“E eu quiço”?

Tem gente que gosta de futebol. Já outros estão mais preocupados com outras coisas que nos atormentam. Já eu, de muito tempo passei a gostar de outra bolinha da mesma forma redonda, que não rola pelos gramados, mas vai de um lado pro outro, impelida pelas raquetes, esporte que fui adepto na juventude, agora passei a mero espectador.

O tênis passou a ser a minha menina dos olhos. Pena que meu ícone está prestes a se aposentar. Federer, Guga, e outros tenistas de escol, fizeram história pelas quadras afora. Já este ano, fatídico pela tal pandemia, quase não os tenho visto jogar. E são partidas memoráveis. Algumas duram mais de quatro horas. E não se veem brigas de torcidas, algazarras extra campo, até a torcida se comporta muito melhor.

Tenho pelo tênis de quadra o maior apreço. Ainda bato as minhas bolinhas. Se bem que apreciaria jogar muito mais.

Já o futebol, com tantos pernas de pau, jogadores que não justificam os altos salários, ganham uma fortuna, e não fazem justiça à fama que conquistaram, passam a maior parte do tempo no estaleiro. A exemplo cito um craque verdadeiro. Que sofre com as entradas desleais.

Tenho por estima maior um amigo. Há esta hora, quase madrugada, ele já tirou o seu leitinho. E se prepara para encher o cocho de uma ração cheirosa. Que não apenas enche o bucho da vacada como as faz produzir ainda mais.

Seu Chico, caboclo trabalhador e meio arisco, acorda ao cantar do galo. Dorme juntinho às galinhas. Tem o sono pesado. Acorda meio emburrado. Tem um gênio de cão raivoso e um coração amanteigado como brigadeiro feito na hora.

É só não bulir com ele que tudo corre as mil maravilhas. Mas, se o tiram do sério aguentem as consequências.

Ele, com a enxada nas mãos, com a foice pronta a ceifar capim, é um risco calculado.

Um dia, esturdia se não me falha a memória, fiz-lhe uma visitinha de última hora. Era ainda cedo. Por volta da volta das seis e meia.

Ele já estava prontinho a deixar o curral. As vacas apartadas de suas crias. Os canarinhos da terra ciscavam o esterco do curral. As maritacas palradeiras grasnavam em volta das jabuticabeiras carregadinhas de frutinhas doces.

Seu Chico, apelidado de Chico das goiabas, e como ele gostava de fazer goiabada cascão naquele fogão improvisado no terreiro atrás de sua morada, recebeu-me com um sorriso meio como se dissesse que estou com pressa, já que tinha muita coisa a fazer ainda, fiz questão de falar pouco.

Comentei com o velho amigo o resultado do jogo do último final de semana. O palmeiras sagrou-se campeão da libertadores. E o clube atlético mineiro quase erguia a taça de campeão brasileiro.

Como eu ele não apreciava futebol. “Não tenho tempo para besteira. Trabalho o dia inteiro. Mal assisto à televisão”.

“Seu Chico, não lhe importa o resultado das partidas? Não torce por nenhum time”?

Ele, num muxoxo que poderia ser sentido até debaixo do pé de jabuticaba, mesmo sob o alarido das maritacas, me respondeu meio contrariado: “e eu quiço”?

Pra meio entendedor meia palavra basta. Nunca mais conversamos sobre futebol. Melhor mudar de assunto. Falar da chuva que cai, do canto do sabiá, até mesmo do matraquear das maritacas, não apenas pra ele, como pra mim mesmo, soa melhor do que aquele foguetório que incomoda os ouvidos dos pobres cãezinhos da cidade, que se escondem ao menor estampido.

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