Além, muito além do paraíso

Quantas vezes sonhei com um lugar paradisíaco…

Era como se fosse uma ilha parcamente povoada.  Coqueiros lindos debruçavam-se sobre o mar azul. Entre um azul turquesa e um verde olhos apaixonados. Ali, naquele cenário perdido em meio a um oceano imenso, voavam gaivotas brancas como algodão doce purinho. Peixes em cardume guiados por um maior, pulavam de contentes dada a alimentação abundante.

E sereias imaginárias povoavam meu sonho impuro. Nada era indubitávelmente lindo naquele sonho irreal que parecia.

Foi trasanteontem que cuidei de fazer deste sonho nada mais que um sonho.

Era verossímil demais para ser real.

Embarcamos em direção a uma ilhota pra mim desconhecida junto às pessoas que mais amo. Outros familiares ficaram atrás. Perdidos no passado estão meus pais.

De São Paulo a Bogotá a viagem cansou-nos bastante. Pra quem não dorme quase nada varar a noite tentando-se acomodar naquelas poltronas estreitas é missão impossível.

Enfim Bogotá. Fica aqui uma menção honrosa aos serviços da Avianca. Nota nove e nove.

Mais um chá de aeroporto. Mais espera para outro vôo de conexão. Sorte não ter malas a retirar.

Uma hora e meia nos esperava curtamente para chegar além do paraíso. Sol, nada de noite, sorriam em nossa direção.

Num taxi a moda antiga, preços prefixados em dólares, creio que mais ou menos vinte deles, levou-nos sãos e salvos a um resort lindo. Já estivemos em outro. De nome Punta Canas. Na república aqui pertinho chamada de Dominicana. Mas nada, no meu desconhecer, se equipara a este que olho de aqui do meu sétimo andar. Por falar em sete, como ele tem me dado bons augúrios. Meu consultório de médico escritor fica no mesmo andar.

A taxista que nos trouxe em nada se parecia à hospitalidade e riso fácil dos locais. Nada quis com a minha insipiente tentativa de aprender a balbuciar palavrinhas corriqueiras no dialeto creoulo. Chamado papiamento. Mistura de espanhol, algumas palavras em português, no holandês, já que meu paraíso teve início na colonização holandesa, bem melhor que a nossa brasileira.

A data certa de nossa chegada foi antevéspera da passagem do ano velho ao novo. A véspera assina no dia de hoje.

A nossa entrada no resort foi, mais ou menos, em grande estilo. Não houveram fogos de artifício, como logo mais a noite vai ter. Nossa reserva, naquele luxo todo, começava às três da tarde. E meu aple watch assinalava menos de duas.  Mas, tudo ali eram flores e sorrisos corteses. Uma verdadeira torre babel se misturava aos sotaques de varias nações. E eu, ávido por exercitar o meu alemão, não tive como falar nem ao menos auf wiedersehen. O holandês era a língua com a qual mais se identificavam os felizes moradores da ilha paraíso. Mas, como haviam muitos haitianos aqui, meu francês não foi esquecido. Nem ao menos meu bom inglês. Já que na ilha paraíso predominavam os anglo saxônicos. Aquelas pessoas de mal com a balança, sedentários ao extremo. Mesmo assim encontrei canadenses e norte americanos de bom físico não como o Rambo matador de vietcongues. E muitos deles grudados aos livros versados em literatura pura. Para meu gáudio acabei vendendo meu Por Quem os Sinos não Dobram a um capixaba residente no paraíso há exatos três anos. A quantia foi de quinze dólares e cadinho mais. Na moeda local, o Florim, de uso corrente na ilha paraíso.

No primeiro dia de estada na ilha, nas vizinhanças da infeliz Venezuela, da sorridente Curaçao, uma vez o cansaço foi deixado na cama espaçosa dividida com minha Rosa, já estávamos prontos a pisar na areia fina da praia de Palm Beach. E das piscinas azuis na temperatura aconselhada pelos médicos à saúde perfeita, não tanto gelada como do aprecio aos pinguins, nem quente quanto a temperatura da sauna do Lavras Tênis Clube.

Meu netinho primeiro me acompanhou com suas duas boinhas no primeiro mergulho. Sua mãe, seu zeloso pai, a tudo acompanhavam com olhos gulosos. Meu filho e sua esposa, a gauchinha biscuit, tomavam sol na cadeira do lado. Dois acompanhantes nossos, a mãe do meu genro, outra avó do Theo, e seu atual esposo, chegaram depois.

O primeiro almoço a gente jamais esquece. Mesa farta. Petiscos variados. Bebida a vontade. Hospitalidade em alta, decerto esperando propina da melhor qualidade. E notas e notas de dólar rolavam de mão a mão. Sempre acompanhado de muchas gracias. Sem o indefectível doutor dos lados de cá.

A primeira janta até agora me faz lamber os beiços. Que lagosta deliciosa foi servida em sua casca ao ponto.

Agora são dezenove horas e poucos minutos. Em breve instantes desceremos todos juntos. A compartir com os demais hóspedes toda a cordialidade maiúscula daquela babel de letras a última ceia do ano.

