Tentando domesticar a ansiedade

Durmo menos que deveria. Cinco breves horas me satisfazem.

Dizem que o sono do velho encurta-se com o passar do tempo. Por que seria?

Talvez, no meu entender, sem muito embasamento, seria por causa do tempo que lhe resta.

Dormindo menos o velho aproveita melhor as horas. Já que durante a escuridão da noite ele não percebe o clarume dos dias. Muito menos vê o tempo escorrer por entre seus dedos.

Sou refém da madrugada. O despertar do sol não só me faz feliz como também me liberta dos maus pensamentos.

Nestes meus mais de quarenta anos de exercício da medicina tenho visto, assustado, como as pessoas, nestes tempos difíceis por que passamos, usam cada vez mais medicamentos para amenizar a ansiedade. Debalde.

Em cada receita prescrita, nas unidades de saúde da minha cidade, mais e mais pessoas ali comparecem, ávidas por receberem aquele fármaco de tarja preta. Seus queixumes são quase os mesmos: “não consigo dormir. Passo as noites de olhos abertos. Tentando conciliar o sono. E não consigo”.

Não tenho como recusar-lhes a receita. Embora sabendo que aqueles pacientes voltarão em pouco tempo. Reféns da ansiedade. A procura do bálsamo que porventura, quem sabe um dia, vai conseguir minorar-lhes a ansiedade.

Eu também não fujo à regra. Por mais que tente não consigo amenizar a sofreguidão que se passa dentro de mim. Antes não era tanto assim.

Tento domar a ansiedade na lida diária. O trabalho me faz feliz. O exercício constante da mesma maneira contribui para aquietar dentro de mim esta ansiedade que me consome o âmago. Não tenho como mudar meu estilo de vida. Afinal não tenho mais vinte anos.

Tento domesticar a ansiedade observando o cotidiano. E escrevo retratando o mesmo. Escrever é uma maneira que encontrei para tentar domar a ansiedade. Correr da mesma forma contribui para tentar domar a mesma ansiedade.

Olhar, daqui de cima, o horizonte infinito, tem-me feito tão bem. Da mesma maneira acordar cedo tem feito parte da minha vida. Tudo isso contribui para tentar domesticar a ansiedade que me consome no dia após dia.

Bem sei que o trabalho rejuvenesce. Que não pensar tanto nos anos que nos restam deve ser inserido na nossa rotina.

Por vezes tento domar a ansiedade e não consigo. Mesmo assim sobrevivo. Nesta azáfama do dia a dia.

Logo mais, a partir das oito, deixo meu lado médico prevalecer. Mas a ansiedade não se acalma. Ao revés.

A partir das dez volto a atender no posto de saúde. Ali pessoas me procuram em busca de medicamentos para amenizar-lhes a ansiedade. Debalde. Logo elas retornam. Mais aflitas ainda.

Se pudesse prescrever-lhes um fármaco milagroso, que pudesse atenuar-lhes a maldita ansiedade, como me sentiria feliz.

Pena que nem a minha tenho conseguido.

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