“Tá tudo muito bom”!

Dizia ele.

De fato. Ainda me lembro de um amigo. Já falecido. Prematuramente.

Zé das Risadas, rapaz esperto, sempre que se cruzava comigo exibia na face um sorriso aberto.

Era um otimista de carteirinha assinada. Nunca o percebi de mal humor. Ria a risadas escancaradas inclusive da própria desdita.

Ainda me lembro da derradeira vez que nos vimos. Zé já estava gravemente enfermo. Debilitado, internado num leito de hospital, à espera da hora final.

Trocamos meia dúzia de palavras.

“Como vai amigo Zé”? Ele me respondeu, entre dentes, num sorriso escondido por um semblante alegre, embora não ignorasse a gravidade de seu estado: “vou de mal a pior. Acredito que vou morrer. Quem sabe amanhã? Por certo não estarei aqui no próximo mês”.

Despedimo-nos sem manifestar a minha opinião. Deixei-o alegre em seu leito de morte.

Foi quando me recordei das nossas aventuras. Quando eu e ele, ainda vendendo saúde, fomos a rocinha de um compadre. Alegre como ele. Feliz da vida na sua simplicidade de caboclo do mato.

“Tá tudo bom por aí”?

Foi esta a pergunta que meu amigo Zé deferiu a queima boca ao nosso outro amigo. E ele asseverou, com seu ar divertido: “melhor não pode ficar. Pior só vai melhorar”.

Ficamos o final de semana na roça do amigo do Zé. Ele se chamava Antonino de Muita Sorte.

Não pela riqueza que possuía. E sim pela largueza do seu coração sempre pronto a ajudar.

Naquele sábado cinzento caiu uma aguaceira danada. Era tanta água que despencou do céu que fomos impedidos de voltar a casa. Mesmo assim, presos naquela casinha tosca, nos divertimos a beça.

Antonino contava piadas a toda hora. E riamos a bandeiras desfraldadas da falta de graça de suas anedotas.

Partimos num domingo cedo. A segunda nos esperava. O trabalho que tinha por fazer enchia minha agenda de coisas ainda pendentes.

Já o alegre Zé, já aposentado, por invalidez, já que tinha sofrido de uma doença rara, nunca trabalhou na vida. Passava o tempo inteiro preso a uma cadeira de rodas.

Dois anos ficaram pra trás. Eu e o amigo Zé poucas vezes nos encontramos.

Foi quando fui avisado da sua internação. Foi por outro amigo que soube da gravidade do seu estado.

Foi nesta manhã de sexta-feira, quatro de outubro, antes da sete horas da manhã, quando adentrei ao hospital, e fui encaminhado à enfermaria onde estava o Zé, quando o encontrei naquele estado lastimável.

Mesmo assim ele sorriu a minha entrada. Saudou-me com um amistoso bom dia. Passamos duras horas juntos. Foi a última vez que o vi.

Antes que deixasse a enfermaria, já que precisava ir ao consultório, ainda me lembro de suas derradeiras palavras: “não se preocupe comigo. Tá tudo muito bom. Não podia ser melhor”

Não consegui conter as lágrimas. E nem pude permanecer para a última despedida. Zé partiu ao céu sorrindo. Acredito, que lá em cima, foi recebido com festas pelos anjos. Com aquele insofismável “tá tudo muito bom. Não podia ser melhor”.

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