Para ele sempre era um bom dia

Fizesse chuva, calor ou frio, a tristeza imperasse, o sorriso faltasse, para aquele homem afeito às contrariedades da vida, um bom dia sempre brotava de sua boca em todas as manhãs, a todos com quem cruzava pelas ruas.

Seu Antenor, nascido na roça, desde criança aprendeu a amar a vida.

Aos menos de cinco anos perdeu o pai. Foi um acidente até hoje lembrado.

Ainda cedo, quando o sol se abria num lindo sorriso amarelo, quando o pai de Antenorzinho deixou a casa, em direção ao curral, quando foi procurar a vaca amarela, uma cobra mordeu-lhe o dedo do pé.

Foi levado a unidade de pronto atendimento. Ali chegou ainda cedo. Todos os esforços para restituir-lhe a vida foram debaldes. O pai de Antenor veio a fechar os olhos naquela manhã de primavera.

Desde então Antenorzinho passou a ser o chefe daquela família modesta.

Aos dez anos já cuidava das vacas. Ordenhava o rebanho. E esperava, antes das nove da manhã, o caminhão de leite passar.

Antenor cresceu no trabalho. Nem teve tempo para estudar.

Aprendeu as primeiras letras com uma professorinha. Que de vez em quando passava por lá.

A alegria sempre fez parte do menino Antenor. Nunca o viram emburrado, demonstrando infelicidade por onde passasse.

Sempre alegre, em qualquer ocasião, cumprimentava a todos os vizinhos com um cordial bom dia.

Nem sempre era correspondido. Não importava.

Antenor, com aquele sorrisão nos lábios finos, quando passava, mesmo a desconhecidos, apertava-lhes a mão. Causando estranheza aqueles que por ele passavam.

Um dia Antenor, já adulto, teve de vender a propriedade. Dívidas o assaltavam. E lhe tiravam o sono.

Uma vez morando na cidade tentava manter a alegria.

Sem formação profissional tornou-se mais uma vítima do desemprego.

Eram tempos de vacas magras. Uma tal pandemia alastrava-se pelo mundo inteiro.

A cidade em que vivia não fugia à regra.

Mesmo assim Antenor mantinha o sorriso nos lábios.

Perambulava pelas ruas em busca de ocupação. Portas se fechavam a ele. E Antenor não desistia.

Até que um belo dia, afinal, Antenor conseguiu emprego numa padaria.

Tornou-se mestre na arte de fazer pães.

Era tido funcionário exemplar. Não perdia um só dia de trabalho.

Mais uma vez a sorte virou-lhe a carantonha feiosa. Antenor foi despedido por injusta causa.

O dono da padaria não se acostumava a sorrir. Vivia emburrado. Em contrapartida Antenor sorria. Daí o motivo de sua demissão.

A vida continuava insossa para o pobre Antenor. Sem emprego, sem renda, mesmo assim Antenor não deixava de cumprimentar aos outros.

Caminhando pelas ruas distribuía bons dias a esmo. Mesmo que não fossem bons dias.

Foi quando passei por ele. Era uma quarta-feira, quase final de novembro.

Ao ver aquele senhor, deitado na calçada, esmolando, mãos estendidas, não tive como recusar-lhe um auxilio.

Depositei naquela mão áspera a quantia de vinte reais. Foi o bastante para que ele, alegremente, me desse um bom dia com sabor de amizade. A partir daquele dia nunca mais vi aquele senhor.

Disseram-me que ele faleceu numa noite de muita chuva. Foi levado pela enxurrada. Encontraram seu corpo numa valeta de uma viela daquela mesma rua. Com um lindo sorriso nos lábios. Até hoje, quando caminho pelas ruas, não deixo de cumprimentar aos outros com um cordial bom dia. Mesmo que não seja exatamente um ótimo dia.

No entanto, depois que conheci o Antenor, todos os dias são iguais. Só depende da gente para que transformemos um dia ruim, noutro melhor. Não existe um só dia igual ao outro.

 

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