Férias, finalmente?

Desde quando tinha dezoito anos Zé da Silva Qualquer nunca havia desfrutado férias.

Afinal, nascido de pais separados, numa família poder-se-ia dizer miserável, só restava ao infeliz Zé levantar ao nascer do sol, fizesse frio ou despertasse o calor, sair de casa bem cedo, sob o apupo estridente do despertador, e ir ao trabalho, depois de amargar horas e horas em filas intermináveis, a fim de ganhar o pão de cada dia e pagar as contas em dia, nestes tempos difíceis quando o desemprego faz vítimas pelo país afora.

Zé precisava tomar cinco conduções para chegar ao emprego. E ali chegava sob olhares pouco amistosos do patrão. Era ajudante de padaria. Metia a mão na massa. E passava o resto do dia como se tivesse tomado um banho de farinha. Branquinho como as neves do Alasca.

Mesmo assim Zezinho, cansado, exaurido pela luta renhida, era feliz e bem o sabia.

E quando via outros colegas mendigando emprego, sem renda para pagar as despesas, morando de aluguel, ele se compadecia deles. Mas nada podia fazer senão apiedar-se dos menos favorecidos.

Zé da Silva Qualquer era um trabalhador como outro qualquer.

Felizmente, antes de completar quinze anos, como não sabia ficar à-toa, encontrou aquela ocupação. Que lhe rendia pouco. Quase nada. Mas era o suficiente para não precisar engrossar a fila dos desempregados, viver do salário pago pelo governo, cada vez mais endividado.

Ao completar cinquenta anos, bem vividos, sujeito a desenganos e frustrações, Zé, depois de quase uma vida inteira de trabalho duro, decidiu tirar férias merecidas, segunda sua própria opinião.

Eis que chegou o mês de julho. Tempo de férias escolares. No entanto o pobre Zé nem tempo teve de ir à escola. Mal completou o segundo grau.

Naquela manhã risonha o sol já despertara fazia tempo. O frio parecia ter dado tréguas. Nenhum sinal de chuva no alto.

Zé da Silva Qualquer se despediu dos colegas de trabalho. Decidira fazer uma viagem ao estrangeiro. Com as economias de quase uma vida inteira Zé comprou um pacote de viagem à linda Buenos Aires.

Nunca havia andado de avião. Tinha medo das alturas. Fechou os olhos e pensou nas férias que finalmente haviam chegado.

Aterrissou na linda capital Argentina pensando no que fazer.

Em primeiro lugar comprou algumas moedas locais. Gastou o que possuía. Foi-lhe passada uma nota falsa de mil pesos. E quase foi preso quando tentou pagar um casaco de couro falso numa loja da famosa Rua Florida.

A seguir, no segundo dia de viagem, em visita a outra paragem, conhecida pelo tango dançado e cantado na rua, o não menos famoso bairro de La Boca, foi abordado pela polícia local. Como o passaporte vencido foi preso por vadiagem.

Passou dois dias de duas noites inteiras numa cadeia. Foi-lhe imputada uma pena que não teve culpa. De lá saiu renegando a visita.

Deixou a Argentina depois de discutir com um motorista de taxi quem seria melhor: Pelé ou Maradona. Foi vencido pelo cansaço. Depois de ouvir impropérios os quais nada entendeu.

Enfim final de férias. Chegou a São Paulo feliz da vida.

No dia seguinte, uma semaninha apenas antes das férias terminarem, eis que Zé da Silva Qualquer voltou ao trabalho. Jurando nunca mais tirar férias.

Para ele o trabalho não apenas dignifica o homem. Como o faz descansar de vez.

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