O menino que vivia olhando o relógio

Acordar cedo era o costume daquele meninozinho esperto.

Zezinho vivia num bairro afastado de uma grande cidade.

Aos cinco anos completos foi matriculado numa escolinha longe de sua casa. Ali aprendeu as primeiras letras. Bom aluno. Aplicado, nunca perdia um só dia de aula.

Em seu quartinho miúdo Zezinho dormia sempre a mesma hora. Junto dele ressonava um irmãozinho mais novo. Antes das nove da noite Zezinho fechava os olhinhos. Fazia uma breve oração. E pedia ao seu Deus saúde a sua família. Que constava naquela data de mãe, dois irmãos, e sempre se lembrava do pai ausente. Que abandonou a prole em busca de vida melhor em outra localidade distante.

Todos viviam em grandes dificuldades. A mãe, uma senhora de saúde precária, fazia faxina em casas de gente abastada. Mas nem sempre o que ela ganhava era suficiente para suprir as necessidades dela mesma e de seus três filhos. Zezinho era o mais crescidinho da turma.

Para não perder a hora de ir à escola Zezinho sempre olhava um relógio de cabeceira postado pertinho do seu travesseiro. Antes das quatro da madrugada reolhava os mesmos ponteiros depois das quatro e meia. E repetia a façanha antes das seis da manhã.

Deixava a casa exatamente as seis horas exatas. As aulas começavam as seis e meia. Para chegar ao colégio o bom menino tinha de tomar duas conduções.  E nunca perdia o ônibus graças a sua pontualidade.

Um dia algo estranho aconteceu. Era começo de inverno. Dias frios se anunciavam.  Do lado de fora da casa a temperatura oscilava  entre cinco e seis graus centigrados.

Tudo estava branco do lado de fora da janela. Zezinho acordou a mesma hora. Olhou para o relógio de cabeceira e ele estava parado. Tudo devido à pilha que deveria ter sido trocada.

Naquele dia de inverno Zezinho perdeu a hora. Chegou atrasado à escola. Mesmo assim não perdeu a segunda aula do dia.

Antes de voltar a casa passou por uma loja na intenção de comprar pilhas novas.

Acertou os ponteiros do velho relógio. E eles continuaram a se movimentar como dantes.

Na manhã seguinte Zezinho, preocupado como sempre, acordou sem ter dormido. Passou a noite inteira olhando os ponteiros do relógio. De repente eles empacaram. O velho relógio parou de vez. Não eram as pilhas que estavam gastas. E sim devido ao mecanismo que fazia o velho relógio funcionar.

A partir de então, como não podia comprar um relógio novo, Zezinho passou a contar as horas pelo nascer do sol. No entanto no inverno o sol acordava tarde. E o pobre menino perdia a hora de ir a escola.

O que fazer para contornar a situação?

Zezinho passou, a partir de então, a não mais fechar os olhos. Dormia com um olho aberto e outro fechado. Na intenção de não perder a hora de acordar de vez.

Aos dez anos, afinal, a situação foi contornada. Um tio torto presenteou ao sobrinho com um relógio novinho.

Zezinho passava a noite inteira admirando o novo relógio de cabeceira. Era um velho Cuco. De vez em quando o passarinho saía da portinhola do relógio de madeira escura.

Sob os olhares atentos de Zezinho.

O tempo passou. Zezinho cresceu. Nunca mais perdeu a hora.

Num dia, quando o inverno cedeu espaço ao verão, o jovem Zezinho viu uma estranha transformação acontecer em seu corpinho de criança.

Em seu tronco apareceram ponteiros. Em sua cabecinha nasceram horas. Suas pernas esguias mostravam minutos. E seus pezinhos miúdos acabaram por se transformar em segundos.

Dizem, nos arrabaldes, que em pouco tempo Zezinho acabou se tornando um lindo relógio de cabeceira. Que nunca parou de mostrar as horas. Tão preocupado com elas que o menino Zezinho sempre foi.

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