Mais um amigo se foi

Em pouco tempo não terei a quem prantear a não ser a mim mesmo.

A cada dia um amigo se vai. Perdas irreparáveis acontecem no meu viver.

Fazer o quê?

Só me resta lastimar e esperar a minha vez.

Hoje estou setentanos.

Amanhã, quando dezembro viver, setentaeum irei fazer. Em absoluto não sinto o tempo passar. Apenas passarinho. Ainda estou aprendendo a voar.

Muitos daqueles amigos da Costa Pereira não mais estão aqui. Já partiram ao infinito. Pra onde? Dizem que para um lugar lindo. Além das nuvens, no azul do céu, entre anjos e querubins vivem agora. Suas almas ainda vagueiam por aqui. Sinto-lhes a presença. Embora não os possa ver em carne e osso. Já que seus restos mortais ou foram sepultados. Ou incinerados. Viraram cinzas cinzentas. Da cor do dia que amanheceu nesta quase primavera. Quando a chuva caiu durante a noite. E ainda persiste mansamente.

Este foi um ano que não deixa gratas recordações. No seu rastro incidentes que não merecem ser lembrados. Mortes, lamentos, a tal pandemia que ceifa vidas. Famílias enlutadas se esparram pelo mundo inteiro. Gritos de dor, sofrimento.

Neste final de semana mais uma perda a lastimar.

Previsível, pelo desenrolar da sua enfermidade. Embora sentida por todos aqueles que lhe são caros.

Eu o conheci, de perto, quando me mudei para o condomínio. Foi ele quem me ensinou a caminhar.

A princípio a passos inseguros. Já que não estava acostumado a andar. Depois minhas passadas foram se alongando. E ele ficava pra trás.

Ainda me lembro de sua prosa boa. Falávamos de quase tudo. Da política dominante. Das suas paixões partidárias tentava me esquivar. Ele caminhava lentamente. Era ele quem dominava os assuntos em voga. Eu, mais ouvia do que argumentava. Ele, o meu amigo que partiu neste final de semana, quase sempre parecia ser o dono da razão.

Ainda lembro, certo dia, quando caminhávamos no entorno do condomínio, quando estávamos a sós, ele me disse, com sua voz sábia : “Paulo, gosto de caminhar com quem me acrescenta algo de novo. E você é uma destas pessoas que admiro.”

Mal sabia ele que a tal admiração era recíproca. Com ele aprendi não apenas a caminhar. Assim como o diálogo é importante para clarear as nossas ideias.

Ele, este meu amigo que partiu há dias atrás, deixou não apenas a família enlutada.

Bem como toda a comunidade que o admirava.

Foi o pioneiro na indústria de confecções em nossa cidade. Ao lado da irmã, de outros irmãos, fundou uma indústria pioneira. Cujas roupas eram disputadas pais inteiro.

Seguiu os passos do pai alfaiate. O qual conheci quando aqui cheguei.

A nossa amizade começou naquelas longas caminhadas no entorno do condomínio Jardim das Palmeiras. E foi interrompida nos últimos dias quando foi chamado aos céus.

Mais um amigo se foi. Mas ainda se faz presente não apenas nas minhas lembranças.

Luís da Trel não morreu. Ele ficou encantado para sempre. Não só no meu coração. Como também no coração de todos que o conheceram.

Neste final de semana perdi mais um amigo. Espero estar junto dele. E dos que me são caros. Num futuro ignorado. Um dia, quando? Quem sabe?

 

 

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