Caminhando entre flores senti-me tal e qual um espinho

Por que não falar de flores?  Ao revés de comentar sobre espinhos que nos atazanam a vida?

Neste mundo, vasto mundo, um tanto imundo, por única culpa da gente, seres viventes, que não respeitam o planeta, tão conspurcado, tão vilipendiado, onde o lixo é jogado em qualquer lugar. Ao invés de ser jogado na lixeira, tanta sujeira se amontoando debaixo do tapete, tanta falácia, tanto palrador, soltando ignominias. Podriqueiras tantas. Quando, cada um de nós, deveríamos ser cuidadores de nossa terra abençoada por Deus e, infelizmente maltratada, espezinhada, por gente que nem sabe o valor que deveríamos dar a tudo aquilo que nos foi ofertado, graciosamente, por um ser superior.

E como aprecio flores. De vez em quando sinto-me tal e qual uma abelhinha, ou um beija flor, em seu farfalhar de asas, avoando de flor em flor.

Apetecem-me margaridas, de miolo amarelo, madressilvas de sibilo afinado, jasmins perfumados, até mesmo rosas espinhentas, as quais quase sempre me espetam, e eu, caminhando entre elas nada sinto. E consinto que as espetadelas nada contribuam para aumentar a minha dor.

Hoje, pela manhã, antes da hora do almoço, fui a um logradouro onde flores, arbustos, árvores ainda em formação, escondiam-se do sol inclemente à sombra de jabuticabeiras, antes da floração, e das saborosíssimas jabuticabas madurinhas, prato predileto de mim criança, e até hoje subo no pé, em disputa com os marimbondos ferroentos, para os quais reservo aquelas em vias de apodrecerem, a fim de encher a minha pratinha valente de alguns metros de grama verde, tomara que chova logo, pois a pastaria mostra-se ressequida como minhalma que clama, e, quando esperava o amigo recente, uma pessoinha da prateleira de cima, quase inalcançável como o céu azul que hoje me encanta, de nome Jeilson, a espera durava mais que meia horinha, fui caminhando entre as flores, olhando aqui, admirando acolá, quando, num átimo de segundo senti uma espetada.

Olhei ao derredor. Parei de chofre. Olhei pra frente e reolhei no sentido de trás.

Foi quando avistei, num misto de admiração e perplexidade, uma florzinha, sem qualidade, com um espinhozinho afiado, na ponta de uma flor, não sei se um jasmim, uma azaleia, uma petúnia cor de rosa morta, acabou, acabrunhada, em me dizer: “doutor Paulo Rodarte. Bem sei que o senhor é médico urologista de formação. Escritor por predestinação. Poeta que não sabe fazer rima. E que o senhor, aos setenta e dois aninhos de idade, pensa ainda ser menino. Fui euzinha, essa florzinha viralatinha, que o espetou com meus espinhos. Desculpe-me. Por caridade. Se o espetei não foi por maldade. E sim por casualidade. Na próxima vez que vocezinho, aparecer por aqui, cuidado. Não pise no meu calo. Viro onça se você me despetala. Uso meus espinhos para me proteger”.

Não tive resposta a dar àquela flor. Na próxima vez garanto.

Caminhando entre flores juro que não irei me sentir tal e qual um espinho.

 

 

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