Depois da chuva nem sempre o sol aparece

Como tem chovido nestes primeiros dias de fevereiro.

De manhã, bem cedo, nuvens cinzentas prenunciam mais chuva ao cair da noite.

As grandes cidades sofrem com as enchentes. Pessoas que vivem em áreas de risco a cada momento acordam soterradas por deslizamento de terra.

Na roça dizem que a chuva é obra de um criador. E quando ela chega, molhando a terra, enverdejando a pastaria, é sinal de fatura nos meses posteriores.

O que seria da gente sem a presença da chuva? Sem ela não teríamos vida por sobre a terra. Alimentos escasseariam. A fome logo nos aniquilaria. A miséria tomaria conta de todos nós.

Mas, em contrapartida, quando ela vem em excesso, as tempestades seguidas de relâmpagos, ela em desvario pode causar mortes. E colocar gente, principalmente os menos afortunados, em sérias dificuldades.

Foi isso mesmo que aconteceu, num dia como este, a um pobre caboclo, que sempre viveu na roça, acordando ao nascer do sol, que no tempo certo inseriu na terra sementinhas de milho, sonhando em pouco tempo colher uma safra de milho sem igual.

Pedro era um trabalhador como outro qualquer.  Vivia da renda do leite. Duas dúzias de vacas mestiças eram tudo que possuía. Sem elas nada faria. Seu sustento dependia delas.

Fevereiro seria o mês de colher os frutos do seu trabalho. A roça de milho estava no ponto de ensilar. A chuva caiu no tempo certo. Os pés de milho cresceram tanto que quase tocaram o céu.

Pedro acordou bastante animado naquele começo de semana. Olhou pro alto e viu, por entre as nuvens, que naquele dia não iria chover. Era tempo de encomendar o trator de um vizinho de pasto para ensilar a roça de milho. Pelos cálculos a produção seria bem maior que no ano passado.

Assim que começaram os trabalhos desaguou uma aguaceira dos céus. E foi interrompido o que estava por fazer.

Na manhã seguinte mais uma vez a chuva caiu. E mais uma vez os tratores não tiveram como trabalhar.

Uma semana inteira choveu dia e noite. O sol não dava as caras. O céu continuava cinzento. Mais chuvas se anunciavam.

Pedro ficava cada vez mais preocupado com a roça de milho. Caso passasse do ponto corria o risco de o milho endurecer e não prestar mais para alimentar as vacas. Mas a chuva continuava dias a fio. Sem dar indícios de que o tempo iria melhorar.

Numa manhã de sábado o sol mostrou a cara. Pedro sonhou com o sol. E foi logo procurar o vizinho. Para a safra de milho colher.

Assim que começou a colheita de repente o céu escureceu. Nuvens densas se formaram do nada. E a chuva recomeçou como de outras vezes.

Mais uma vez Pedro esmoreceu. A roça de milho foi por água abaixo. Nada mais restou senão pés de milho endurecidos, impróprios a serem cobertos de terra. Aquele ano seria trágico. Pedro não teria como alimentar as vacas.

Passou um mês. Dois se perderam na lembrança. O pobre sitiante teve de vender as vacas. E acabou se mudando pra cidade.

Como não tinha outra ocupação acabou engrossando a fila dos desempregados. Passou fome. Fazia bicos para ganhar a vida. Mas não estava sendo fácil.

Naquela noite, ingrata, dormindo debaixo de um viaduto, Pedro teve um sonho trágico.

Sonhou com a chuva caindo mansamente. De repente o sol se fez. Naquela manhã, depois de despertar de repente, caiu uma tempestade tão forte, que acabou levando o pobre Pedro na enchente. Encontraram o que sobrou de Pedro num rio muitos quilômetros adiante. Ele sonhou que estava morto. Não foi sonho. E sim mais uma cruel realidade.

Depois da chuva nem sempre o sol aparece. O ocaso do infeliz Pedro se tornou mais uma prova inconteste do que pode acontecer. Neste país tão lindo. Tão desigual. Onde tantos têm tudo. E a grande maioria vive sem saber o que vai acontecer no dia seguinte.

Tomara as coisas mudem. Num futuro perto. Pois estamos cansados de esperar tanto.

Bem sei que depois da tempestade vem a bonança. Tomara a nossa espera não nos faça cansar de esperar. Chegamos a um ponto que a paciência que nos resta vai por água abaixo. Deixa as águas rolarem? A lama matar. Basta! Chega! É hora de mudar de vez a cara do Brasil. Antes que tenhamos de nos mudar daqui.

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