia torta. Uma solteirona que não se casou por cultivar a fama justificada de sempre tratar os outros com uma pedra na mão.

Felizmente a tia de Gumercindo teve a sorte de ter herdado da família uma boa soma de dinheiro.  Era montada na grana. Mas sempre avara. Nunca foi dada a ajudar aos outros.

Até que um dia, malsinado dia, Gumercindo foi obrigado a se mudar da casa da tia. Acabou-se a boa vida. E o jovenzinho teve de trabalhar.

Passou apenas um mês no primeiro emprego. Foi despedido por uma simples razão. Era tido persona não grata. Era evitado por seu mau humor. Sempre de cara fechada. Destratava a todos como se fosse ele o dono do mundo.

O Bom Dia Tristeza acabou ficando velho. Como não tinha onde morar foi recolhido a uma casa de idosos. Ali passou tempos e tempos vivendo como se fosse uma ilha num mar desprovido de alegria.

Acordava sempre de cara fechada. Mesmo que fosse num dia lindo como o de hoje.

Aos menos de cinquenta anos parecia mais. Como não sabia sorrir as rugas logo apareceram. Os parcos cabelos foram caindo, ate não restar sequer um fio.

Quem olhasse para a cara do velho Gumercindo lhe daria muito mais anos que ele em verdade colecionava. Tudo isso explicado pelo velho epíteto – Bom Dia Tristeza.

Aos sessenta anos uma doença nele se aboletou. O pobre Bom Dia Tristeza, que nunca havia sorrido, de repente se viu privado da saúde.

Em pouco mais de dois anos foi-lhe diagnosticada doença de Alzheimer. E ele passava dias e horas com o olhar perdido no meio do nada. Com olhares inexpressivos, isolado do mundo dos vivos.

Aos setenta anos a vida do senhor Gumercindo continuava naquela solidão de dar pena a quem por ali passasse. E ele passava o tempo todo olhando em direção do vazio.

Numa manhã como esta, sol a deitar seus raios desde o despertar do dia, encontraram o Seu Gumercindo de olhos fechados. Uma indelével expressão de contentamento se podia admirar no seu semblante sereno.

O Bom Dia Tristeza afinal descobriu a alegria. No outro lado da vida.

Seu Gumercindo acabou nos deixando. Morreu deixando-nos uma lição de vida.

Nunca se deve dar bom dia a tristeza. A vida é tão bela. Mesmo que a gente acorde num mau dia, o seguinte vai ser outro dia. Bem melhor. Quase sempre.

O infeliz Bom Dia Tristeza passou a outra dimensão nos ensinando que: “tudo passa. A vida passa. O tempo ultrapassa o tempo do vento. Por que vivermos ensimesmados, mostrando a todos a infelicidade. Se o final dos tempos vai ser igual para todos nós? Viva como se hoje fosse o último dia. Sempre com um sorriso nos lábios. Pois um dia, quando a gente não mais puder sorrir, alguém vai nos fechar os olhos, independente de nossa vontade. E não mais poderemos sorrir novamente”.

Deixe uma resposta