Nada com um dia após o outro

Depois de um dia nasce outro bom dia.

Era assim que dizia um amigo meu.

Zé da Tiana era um otimista de nascimento. Dias ruins pra ele não existiam no calendário.

E olha que o afável Zé passava em muito dos sessenta anos.

Desempregado desde não se sabe quantos anos Zé vivia de bicos. E ele era bom de braço, madrugador assumido, jamais, nos anos todos que trabalhava nunca faltou a nenhum dia de serviço. Sempre pontual. Cumpridor dos seus deveres. Era tido pelo patrão como operário modelo. Quando lhe anunciaram a dispensa foi unicamente por contensão de despesas. A fábrica atravessava maus momentos e teve de demitir a maior parte dos operários.

Dez anos se passaram desde então.

Zé, por sorte estava separado, a mulher com quem se casara escolheu mudar de vida, desaparecendo numa manhã de sábado, sem dar noticias pra onde ia.

Desde este infausto momento Zé passou a viver na própria companhia. E como ele era boa pessoa, respeitado pelos vizinhos, nada lhe faltava. Aprendeu a viver com a solidão. Passava as noites assistindo a televisão. Era um noveleiro assumido.

Como tinha saúde a dar e distribuir graciosamente o valente Zé, apelidado da Tiana por imposição da mulher, aquela que o abandonou, não tinha como ficar parado.

Acordava ao nascer do sol. Tomava uma ducha fria. Tomava um cafezinho magro. Nem um pãozinho amanhecido tinha.

Saia às ruas em busca de trabalho. Como já havia passado da idade não estava sendo fácil reconquistar outro emprego.

Aprendeu a fazer artesanato. Fazia balaios enormes. Aqueles usados na panha de café. E era com isso que vivia, sempre alegre e satisfeito. Distribuindo bons dias a todos que passavam.

Quando com ele me encontrei, naquela manhã de uma segunda, era ainda bem cedo. Quase madrugada.

Zé estava numa esquina da cidade. Ao seu lado uma banca de balaios. Contabilizei dez deles. Todos eles bem feitinhos. Prontinhos a vender.

Não tive como não comprar um balaio das mãos do Zé. O preço era bem conveniente. Apesar de para ele quase não ter serventia pois não sou produtor de café.

Zé agradeceu-me a compra. Feliz da vida. Como sempre foi.

Deixei-o na mesma esquina. Desejando-lhe boa sorte.

Noutro dia, meses depois, reencontrei o mesmo Zé com seus balaios a vender.

Ele me desejou um excelente dia. E boa sorte no decorrer do mês.

Aquele janeiro em verdade foi um ótimo mês. Trabalhei como nunca. A sorte me sorriu em todos os dias do mês.

Quando me lembro do Zé da Tiana, mais um desempregado em nosso país, o qual vende balaios para sobreviver, e observo, pelas ruas a mendigarem, mãos estendidas em cada esquina, penso na alegria do amigo Zé.

O qual, mesmo a mercê da situação aflitiva de nosso país ainda tem motivos para sorrir.

“Nada como um dia depois do outro”.

Isso em verdade acontece a cada um de nós. Daí a necessidade de sermos felizes. Mesmo que a situação contradiga.

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