Solução para um desgaste emocional severo

Naquela manhã gelada do mês de maio Zé Broa acordou perdendo as estribeiras.

Uma cerração densa tapava a boca do sol. Nada se via além da porteira. Embora já passasse das seis da manhã mais parecia noite alta.

Tudo ia de mal a pior na vida do pobre Zé. Alcunhado Broa por gostar demais daquele petisco que ele fazia.  Recheado de queijo derramando pelas beiradas. Feita de puro fubá de milho novinho. Que acompanhava um cafezinho feito na horinha. Adocicado com lascas de rapadura. Outra iguaria que só ele sabia fazer como ninguém.

Zé já foi casado. De papel passado, se gabava ele.

No entanto dos entretantos, como nem tudinho cheira a flores. Um dia a sua amada mulher o deixou a ver navios na poeira da estrada. Acabou se amasiando com o motorista do caminhão leiteiro.  Que se dizia seu amigo, da onça em verdade ele era. Safado, numa manhã como aquela, afanou a mulher do amigo e a levou, sem pedir licença, na boleia do seu caminhão.

Desde então a vida do Zé perdeu o sentido. Ele se sentia vazio, oco como uma bola de capotão furada.

Nos seus muitos anos nunca havia visto uma crise como aquela.

O preço do leite despencou. Em gritante contraste com a carestia que se mostrava nos supermercados.  O produtor recebia por um litro de leite a bagatela de uns miserentos dois reais. Conquanto na prateleira dos supermercados era vendido por mais de cinco.

A pastaria secou. A roça de milho não vingou. A chuva se despediu, faz um tempão.

Nada dava certo na rocinha do amigo Zé.  O munho d’água não tinha água para mover aquela pedra dura que fazia do milho fubá.

O frio dominava o entorno. O canavial virou cinzas devido a uma queimada que aconteceu na semana passada. A vacada passava fome. A melhor vaca do curral tossia e aquela gripinha se transformou numa pneumonia que a levou ao brejo da desesperança mortinha.

A renda do desinfeliz Zé foi pro mesmo brejo onde a vaca atolou.  O empréstimo tomado ao banco já estava vencido. Mas como pagar se não tinha como?

Zé não conseguia dormir. Pensou em se mudar dali. Pra onde? Se não tinha casa na cidade nem ocupação.  Não sabia fazer outra coisa senão tirar leite das tetas das vacas.  A vida na roça ainda o seduzia.  Mas tudo que havia conquistado foi pras cucuias. Teria de vender a propriedade para saldar as dívidas.

Naquela manhã friorenta Zé acordo u sem saber como encontrar a solução contra dissolução em que se achava. Soluçava o infeliz na sua infelicidade pura.

Pensou em tudo e não encontrou nadica de nadinha.

Um tanto depressivo, amuado e taciturno, passava por um grave desequilíbrio emocional.

Zé pensava nas alternativas para se livrar dos incontáveis problemas que afligiam.

Vender a roça seria uma solução. Mas não tinha pretendentes.  Dada a crise reinante quem comprasse um sitiozinho como o seu tinha duas alegrias. Na hora da compra e na hora da venda.

Tentar fazer novo empréstimo ao banco não seria razoável.  Assaltar o mesmo banco talvez fosse viável. Mas seria preso por falta de costume de empunhar armas. Recorrer a um parente seria inconveniente pois não os tinha de posses.

Naquela madrugada fria Zé nem tomou seu café com broa de milho.

Foi ao curral se despedir de suas vacas.  Abraçou cada uma delas.  Na Braúna deu um beijo no mojo repleto de leite.  Ao touro eunuco se desculpou pela castração sem anestesia. Nos seus bezerrinhos derramou lágrimas dizendo que sentia muito se despedir deles.

Foi ao pomar.  Atou uma corda comprida num galho mais alto da jabuticabeira. Enlaçou o pescoço. Subiu num banquinho tosco. O mesmo que usava para tirar leite. E de uma lance só foi ao chão. Subiu ao céu sem dar tempo pra se despedir da gente.

A solução encontrada pelo Zé pra mim foi inspirada num grave distúrbio emocional.

Que por vezes acontece a cada um que passa pela vida sem vivê-la como ela merece.

 

 

 

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