“Cadê a chuva”?

Mais um dia de forte calor. Nenhuminha nuvem no céu azul.

Naquela hora madrugada, antes das cinco da manhã, Torquato deixou a cama para mais um dia de trabalho.

Lá fora o sol gania como um cachorro faminto.

Como de rotina aquele caboclo andado em anos deixava a cama bem cedo. Seja no verão quente. Ou fosse no inverno com temperaturas abaixo de cinco graus centígrados.

Torquato vivia só. Não se casou por falta de oportunidades. Já que algumas raparigas haviam a ele lançado olhares pecaminosos.

No entanto, aos vinte anos, passaram-se anos, Torquato, ainda jovenzinho, enrabichou-se por uma mocinha linda. Acontece, por uma fatalidade do destino, aquela mocinha pudica foi chamada a fazer parte dos anjos do céu. Ela foi picada por uma cobra peçonhenta. E morreu antes que Torquato a pedisse em casamento.

Desde então o infeliz rapaz nunca mais se apaixonou por uma mulher. Passou a vida inteira lembrando-se daquela linda mocinha. Sem sequer se interessar por outra dama.

Aos quarenta anos, completos naquele ano de dois mil e dezenove, Torquato ainda vendia saúde. Nunca precisou ir ao médico. Embora existisse naquela localidade rural um postinho de saúde desapetrechado de recursos mas rico em calor humano.

As tarefas do dia se repetiam. Ordenhava as vacas ao nascer do sol. A seguir, sem intervalo, montado num trator possante subia um morro agudo na intenção de cortar cana.

Enchia os cochos com silagem de milho misturado a cana picada. Dava gosto ver a vacada se fartar com aquela comida de rico sabor. Mistura de açúcar mascavo e milho azedo.

Naquele ano ingrato, meados de setembro, nada de chuva se anunciar entre as nuvens.

A entressafra se mostrava de um secume impar.

Entrou outubro. A primavera dava seu ar da desgraca. E nada de chuva ainda. O céu azul, o sol brilhando forte, nada se fazia supor de que a chuva chegaria em tempo oportuno.

Era tempo de sulcar a terra. Nela inserir sementinhas de milho. Que logo brotariam caso o tempo permitisse.

Novembro se fez presente. E o céu azul ainda se manifestava no alto.

Torquato acordava todos os dias sonhando com a chuva. Orava todas as manhãs para que ela voltasse a molhar a terra ressequida.

Mas nada de a chuva voltar. Dezembro, mês das jabuticabas madurarem, cadê a chuva?

Ao revés. Um calor infernal mostrava a cara fumegante.

Numa manhã de segunda-feira Torquato acordou com um estranho pressentimento.

Sonhou que iria chover ao cair da tarde. Olhou por céu e nada de indícios de chuva no alto.

Foi ao curral na intenção de ordenhar as vacas. Cumpriu a risca todas as obrigações do dia.

Assim que terminaram as tarefas costumeiras Torquato entrou novamente na casa onde morava. No alto nenhum sinal de chuva. Nenhuma nuvem passageira.

Ao cair da noite, estrelada, quente, Torquato passou em brancas nuvens.

Não conseguiu conciliar no sono. Preocupado com a ausência de chuva.

Ao final do dia, quando já estava desiludido com a falta de água vinda dos céus, eis que uma aguaceira despencou do alto. Foi a conta de molhar a terra. Torquato se animou. Arou a terra, adubou-a como de costume.  E nela semeou as sementinhas de milho compradas no ano anterior.

Mais uma vez a tão esperada chuva não durou mais que um dia. Novamente o sol se fez presente. O céu azulou de vez.

Torquato perdeu toda a colheita. Os pezinhos de milho não vingaram. Nova desilusão na vida do pobre homem do campo.

No ano seguinte repetiu-se a encomenda. Nada de chuva no ar. Novamente a safra foi perdida.

Assim acontece na vida o homem da roça. “Cadê a chuva”? Pergunta ele?

Só Deus sabe a resposta. Bem que gostaria de saber. Quem sabe no ano vindouro a chuva cai no tempo certo? Tomara. Desejo de coração que assim aconteça. Embora saiba que não depende da gente. E sim de uma força superior.

 

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