Receita de bolo de felicidade

Uma pitadinha de açúcar com afeto.

Um cadinho de seu doce predileto. Pra mim é goiabada com queijo feito pela dona Lúcia esposa do Roberto que a esta hora deve estar no fim da primeira ordenha.

E pros outros pode ser queijo frescal com doce feito dele mesmo.

Mas, felicidade, que muitos entendem como prazer, estado de uma consciência plenamente satisfeita. Satisfação, contentamento e bem estar.

Mas, convenhamos. Estar ao lado de outrem que sempre lhe puxa as orelhas. Que não comunga dos seus prazeres. Que, em absoluto não se sente bem ao seu lado. Que crispa os olhos franzindo os sulcos na sua face já enrugada quando você tenta a ele ou ela ler uma crônica recém escrita e ele ou ela diz: “não gosto do que você escreve. Não gosto de ler e muito menos de escrever”.

Felicidade não rima e não diz respeito à idade. Em qualquer delas poderemos ser absurdamente felizes. Basta apenas desfranzir o semblante dantes anuviado. E mostrar onde se escondia o dente siso. Sobre quem dizem ser ele o responsável pelo juízo.

Aliás, por falar em juízo, quem garante que ele é parte essencial da tão falada e tão mal amada felicidade. Pra mim ter juízo não faz parte daquela palavrinha que soa aos meus ouvidos tão maravilhosamente como quando vejo dois velinhos se abraçarem. Beijarem-se. Andarem de mãos dadas. Um preocupado com o bem estar do segundo. Pois a felicidade de um se completa no sorriso do outro.

Ser feliz talvez seja, das muitas benesses que o ser humano desfruta, uma das mais importantes de que se tem notícia.

Apesar de achar que a tal felicidade não seja noticiada pela mídia sedenta de sangue ou notícias nada agradáveis.

Pois dizer que fulano de tal ou cicrano a esposa mata o companheiro por causas banais com uma facada certeira no peito fazendo-o se esvair em sangue atingindo em cheio o coração da mais ibope que falar que o cupido acertou na mosca o coração de dois pombinhos que sorriem felizes deixando a felicidade mútua irradiar-se como o sol brilha nesta linda manhã de domingo.

E qual a receita, no meu estulto entender, daquilo que em verdade seja felicidade?

Não parece ser igual a receita de pão de queijo, uma especialidade bem mineira, que caiu nas graças de todos os continentes, que é (desculpe-me se dei a receita errada). Eu não sei fazer nada na cozinha a não ser comer.

Acrescentem dois ovos. Não precisa ser caipira. A uma xícara de sal a gosto. Se por acaso desgostarem não digam que eu desgostei. Misturem bem o polvilho recém saído de uma embalagem comprada na prateleira de uma boa venda. Não usem venda nos olhos pois você não pode enxergar. Batam tudo no liquidificador. Cuidado para a maquininha não ferver ou esquentar demais.  E, depois de tudo cumprido à risca. Não sujem a lousa com a risca de giz. Apaguem todos os seus pecados no confessionário do vigário escondido do lado de dentro do quartinho num cantinho da igreja onde você foi batizado. E, coloque tudo no forno a temperatura que vocezinho usava quando tomava banho de bacia na roça de suas tias avós.

Cuidado para não sapecar os pães de queijo que irão ser servidos no café da manhã antes que as galinhas soltas soltem o grito de: “ladrão de ovos. Prendam o moleque que se atreveu a entrar no meu galinheiro e afanou meus ovos entre eles alguns chocos prestes a deles saírem pintinhos.”

E esse meninozinho era eu.

Mas, escrevendo sério (embora seja difícil ler o que deixei escrito já que eu mesmo sempre invento causos que nem sempre são compatíveis com a verdade).

Qual a receita de felicidade?

Há tempos convivo, aos sábados e domingos, com gente simples, da roça, pessoas de mãos caludas e tezes tostadas pelo sol. Para os quais a palavra dada vale muito mais que mil letras promissórias com vencimento a dez dias a contar da data que o empréstimo se concretizou.

O que eles dizem a mim sobre tal felicidade? Embora grande parte mal sabe a grafia exata da mesma.

Hoje, bem cedo, ao voltar da minha rocinha, à porta da porteira do amigo Tiãozinho do Aristeu.

Encontrei-o ao lado de duas latas de leite recém saído das tetas de suas vaquinhas tatus com cobra.

Ele, como sempre, sorrindo na sua banguelice mil e um. Faltavam-lhe duas fileiras de dentes. Ele só exibia na boca seus dois sisos. E mais nada.

Parei um cadiquinho a minha Orock.  E a ele perguntei qual o sentido da palavra felicidade.

Foi aí que ele sorriu. Num lindo riso de dentadura novinha. A qual ainda devia mais de dez prestações de uns cinco reais irreais.

Na nossa despedida, já que o caminhão leiteiro já buzinava na curva da estrada.

Tiãozinho satisfez minha curiosidade curiosa com isso: “que memo sabê? Cê feliz incontrei num encontrão com essa porqueira de portera na tarde noite de onti. A tar felicidade se reuni nisso- na singeleza do singelo. No acordar ouvindo o canto encantado da Patativa cantarolar tico tico no fubá. No mourejar constante já que trabaiá é mil veize mior que forgá. Tudo isso e mais isso outro, nu meu intender que dizê felicidade. Concorda ou sem corda cum mais eu”?

Dali saí abrindo meu sorrisão transpirando de felicidade.

 

 

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