À espera da esperança

Dizem que a segunda é a última a exalar o derradeiro suspiro.

Mas esperar que a esperança morra não é do meu feitio.

Prefiro ficar aqui assentadinho, bem cedo pela manhã, bem antes que as oito horas despertem, a escrever um cadiquinho, desdobrando-me entre esses dois computadores. Aquele que fica defronte aonde estou. E o segundo mais ao lado. Já previamente acordado. Já tendo dado continuação ao romance intitulado Rakel. Já bem quase no meio. Uma história por mim inventada tendo como protagonista principal uma moradora de rua. A qual encontrei anos antes cochilando debaixo de uma marquise justamente cá nestas vizinhanças de onde tenho meu consultório. Onde era o estacionamento privativo dos carros dos médicos plantonistas do dia da Santa Casa. E quando a sua pessoinha incomum me atraiu. E soube que ela tinha o hábito de percorrer nosso país de ponta a ponta com o dedo em riste. A pedir carona. Uma forma barata e interessante de se deslocar por este país continente. E conhecer mares nunca dantes navegados. E por aí afora Rakel se meteu em tantas enrascadas cada uma mais bizarra que a outra. Tendo como parceiros mais três personagens nascidos de minha fértil imaginação. Cujos nomes são: a advogada Ângela, sua amante a linda Manuela, o gaúcho Fritz, dono de um caminhão que levava bois ao norte do Brasil, por quem Rakel se enamorou. E outros coadjuvantes mais. Que por certo irão apreciá-los ao final deste meu novo livro ainda sem dada prevista para vir à lume. Não entendam vagalumes.

Voltando um cadinho atrás. A linha que introduz esta crônica de hoje. Dez de fevereiro. Com o título à espera da esperança. Não vou cair no lugar comum dizendo que quem espera cansa pois é a pura verdade. Soberbamente no meu caso sendo afoito e apressadinho.

Espera e esperança são vocábulos de muitos conceitos e predicados.

Espera é o ato de aguardar a presença de alguém em algum lugar. Já esperança tem como sinonímia um sentimento de quem vê como possível a realização daquilo que deseja; confiança em coisas boas; fé na crença de uma vida melhor. Também exprime expectativa, espera, aguardo. Uma bela frase tenta clarear as nossas ideias sobre o sentido a dar a palavra esperança: “um filho é a sua melhor esperança de ver um dia melhorar sua vida”.

Nem sempre penso eu. Quem sabe serão os netos a dar melhor e maior sentido as nossas vidas?

Esta estória, ou seria história que agora tem começo não passa de meus delírios insanos.

Robson, um bom moço, nascido numa cidade próxima a nossa Lavras, mas bem que poderia ter sido aqui. Acalentava um sonho.

Ele, por ter nascido numa rocinha longe da cidade mais próxima, não tinha nenhuma condição de cursar o curso de medicina. Mas essa era a sua sina. Que Deus o ilumine e proteja. Que ELE o recoloque no bom caminho.

Com redobrado esforço, enfrentando turbulências como nas asas de um avião em céus tumultuados, Robson foi aprovado no vestibular de uma boa faculdade médica na capital do seu estado Minas Gerais.

E seis longos anos avoaram com as asas dos urubus. E, na sua rocinha encantada tinha uma namoradinha linda como uma pavoa a se exibir no seu leque de caudas intensamente coloridas. Mas, ao concluir seu curso de medicina. Já eleita a sua especialidade, uma de natureza cirúrgica, cujo exame para residência médica era assaz concorrido, teve seu nome selecionado, dentre muitos, a completar sua formação profissional numa área cirúrgica. Parece a escolhida ser a Neurologia.

E o esforçado e não menos inteligente doutor. Nas horas de ócios ia, num carrinho comprado com dois dos seus primeiros salários, a casa da namoradinha da capital e lá passava um sábado encantado aos beijos e abraços apertados com uma linda garota cuja boca enorme parecia ter sido feita para beijar.

Nas férias retornava ao lar doce lar. Na sua rocinha onde canarinhos da terra ciscavam o esterco do curral e as maritacas ariscas gritavam frenéticas anunciando as jabuticabas madurinhas que o faziam salivar e arriscar-se a subir ao pé sob o risco de ir ao chão.

Lá passava horas perdidas a beira de um riacho de águas cristalinas tentando tirar da correnteza lambarizinhos de rabo vermelho. Que de tão espertinhos mordiscavam a isca e levavam nas suas boquinhas minhocas e outros tipos de iscas.

Acontece, por um capricho do destino. O já feito especialista apareceu-lhe uma oportunidade que era pegar ou largar.

Uma pós graduação num país estrangeiro acabou por levá-lo por inteiro a terras dalém mar.  E o jovem doutor deixou em sua terra natal duas moçoilas casadoiras a espera marido. Na doce esperança de serem elas as eleitas ao seu enorme coração.

Acontece que o jovem neurologista se consorciou à mocinha pudica a mesma primeira namoradinha que nunca mudou de endereço. Ela sempre o esperou na esperança de um dia com ele constituir familia. Ter uma penca de filhos e quiçá alguns netinhos para adocicar-lhes a vida insípida que levariam numa pequena cidade do interior do nosso interior.

Mas da outra garota da capital nunca se olvidou.

Mas a esperança de revê-la fazia com que o nosso doutor quase passasse as noites insones.

E um dia, uma cartinha manuscrita, com letrinhas miudinhas, fê-lo voltar ao passado. Era ela! A segunda namoradinha, com a qual se engalfinhava aos beijos e amassos numa casinha humílima num bairro modesto da capital.

Na carta ela a ele contou detalhes em detalhes de sua vida sofrida. Mãe cuidadora de três filhos já que o pai a ela e eles os abandonou ainda meninos.

Mas ela, guerreira e voluntariosa, jamais desanimou da nova condição de mãe e pai só.

E o nosso jovem especialista da parte mais nobre do corpo humano, vivendo num faz de conta na sua morada, da outra namorada não mais se esqueceu.

Mas já era tarde quando os dois se reencontram. A vida não nos oferece uma segunda chance. Ou nos agarramos a primeira ou nos esquecemos do passado.

E a espera da Esperança, esse era o nome do segundo amor de sua vida. acabou-se antes de ter começado.

Ele, quando se lembra da primeira Esperança seus olhos se enchem de lágrimas.

Mas de nada adianta chorar o leite derramado…

 

 

 

 

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