Como é difícil conquistar um sonho

Dizem que sonhar é fundamental para viver. Sem sonhos não se vive. Sem ambição nada se materializa.

Desde cedo, quando aqui cheguei, vindo da Espanha, com a maleta de médico recheada de novidades, pensei em pôr em prática todo o aprendizado.

Fui o pioneiro na minha região na cirurgia de próstata pela uretra. Foram casos bem sucedidos ao lado de outros que me deram enorme trabalho.

Ainda me lembro das noites mal dormidas ao lado do telefone. E quando ele tilintava era sinal que algo de grave estava acontecendo.

Tinha de deixar minha residência ainda madrugada. Reoperava os pacientes. Impacientes com as suas sondas entupidas.

Mas tudo aquilo não me metia medo. Afinal eram sonhos que colecionava desde quando voltei do estrangeiro.

A seguir, nos idos anos de mil novecentos e setenta e sete, ou um cadinho antes, por inspiração de colegas pensava que todo médico podia ser fazendeiro.

Empenhei todas as minhas economias na compra de um pedaço de terra aqui pertinho.  No município de Ijaci. Trata-se de uma rocinha perdida nos cafundós de Judas. Quem para ali se dirige com certeza equivocou-se do caminho.

Era um sonho que se concretizava. Anos depois, tentando fazer da produção leiteira alguma coisa lucrativa mais uma vez me equivoquei.

Foram anos e anos tendo prejuízos substanciais. Era retireiro mudando a cada estação. Cada um mais ausente do que eu.

Depois de tentativas inglórias tomei uma sábia decisão. Resolvi arrendar minha rocinha prejuizenta a quem entende de vacas e suas crias.

Minha casa, por mim construída, agora oferece morada a outra família.

Agora, depois de anos e anos de tentativas malfadadas em ser fazendeiro, afinal minha rocinha querida passou a outras mãos. Não pelo preço pago ao arrendamento. Mas da gosto ver minhas vacas bem tratadas, produzindo leite como nunca visto antes.

Como não queria deixar de visitar minha roça, na beira de uma represa linda, achei por bem edificar uma casa beira lago.

A casa ficou pronta depois de um ano inteiro de construção. O solar Paulo da Rosa ficou uma belezura. Dois andares, com uma linda vista para a represa do Funil.

São quatro quartos espaçosos, dois banheiros um em cada andar, uma cozinha no andar térreo, uma salinha aconchegante onde fica a televisão, outro quarto no andar de baixo. E só.

O que mais me impressiona nesta casa ampla é a linda varanda que a contorna de frente a frente. Falta um pequeno detalhe para que esta casa seja em verdade linda. Duas redes preguiçosas onde possa me deitar.

Nos dias de hoje, com o calor que nos sufoca, em plena primavera, prestes a entrar o verão, decidi concretizar o meu sonho. Faltava uma piscina para que meu sonho pudesse ter fim.

E esta malsinada piscina tem consumido meus sonhos. Ela nunca termina.

Como o terreno é acidentado o arrimo tem gerado gastos além das minhas posses. O tal pedreiro, quase engenheiro, exige de mim paciência coisa que quase não tenho.

Hoje, bem cedo, fui até lá. A obra empacou como um burro bravo. O tal pedreiro desconfiado atribui o atraso devido ao calor.

Dei a ele um prazo para a obra ficar pronta. Antes do meu aniversário. Que cai no começo de dezembro.

Ele, como aquele jeito desconfiado, coçou as orelhas, fumou um cigarrinho, e me disse, num desdém incompreensível: “talvez no fim do ano a obra fique pronta. Depende”.

“De quê”? Perguntei num átimo.

“Do vento, do tempo, das chuvas que irão cair”.

Dali me despedi pensando no quanto os sonhos são complicados. São tantos os fatores, para que os sonhos se concretizem, que quase abortei mais este sonho. Afinal, depois de tantas decepções vida afora, não custa nada perseverar em mais um sonho. Antes que a vida termine vou continuar a acalentar sonhos. Pois na ausência deles seria melhor me despedir de mim.

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