“Como dói”.

Dor, sentimento que machuca, tanto por fora quanto nas entranhas da alma.

Dor pode ser definida como: “dor é um sentimento angustiante, muitas vezes causado por estímulos intensos e prejudiciais, como dar uma topada no dedo do pé, ou devido a uma queimadura qualquer. A dor é uma experiência sensorial e emocional desagradável, associada a um dano tecidual real ou potencial. No diagnóstico médico a dor é considerada como um sintoma de uma condição subjacente. Não se trata a dor sem saber a razão de ela existir. Assim como não se deve tratar a doença, e sim o paciente.

Nietzsche sofismou sobre a dor: “somente a grande dor é o libertador final do espírito. Eu duvido que tal dor nos faça melhores. Mas eu sei que isso nos torna mais profundos. O que não nos destrói me fortalece”.

Hoje, sábado, fevereiro cortado ao meio, choveu um bom bocado. Ainda agora o céu se mostra cinzento. Uma garoinha fina cai sem cessar

Por este motivo não fui à roça. Como deve estar feliz quem mora por lá.

O telefone me acordou bem cedo. Foi uma voz familiar que me fez dar um salto da cama.

Apreciaria, naquela hora madrugadora, permanecer por mais tempo recostado ao meu travesseiro, ouvindo as notícias nada animadoras pela televisão.

Chega de mortes! Pensava com meus pensamentos.  Quem sabe um dia teremos paz.

No entanto, a notícia que me foi dada nesta manhã, foi justamente a despedida de um amigo querido. Um colega de fardas. Do mesmo pelotão onde eu trabalhei por muito tempo. E espero continuar por mais anos ainda. Até que a morte me venha buscar.

Quando ele aqui chegou eu já estava aqui. Se não me falha a memória fui o primeiro a dar-lhe as boas vindas a nossa querida Lavras.

Quantas vezes nos encontramos naquele centro cirúrgico. Ele do outro lado da mesa. Fazendo o paciente dormir. Enquanto eu terminava a operação.

Temos quase a mesma idade. Alguns meses apenas nos separam. Trabalhamos no mesmo hospital. Éramos vizinhos bem perto. Quantas e quantas vezes ele me oferecia carona. Mas eu preferia ir caminhando. Até onde estou agora. Solitário, lastimando a sua morte, da forma que sei fazer melhor.

Carlos Roberto Valadares era natural de Bom Jesus do Galho. Cidadezinha nas cercanias de Caratinga. Daí o seu apelido carinhoso, como ele era, de Carlinhos Caratinga.

Competente em sua arte, anestesista de escol, Carlinhos era considerado um experto em seu metier. Daí o respeito e a confiança que todos nele depositavam.

Ainda me lembro do quanto nos frequentamos nos tempos idos. Éramos não apenas colegas. Como grandes amigos.

Hoje o Valadares, lavrense de coração, deixou-nos órfãos de sua sabedoria. Não mais ele vai estar naquele bloco cirúrgico. Sua ausência será duramente sentida não apenas por seus colegas. Bem como pelos pacientes que aprenderam a admirar sua prestimosa solidariedade.

Prestes a se aposentar Deus ofereceu-lhe um novo emprego no céu. Os anjos estão em festa.

Ele deixou família a prantear-lhe a saudade. Uma esposa dedicada.  Dois filhos que lhe seguiram as pegadas.

Uma vez no velório, profundamente consternado, assisti a um cena que me fez pensar no que deveria escrever neste dia profundamente triste.

Sua filha, mãe de seu primeiro neto, o querido Luquinha, ao lado do caixão, pertinho do pai, exclamou, em prantos: “como dói”.

Sei que para esta dor não existem analgésicos. Nem mesmo seu pai vai ser capaz de aliviar sua dor fazendo-a dormir, como ele sabia fazer tão bem.

Querido amigo Carlinhos. Não vamos mais poder tomar aquela cervejinha estupidamente gelada. Nem dar boas risadas como sempre fizemos.

Aí, onde você agora está, tomara exista uma mesa de bar.

Como sua filha Simone disse, entre lágrimas: “como dói”.

Desejo a todos vocês, esposa, filhos, neto, irmãos, que Deus ilumine a todos. E eu, mesmo não conseguindo repartir a sua dor, que pelo menos o exemplo que o Carlinhos deixou sirva, de alguma forma, para que se lembrem dele com o mesmo carinho que ele esparramou entre nós.

Como dói, bem sei avaliar, esta ferida ainda viva. Que só o tempo ajuda a cicatrizar.

 

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