Trabalhar pra quê?

Bem dizia, uma voz sábia, que o trabalho dignifica o homem. Independente de ser homem ou mulher.

Desde quando o ser humano foi deixado sobre este planeta, versam as sagradas escrituras que foram Adão e Eva os felizardos, o trabalho não existia. Para se alimentarem bastava ficar debaixo de uma arvore que a maçã caía. Tudo ia bem até que uma serpente, em forma de tentação, acabou com a tranquilidade da dupla que diziam viver no paraíso. Quem sabe se a tal cobra peçonhenta tenha sido em verdade o tal trabalho?

Não tenho como comprovar. Pois não estava lá para ver o desenlace desta história acontecida  há tantos anos atrás.

Decerto que, nos dias atuais, desde quando a vida começou, nos primórdios da civilização, o trabalho, por mais que tenha sido desdenhado tornou-se um mal necessário. Sem ele não se pode levar a casa o sustento da família. O pão de cada dia.  Muito embora muitos vivem na maré mansa, olhando as ondas se quebrarem na praia.

Jovens, adultos, adúlteros, continuam a remar contra a corrente. E encaram a vida como se ela passasse de repente. Só nos restando a morte como consolo.

Conheço uma pessoa boa, a qual sempre disse, entre sorrisos de mofa, que, pra que trabalhar tanto se a vida passa num instante, e quando percebemos nada mais resta da gente senão lembranças de quando éramos felizes e não sabíamos. Entretanto, com a capacidade laboral que me inunda o cerne, nunca deixarei de trabalhar. E pretendo assim continuar. Até quando ultrapassar a idade de me aposentar. Mesmo assim, com a saúde que ainda me bafeja, com a mente hiperativa de que sou dotado, o dia em que parar de respirar, e observar o sol nascer, a lua se esconder, aí sim, concordo em avoar ao outro lado. Num voo sem retorno. Só mesmo a morte vai me fazer parar de trabalhar.

No dia de hoje, nesta quinta-feira de inverno, mais parece um verão calorento, antes de aqui chegar, como dias antes percebi, ainda dormindo a sono solto, um casal acabando de acordar.

Eram de idade quase igual a minha. O senhor, olhos sonolentos, a senhora, mais jovem do que ele.

Parei no intuito de tentar ajudá-los.

Perguntei de onde eram. Se não tinham outro lugar para passar a noite. Foi o senhor que me respondeu, com olhos lacrimejantes de sono: “não temos não. Viemos de um lugar distante. Apreciamos caminhar. Somos andarilhos. Não temos pouso muito menos lugar pra ficar. Somos felizes assim mesmo. Temos a lua para nos acobertar. As estrelas para nos iluminar. Vivemos de favor dos outros. Esmolamos. E nunca passamos necessidades”.

Estava com pressa para chegar ao trabalho. A primeira consulta seria em meia hora. Depois tinha de caminhar em outra direção. Fora outras ocupações.

Antes de me despedir da dupla de andarilhos ainda fiz-lhes uma pergunta: “ vocês já trabalharam? Algum dia”?

Foi ela quem me respondeu: “trabalhar pra quê? Se a gente vai morrer”?

Saí dali sem saber quem tinha razão. Se eu, ou a imensa maioria da população.

 

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