Pra eles sempre era um lindo dia

Mesmo que fracassasse o sol, mesmo ao dissabor de uma noite sem lua, mesmo que a chuva faltasse, sempre seria para aquele homem singelo um lindo dia a começar.

Seu Pedro da Dona Lázara era um senhor de bem com a vida.

Nunca alguém o viu ressabiado. Nascido há anos atrás, nunca se preocupou em que data foi, Pedro caminhava nos anos sem saber quantos seriam.

Pelas contas da esposa, uma senhorinha da mesma forma sorridente, exibindo na boca banguela uma total falta de dentes, deveria ser pelo menos oitenta. Já que ela, dois anos mais nova, contava com setenta e oito, bem medidos.

Ambos nasceram na roça. Uma rocinha tão acabanada que quando uma vaca deitava deixava o rabo de fora.

Por sorte, já que a renda do leite era pouca, não tiveram filhos. Viviam um pelo outro. Em total e completa harmonia.

A saúde, até a presente data, nunca faltou ao casal. Seu Pedro de vez em quando se queixava de um incômodo em verter urina. Mas sempre deixava um urinol debaixo da cama. Que amanhecia transbordando pelas beiradas.

Já a dona Lázara era a alegria em pessoa. Não perdia um só arrasta-pé. Dançava até o raiar da aurora. Era animada por natureza. Saliente que nem ela só.

Naquela manhã, de um verão caloroso, seu Pedro acordou a mesma hora de sempre. Era hora de ir ao curral. Ordenhar meia dúzia de vacas. As quais já esperavam de mojo cheia na porta do curral.

Dona Lázara já estava com o cafezinho prontinho. Fumegando na trempe do fogão a lenha.

Sempre sorridente, afável e companheira, era a companhia perfeita para alegrar a quem quer que fosse.

Em mais ou menos hora e meia já haviam ordenhado as vacas. Um latão de leite cheio até a boca era enfiado num rego d’água por detrás da casa. Era este o resfriador que possuíam. De vez em quando um lambarizinho de rabo vermelho aparecia nadando no leite quente.

Assim vivia aquele casal. Sempre de bem com a vida. Nada lhes faltava. A alegria sempre aparecia fosse em qualquer ocasião.

Foi numa quarta-feira quando fui fazer-lhes uma visita. Eram meus vizinhos de pasto.

Já era quase hora do almoço quando apareci em sua casa.

Seu Pedro saudou-me com um cordial bom dia. Retribui a sua saudação com outro maior ainda.

Parei para um dedo de prosa. Na trempe do fogão a lenha já estava prontinho o almoço.

Não tive como recusar o amável convite para almoçar.

Degustei um torresmo de barriga junto a um tutu de encher a boca de prazer. Uma couve recém-colhida da horta fez-nos companhia naquela apetitosa refeição.

Passamos duas horas agradáveis falando de tudo. Menos das contrariedades que infelizmente têm acontecido em nossa nação.

Já era quase quatro da tarde quando me despedi do gentil casal. Prometi voltar num futuro perto.

Quando me afastei daquela casinha singela percebi, já na porteira, o quanto vale a pena ser feliz. Mesmo nas adversidades. Coisa que não existia para aquela casal simpaticíssimo.

Para os quais qualquer dia sempre seria um lindo dia.

 

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