A saudade dói

Eita palavrinha dolorida que por vezes machuca sem deixar sinal.

E como ela dói.

Sete de junho que se avizinha ela fazia aniversário. Sete de junho pra mim é uma data especial.

Foi nesse dia quando ela nasceu. E eu nasci graças a ela e meu saudoso pai.

Ainda me lembro. Saudades me cavoucam por dentro. Naquelas noites frias como essa manhã que me acordou no dia de hoje. Quando minha mãe querida. Dormindo em outro quarto. Quase contiguo ao meu. A ela pedia, quase uma súplica, que ela desse uma passadinha em meu quarto. O sono ainda não me fazia fechar os olhos. E era ela quem me fazia dormir. Depois de cantar cantigas de roda. E de cobrir meu corpinho friorento. Envolto naquele pijaminha de flanela axadrezada. Feito pela minha avozinha. Que não sei o que foi feito dele. Depois de tantos anos e sonhos desfeitos.

E como a saudade fica dolorida ao me lembrar dela. Daqueles anos passados naquela mesma rua que daqui se avista na escuridão dessa manhã. Naquela casa que não existe mais a não ser nas minhas recordações mais ternas.

A saudade me machuca por dentro. É como se um punhal de lâminas afiadas me fosse ensartado dentro do peito. Quando me recordo dos amigos que tive. Muitos deles hoje brincam no céu. E não me esqueço dos meninos da Costa Pereira. Não vou citá-los nominalmente pois são tantos e não me perdoarei por omitir ou sonegar alguns deles. Pois bem sei que nos tempos de agora eles me olham lá do alto. Entre nuvens escuras e o sol que dentro em pouco acorda sonolento. Depois de uma noite de amor com a lua. Tentando se livrar do ciúme das estrelas que pensam serem elas a única companhia do astro rei.

A saudade me machuca só de lembrar o passado apetitoso que passei junto aos meus entes queridos. Uma vez na casa da minha avó Belica. Naquela mesa farta degustando seus quitutes que só ela sabia fazer. E elazinha plantava rosas cor de rosa em seu jardim suspenso. Onde nos dias de hoje ergue-se imponente o edifício Rodartino Rodarte. Edificado a duras penas por meu pai Paulo José de Abreu.

E como a saudade dói ao me lembrar de fatos pretéritos. Quando ainda menino. Serelepe jogava finca e bete na mesma rua. Ainda descalça de asfalto duro. A terra batida nos fazia chegar a casa sujismundo de barro vermelho quando a chuva caía. Enlameados até por dentro da cuequinha encardida.  Temerosos pelo castiguinho que nosso pai nos deixava de costas para a parede da sala. Sem podermos assistir ao desenho animado. Não sei se era do orelhudo Pluto ou da Minie. Ou do tio Patinhas mergulhando na sua piscina recheada de notas graúdas.

Lembranças me assaltam sempre. Sem armas em punho elas me vêm aos pensamentos.

E como a saudade machuca sem deixar rastro. Quando me lembro dos domingos ensolarados. Quando, depois da missa das dez. Depois de ouvir do padre aquela ladainha costumeira. Depois da comunhão a missa terminava solene. E ele se despedia da gente dizendo: “vão em paz o Senhor os acompanhe.” Mas quem nos esperava na passarela do jardim era aquela garotinha assanhada.  Que, se não foi a primeira namorada não foi a única e derradeira. Já que foram tantas que acabei ficando com a terceira. Não me lembro o nome dela mas era algo parecido com uma flor. Não seria rosa?

E como a saudade continua doendo muito mesmo.

Ao me lembrar de tantos causos e loisas. Quando, no primeiro ano do curso primário. A professorinha recatada de não sei o quê. Descuidada deixava sua anágua a mostra. E a gente, de olhos inquiridores. Não na matéria lecionada. Só tínhamos olhos para aquilo que ela deixava entrever. Não seus olhos castanhos ou de outra cor. E sim em suas pernas morenas. Lisinhas como bunda de nenê.

A saudade dói de verdade. Ao me lembrar da mocidade perdida que os anos não nos permitem voltar atrás.

Ainda me lembro dos meus vinte anos. Os trinta foram o começo de minha vida profissional. A partir de aí penso ter criado juízo. E agora o perdi.

A partir dos quarenta foram os melhores anos de minha vida. E como trabalhava duro. Já enrijecido pelos embates da profissão que escolhi não tive mais dúvidas que foi a opção mais acertada. Na mosca foi a escolha da parceira que até hoje me acompanha.

Mas a saudade continua fazendo estragos dentro de mim.

Quando me recordo deles todos. Pessoas que deixaram pegadas que até hoje continuam a marcar meu caminho a seguir.

 

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