Longe se vão os anos quando, ainda moleque, de pés descalços, com a camisa amarrada na cintura, naquele campinho cambeta jogava bola com os amigos. Pensando em não me atrasar para o almoço. Servido pontualmente às onze e meia naquela mesona farta. Com todas as iguarias que apreciava. Aquele arroz soltinho e por cima um ovo frito. Ao lado uma salada recheada de verduras colhidas na horta naquela horinha. E eu comia e lambia os beiços. Tomava um banho ligeirinho, pois depois das treze era hora de ir a escola. E voltava antes de o sol se deitar lá em cima tendo a lua por companhia.
Bons tempos aqueles da minha juventude perdida. E, se tirasse notas boas as férias de fim de ano eram passadas na rocinha de umas tias avós no município de Perdões. Onde as jabuticabeiras davam frutos exatamente nas minhas férias. Parecia até uma combinação nossa. Mas tudo isso não passava de uma invencionice das minhas.
As paredes da minha casa quase não me viam. Durante as noites sim. Mas logo, ao despertar do sol, quem dizia que as paredes tornavam a me ver.
A horta da minha casa tinha de tudo um cadinho. Canteiros onde minha mãe plantava verduras. Um pé de jabuticaba que, por ser irrigado sempre, dava frutinhas três vezes ao ano. Um pé de camélia rosa que não sei pra onde foi. Canarinhos da terra ali viviam a espera do fubá que lhes era oferecido de graça por meu paizinho. E o jardim sempre florido era um capitulo a parte. Roseiras graciosas, azaléias sempre floridas, amores perfeitos enfeitavam canteiros sempre adubados com esterco curtido trazido da roça. Boas lembranças me trazem aqueles bons anos da minha infância perdida.
Meninos de hoje não sabem mais onde se esconde a felicidade.
As suas múltiplas atividades não lhes permitem um minuto de sossego. Aulas de natação se sucedem. De inglês se revezam as de reforço nas matérias que eles têm dificuldades. Meninos de agora sabem mais de internet que a gente sabia andar de patinete. Eles ficam de olhinhos grudados aos tablets e celulares. E quase desconhecem o que seja um bem viver.
Meninos de agora aprendem na escola e saem sem saber como é bom andar na chuva. Desconhecem o prazer de fazer pipas e soltá-la ao vento de um dia claro de verão. Mal sabem eles como era bom andar descalços. Jogar finca e rodar peão. Andar a cavalo em pelo. Atolar no barro fresco de um dia chuvoso. Armar arapucas com a finalidade de nelas aprisionar pássaros incautos. Dar uma estilingada no peito de uma rolinha desavisada. E tirar da laje da casa da roça filhotes de maritacas na intenção de fazê-los falar.
Meninos de hoje passam o dia inteiro entre quatro paredes. Nas suas incontáveis atividades mal têm tempo de brincar com os amiguinhos. Já que as aulas já vão começar. E voltam da escola tarde quase noite. No dia seguinte acordam sem pensar no tempo perdido. Com as cabecinhas lotadas de deveres a fazer.
Meninos de hoje não sabem como era gostoso viver ao ar livre. Sem a tutela nociva dos computadores. Que agora nos escravizam em suas teclas que pensam saber tudo. Mas ignoram o melhor da vida que é pra ser vivida em harmonia com o bem estar da gente.
As paredes do meu tempo de criança não me seguravam dentro de casa. Ao acordar abria a janela e deixava o sol entrar. De manhãzinha saía. Jogava as minhas peladas. Voltava a casa todo suado. Fazia a lição de casa. Se tirasse notas boas as férias de final de ano eram curtidas o mês de dezembro inteirinho na rocinha das minhas tias avós. Se fosse reprovado passava dezembro inteiro estudando um cadinho mais.
Meninos de hoje vivem entre quatro paredes assistindo a desenhos desanimados com o acúmulo de tarefas que os esperam no decorrer do dia. Ora é a aula de inglês. Outra hora tem de aprender outra língua embora desconheçam o bom português. Antes do almoço meninos de hoje fazem o dever de casa. Vão a escola naquela vã lotada. E retornam cansados com a cabecinha cheinha de sonhos a serem realizados.
Já meninos de outrora eram mais felizes, como penso ter sido eu.