Triste saga do Zé Pindura

A vida não estava sendo fácil para o desinfeliz Zé.

Por mais que procurasse não encontrava emprego.

Vivia com os classificados dos jornais sob os olhos. Andava pela cidade inteira a cata de trabalho.

Distribuía currículos de loja em loja. Só que um pequeno detalhe chamava a atenção.

Aquela folha de papel só mostrava inexperiência. Zé, aos dezoito anos, incompletos, nunca teve chance de trabalhar. Quando algum trabalho aparecia logo diziam: “onde você trabalhou? Que experiência teve na sua vida até no presente momento”?

Zé coçava a cabeça e respondia, ressabiado: “até hoje não tive a chance de trabalhar. Mas tenho uma vontade imensa de mostrar serviço”.

E mais um dia se passava na vidinha insossa do infeliz Zé. Filho de uma família de poucos recursos. Era ele e a mãe somente. Já que o pai foi levado ao céu num dia do qual Zé se recorda com olhos lacrimejantes.

Aos trinta anos faltou-lhe a mãe. Ainda jovem aquela senhora, de olhos claros, pele sedosa como pêssego maduro, adoeceu e nunca mais deixou o leito. Deus a levou para perto de si. Creio que tanto o pai de Zé como a sua progenitora fazem companhia um ao outro. Num lugar especial. Para onde vamos todos nós. Num certo ponto da vida. Incerto, impresumível, mas um dia ele chega.

Desde então o infeliz Zé pensou que a vida para ele tinha terminado. Derramou rios de lágrimas. Entrou em depressão.

Até que, numa manhã de sol a pino, quando deixou a casa, pensando em pôr fim à vida, apareceu uma alma condoída que se compadeceu da situação do Zé.

A ele ofereceu emprego. Zé foi admitido numa pequena fábrica de fundo de quintal. Ali passou meses fazendo de tudo um pouco. Além da faxina, ia ao banco depositar a féria do dia, cuidava das máquinas de costura, e era admirado pelos patrões. Desde então Zé sentiu no peito uma agradável sensação. Era uma alegria incontida. Desconhecida até no presente momento.

Trabalhava de sol ao nascer da lua. Era tido por todos como uma pessoa esforçada, com um futuro alvissareiro pela frente.

O primeiro salário não era lá estas coisas. Mas o suficiente para viver num certo conforto. Já que não pagava aluguel pois vivia na casa deixada pelos pais.

Acontece, numa manhã de agosto, assim que chegou à fabriqueta encontrou-a de portas fechadas. Ela fora lacrada pela vigilância sanitária. Seus donos tiveram de se mudar. Para um endereço ignorado.

Zé, desde aquele dia infeliz, desempregado, sem salário, passou a dependurar as contas até um dia, quem sabe quando?

A crise por que o país atravessava era em verdade profunda. Filas de desempregados se formavam em cada esquina. E Zé era sempre presença constante em todas elas.

E as contas vencidas empilhavam o tampo da mesa. E nenhuma perspectiva de saldar os compromissos.

Aos trinta anos, desesperançoso de conseguir trabalho, Zé, desalentado, não conseguia conciliar o sono.

Acordava de hora em hora. Rolava na cama. Mais uma vez entrou em depressão.

Numa noite escura, em pleno inverno, Zé tomou uma súbita decisão. Iria pôr fim à vida. E que vida era aquela?

Devedor nas contas da padaria, sem poder pagar a conta de luz, um dia ela foi cortada. Desde aí a escuridão passou a fazer parte da vidinha infeliz do pobre Zé.

Não havia como não dependurar as contas. Por falta de dinheiro a fama do pobre Zé alastrou-se como fogo em palha seca. Foi quando o apelidaram de Zé Pindura. Pena que este apelido pouco durou.

Numa noite quente, eis que era chegado o verão, encontraram o que restou do desinfeliz Zé Pindura dependurado numa corda. Ele se suicidou por falta de opção de vida.

Em sua sepultura foi escrita esta frase lapidar: “aqui jaz o pobre Zé. Que viveu sem ter vivido. Não por falta de tentativa. Bem que ele tentou ser feliz. Mas teve seu destino abreviado. Mais uma pobre alma que teve a desdita de ter nascido num país que tudo tinha para dar certo. Mas, infelizmente, é isso que se observa. Pelos quatro cantos da nação brasileira”.

 

 

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