Amanhã escrevo sobre o pipocar de fogos. Que se adianta ao nosso cerca de três horas inexatas.

O réveillon foi além do esperado. Embora a torre de babel ainda se mostrasse em seus idiomas díspares, filas enormes se formavam. Por sorte nossa a sala de comida feita reserva no dia anterior, hoje é primeiro de janeiro. O nosso restaurante, de portas fechadas, era o Ideal para uma família como a nossa. E junto a nossa a alegria sorria o pequeno Theo. Impossível de controlar. Com seu espírito voluntarioso ele ia e vinha, no amplo corredor, bulindo com um, com outro, mostrando a todos sua simpatia loura.  E eu corria atrás. Talvez pela atividade física desprendida na noite de ontem, a caça do pequerrucho garoto, agora já passa das nove e trinta e cinco de um dia lindo, acordei com uma fisgada na panturrilha grossa como caule de bananeira.  Que logo se desfaçará. Também pudera. Com um dia lindo como o de hoje, de pouco choveu, agora o sol abunda, daqui de cima avisto as águas azuis da piscina linda, com os servis acordando como se tivessem engolido o sol, com a alvura dos seus dentes perfeitos, como não se contaminar com a felicidade?

 

A ceia, no sistema de quem tem pressa não chega a lugar algum, foi cortesmente posta a mesa por gente que entende do que faz e faz bem feito. No esquema de fias bem comportadas íamos de mesa a mesa. Enchendo os pratos de lagosta ao ponto, de camarões que mais se pareciam a baleias jubartes de tão grandes que eram, de paelhas iguais ou melhores do que as comidas em Valência, Espanha, quando lá morei, de calamares em su sumo, tudo e mais regado a champanhe de boa safra e outras bebidas mais.

Pontualmente há meia noite fizemo-nos ao mar. Theozinho já dormia a sono pesado no carrinho de mim ganhado.

Fogos duraram mais de meia hora. Tudo regiamente registrado em fotografias no meu celular de plantão.

A seguir nos deitamos na cama. Exaustos, mas felizes pelos outros dias que nos esperavam. Conto nos dedos mais cinco. Infelizmente apenas cinco.

A manhã do primeiro dia do ano nos acolheu em seus braços carinhosos. Uma chuva rápida deixou apenas poças em seu caminho. Logo de vez o sol brilhou. Forte, costumeiro. Uma brisa fresca não deixava nossos chapéus se equilibrarem sobre nossas cabeças desprovidas de pelos no alto. Logo o chapéu voava. Como um pássaro sem rumo.

A praia de Palm Beach, com sua beleza habilmente retocada pelos guardiães do Riu Resort, nos oferecia, tudo incluído na diária nada barata, os serviços perfeitos de hotelaria que não se vê no Brasil. Loungers, para nós simples quiosques, feitos de cobertura de palha, talvez seja aparentada ao nosso sapê, dava conta de tapar o sol mas não o encanto que o mar caribenho nos jogava na cara.

O banho naquele mar de areias finas era um must. Nem a bela “princesinha do mar” teria seus encantos. Fora a segurança de não se ver arrastões. Onde a violência nem nas ondas do mar tranquilo se mostrava a nós. Balas perdidas? Apenas balas de goma ou da marca Chita eram distribuídas naquele pedaço do paraíso perdido no mar caribenho.

Mais uma vez o avô cuidador se mostrou apaixonado por seu primeiro neto. Theo vagabundeava com seu corpicho claro do mar à barraca onde estávamos. Com seu baldinho de construir castelos de areia que logo eram esboroados como as ondas se desmancham na areia.

Uma dose racionada de bebidas geladas, servidas nas vizinhanças da piscina, mais uma torre de babel de onde se ouviam idiomas variados. Pina colada, uma outra de nome parecido a Cesar, onde se degustava o sabor de suco de tomate apimentado, a nossa caipirinha, sem a intraduzível cachaça, era vodka ou rum mesmo.

Uma ou duas me satisfez completamente.

Já é quase uma hora do dia um do ano novo. Sol forte, céu de repente se faz nublado. Mais chuva vai despencar fugaz, são chuvas de verão. Apenas o que são.

De banho tomado, embora não quisesse permitir deixar sair de mim o cheiro salgado do mar, estou preste a ir almoçar. Apesar de sem fome vou abaixo estar. Junto ao meu Theo, minha esposa amada, meus dois filhos queridos, meus genros responsáveis.  A mãe do meu genro, o Daniel. E seu atual esposo. Grande locutor estabelecido em São Paulo.

Não sei o que me espera na semana em curso.  Se choverá. Se o sol vai rachar. E se o tempo mudar? Nada importa.  Aqui, nesta ilha caribenha,talvez seja, em juízo melhor, o paraíso onde pretendo ficar.

Aruba é muito além do jardim do éden. Um lugar paradisíaco. De clima adorável. Cheio de pessoas adoráveis. Uma torre de babel. Onde se fala o papiamento. Yo te  gusto mucho. E otras cositas mas.

 

 

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